As ocupações de escolas e institutos de ensino por estudantes em todo o País ganharam um tom ainda mais polêmico com a chegada do Exame Nacional do Ensino Médio, o Enem, nos dias 5 e 6 de novembro. Na terça-feira 1, o Ministério da Educação divulgou mudanças na realização da prova para 191 mil estudantes. Esta parcela, que representa 2,7% do total de inscritos, deverá fazer o teste nos dias 3 e 4 de dezembro. A adaptação planejada pelo Ministério custará R$ 12 milhões aos cofres públicos. O motivo da transferência é o movimento de ocupações de escolas em diversos estados, que afeta 364 locais onde seriam aplicados os exames. O ministro da educação, Mendonça Filho, afirmou que houve uma politização do Enem. “A escola é um espaço público, não se pode impedir um colega de ter acesso à educação.” O chefe da pasta também disse que as instituições partidárias têm se aproveitado do movimento. “Lamento o uso político de partidos ligados ao PT, PSol, PCdoB, com seus braços sindicais e organizações estudantis, que usam esse tipo de situação para gerar mais conflito dentro de um ambiente que exige cautela.”

Os secundaristas, por sua vez, que desde novembro do ano passado lutam primeiro contra a reorganização escolar proposta pelo governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e atualmente contra a Proposta de Emenda Constitucional 241 que estipula um teto para gastos públicos e contra a Medida Provisória 746, que propõe a reforma do Ensino Médio, alegam que o Ministério da Educação usa o exame para colocar “estudantes contra estudantes”. Porém, na semana passada, assembleias estudantis de vários estados votaram contra as ocupações, mas o moviment continuou. Líderes de movimentos estudantis dizem que não é a intenção cancelar nem prejudicar a realização da prova. “O Enem é um direito de todos. Fizemos uma carta de reivindicação para propor a coexistência da prova e das ocupações de forma harmônica, mas não obtivemos resposta”, afirma Camila Lanes, presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas e participante da ocupação no Colégio Estadual Costa Viana, em São José dos Pinhais, no Paraná. O estado chegou a registrar mais de 800 ocupações em outubro. Trata-se de uma reivindicação utópica. No entanto, poderiam ter sido escolhidos locais alternativos.

Apesar de os líderes negarem uma conotação política do
movimento, vários são filiados a partidos de oposição

Provas diferentes

No início do debate houve uma preocupação com o princípio da isonomia das provas, porém especialistas garantem que a equidade dos testes será respeitada. “O grau de dificuldade será o mesmo, mas o contexto não. Os alunos que fizerem a prova depois conseguirão estudar um pouco mais”, diz Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação. O professor e especialista em política educacional da Universidade do Estado de São Paulo, João Cardoso Palma Filho, afirma que o Ministério da Educação teria a opção de realizar a prova em outras escolas não ocupadas. “Essa divisão vai gerar conflitos entre os próprios alunos”, diz. “Tem estudante dizendo que alguns serão beneficiados, mas, por outro lado, quem fizer o exame depois sofrerá uma tensão maior.” Em São Paulo, o diretor da União Paulista dos Estudantes Secundaristas (UPES), Emerson Souza dos Santos, de 21 anos, diz que as mudanças no Enem têm o objetivo de diminuir o impacto das ocupações. “Estamos em uma luta, é natural que surjam comentários para questionar a legitimidade do movimento. Porém, a transferência do exame foi a chave tática do MEC para acabar com ele”, diz.

Em Minas Gerais, os secundaristas assinaram na terça-feira 1 um termo de compromisso com a Secretaria Estadual e o Ministério Público para que as escolas ocupadas pudessem receber o Enem, mas mesmo assim o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) manteve o adiamento. “O Enem é importantíssimo para os estudantes, mas o MEC não quis dialogar outras possibilidades”, diz Bruna Helena Fagundes, de 18 anos, líder da UBES e da União Colegial de Minas Gerais. Além de modificar a logística e o calendário de realização das provas, o Ministério da Educação acusa partidos políticos de estarem ligados aos movimentos. Emerson, da UPES, por exemplo, é filiado ao PCdoB. Bruna também é filiada a uma sigla, mas diz que todos “tomam partido pela educação”. No dia 27 de outubro, porém, a estudante Ana Júlia Ribeiro ressaltou o caráter apartidário das ocupações na Assembleia Legislativa do Paraná.

Os números e as mudanças do Enem 2016

8.627.248 estudantes inscritos em todo o País –  97,21% é o total de alunos que fará a prova nos dias 5 e 6 de novembro

240.304 estudantes farão a prova nos dias 3 e 4 de dezembro – 2,79% é o total de alunos que fará a prova em dezembro

16.476 escolas realizarão a prova – 364 escolas não realizarão o exame

Dessas, 200 são escolas de educação básica 164 são instuições de ensino superior

As instituições estão localizadas em 139 municípios, 18 estados e no Distrito Federal

R$ 12 milhões é o prejuízo total estimado pelo governo (R$ 90 por participante realocado)

Fotos: Tiago Queiroz/Estadão; Henry Milleo