Antes de sair da Presidência da República, a presidente afastada Dilma Rousseff assinou uma série de papéis em seu gabinete no Palácio do Planalto. Entre eles, um decreto que institui a Política de Dados Abertos do Poder Executivo Federal, a cargo do Ministério do Planejamento. O decreto é considerado um complemento para a Lei de Acesso à Informação (LAI), que completa quatro anos nesta segunda-feira, 16.

Responsável pela política de transparência e abertura de dados na Controladoria-Geral do Município (CGM) de São Paulo, Fernanda Campagnucci diz que o decreto estabelece regras específicas para a liberação de dados que facilitem o uso das informações. Não podem ser enviados, por exemplo, arquivos em formatos cobertos por patentes, como PDF, por exemplo.

Com o decreto, cada ministério terá de apresentar planos de abertura de dados, construídos a partir de demandas da sociedade. Outro ponto positivo, segundo ela, é a criação de catálogos, o que obriga os ministérios a fazer um inventário de informações, mesmo que sigilosas.

O município de São Paulo passou por processo semelhante a partir de um decreto de 2014, que ampliava a transparência pública. Segundo Fernanda, foram identificadas cerca de mil bases de dados – 600 delas foram catalogadas e, hoje, 96 arquivos podem ser baixados pela internet. “Não pode simplesmente abrir a base de dados. É preciso tratar, criar um dicionário”, afirma.

A pesquisadora do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV Direito Rio Marina Barros destaca que o decreto ainda estabelece que sejam disponibilizadas, em formato aberto, algumas bases de dados de ministérios no prazo de 180 dias. Entre elas, o arquivo com nomes de ocupantes de cargos de gerência e direção em empresas estatais e subsidiárias. Ao cruzar as informações com outros dados públicos, será possível identificar casos de nepotismo cruzado, por exemplo.

A abertura de dados pode significar também um ganho de eficiência para a gestão pública, segundo Fernanda Campagnucci. “Ter informações da política dos outros órgãos ajuda no planejamento do próprio órgão.”

Pressões

Menos otimista, o consultor Fabiano Angélico, autor do livro Lei de

Acesso e Accountability, disse temer que o decreto seja revogado pelo governo Temer. Para ele, a transferência das funções da Controladoria-Geral da União (CGU) para o recém-criado Ministério de Transparência, Fiscalização e Controle põe em risco o trabalho desenvolvido nos últimos anos.

Segundo Angélico, a pasta é mais suscetível a pressões do que a CGU porque não está numa posição hierárquica superior aos órgãos que serão auditados. “Era como se o seu tio te desse uma bronca. E agora quem dá a bronca é o seu irmão. O seu tio você respeita mais.”

O consultor considera ainda que o “clamor por redução de ministérios” pode fazer a pasta passar por outra fusão e, assim, perder mais força. “Esperamos que ainda seja possível reverter essa decisão e cancelar a extinção.”

A pesquisadora Marina Barros destaca que a CGU tinha papel importante no monitoramento de políticas de transparência. O órgão também respondia como segunda instância em caso de internautas que recorriam por não ter o pedido de abertura de dados atendido. Para o jornalista e programador Marco Túlio Pires, sócio da agência J++, especializada em visualização de dados, o governo Temer precisa manter na pauta a abertura de informações públicas para possibilitar o acompanhamento e a fiscalização das atividades do governo.