Gérard Depardieu esteve domingo passado, 18, em Niterói para divulgar seu novo filme – O Vale do Amor, de Guillaume Nicloux. A pré-estreia fez parte do lançamento do novo Reserva Cultural no Caminho de Niemeyer, em Niterói. O complexo paulistano tem cinco salas em sua nova casa, instalada num magnífico conjunto desenhado pelo arquiteto de Brasília, com livraria, restaurante, etc. Um belo point, sem dúvida. Depardieu foi muito simpático na apresentação, apesar de refratário a entrevistas e esgotado pelos fotógrafos. Disse que estava encantado com a cidade, menor que metrópoles estressantes como Rio, São Paulo e Paris. Como veio, foi-se. Mas o filme ficou e já pode ser visto nos cinemas do Brasil.

O interessante é que, na tela, Depardieu está como na vida real. Não esconde o sobrepeso (e como poderia?) e parece bem resolvido em sua fase sóbria. Diz que dispensou o vinho, que consumia com voracidade de fazer inveja a Obelix, seu personagem no cinema. Em O Vale do Amor ele também se chama Gérard, continua beberrão e marca um encontro com sua ex-esposa, Isabelle, vivida, adivinhem, por Isabelle Huppert. O ex-casal se hospeda no Vale da Morte, na Califórnia, sob um verão que aponta para os 60º. Bem, isso já não é mais calor; é uma fornalha.

Nesse clima, eles estão lá para cumprir uma missão familiar. O filho de ambos, Michael, um fotógrafo, suicidou-se seis meses antes em São Francisco. Antes de se matar, mandou duas cartas, uma para o pai, outra para a mãe. Convoca-os para essa insólita reunião familiar e estabelece um ritual no Vale porque, garante na carta, aparecerá para eles em determinado momento.

Gérard está doente e tem consulta médica para dali a dois dias. Isabelle, no entanto, insiste que cumpram a determinação do filho. Se não for por outra razão para prestar-lhe uma homenagem póstuma. No decorrer da história, percebemos que não foram grandes pais para o pobre Michael. Portanto, guardam um tanto de culpa em relação à sua morte embora Gérard, em particular, tente negar qualquer responsabilidade pelo ato do filho.

Dito isso, deve-se acrescentar que O Vale do Amor é um filme de climas. Nos quais se inclui certo diálogo com o universo do fantástico. Tudo é beneficiado pela locação, meio mágica, meio assustadora. Em filmagem panorâmica, Nicloux aproveita os grandes espaços abertos para instilar não apenas beleza na tela, mas alguma estranheza. A construção do suspense se dá no espaço aberto e não no fechado, como já fizera um mestre como Alfred Hitchcock em Intriga Internacional. Nicloux segue-lhe os passos, neste particular.

Mas, é claro, que uma história de trama mínima, ambientação espacial e sutilezas psicológicas só se sustenta pelo gentil “duelo” entre esses dois gigantes – Gérard Depardieu e Isabelle Huppert. É o reencontro dos dois, que não filmavam juntos desde Loulou (1980), de Maurice Pialat. Mostram-se tão à vontade um com o outro quanto desconfortáveis em certos momentos – exatamente como são os velhos casais desfeitos que o acaso voltou a reunir. Ambos sabem demais um do outro para poderem mentir ou enganar. Dessa forma, têm muita dificuldade em administrar a sombra do filho morto que paira sobre eles. Visto dessa forma, o filme se torna muito bom.

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As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.


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