José Roberto Guimarães resolveu contribuir de uma forma diferente para o vôlei: na formação de jogadoras. E já conseguiu os primeiros frutos de um projeto que toca com a alma e o coração, além de dinheiro do próprio bolso no início. Ele sonha também ter um time modelo na liga principal. “O Zé tem todas as medalhas do mundo, só falta da segunda divisão da Superliga”, brincou, falando de um cenário real, o supervisor técnico do Barueri/Hinode, Benedito Crespi, que até o ano passado montava elencos em Osasco pensando em títulos mundiais. Só mesmo a reputação do treinador para levar Benê e tanta gente boa para um projeto tão embrionário, nascido em outubro, mas que já festeja alguns resultados.

Menos de um mês depois veio o primeiro título, da Taça de Prata, a terceira divisão nacional – ao menos essa medalha inédita o técnico tricampeão olímpico garantiu no currículo. É claro que essa turma não foi a Barueri em busca de conquistas em divisões inferiores. Começar de baixo é o caminho natural para chegar à Superliga, independentemente das aspirações. A ideia de formar e ter um time mexeu com o treinador.

Zé Roberto ignorou convites de alguns dos melhores times e seleções do mundo para focar na nova empreitada – e começou a correr. “Em vez de conseguir o patrocínio (primeiro) e só depois formar o time, montamos a equipe e (depois) corremos atrás do patrocínio”, disse.

A comissão técnica é praticamente a mesma da seleção e todos sonham com o chefe: transformar Barueri, cidade da Grande São Paulo em que escolheu viver há 30 anos, em referência no vôlei. “Eu coordeno as categorias de base da seleção e, para minha surpresa, quatro meninas do time sub-19 eram de Barueri ou da região. Não poderíamos deixar esse trabalho morrer”, afirmou. Culpando a crise econômica, a prefeitura de Barueri encerrou em 2016 os projetos de formação em diversas modalidades, inclusive o vôlei.

Ao fazer isso, deixou de alugar o CT que Zé Roberto construiu na cidade em 1992 e que já foi casa do futebol de base do São Paulo e do time do Desportivo Brasil. O local ficou ocioso. À essa soma de fatores, inclui-se também a necessidade, detectada pelo treinador, de o Brasil voltar a formar com qualidade. “Acho que o que está mais difícil é encontrar talentos”.

Por isso, mesmo sem ter recursos para o juvenil, mantém 13 jovens atletas no CT. Questionado sobre os motivos, repete em tom de conformação: “Porque senão não acontece. Vale a pena tentar fazer. Se não fizer alguma coisa, não vai sair”.

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Zé Roberto conta que, certo dia, um pai chegou ao CT às 4h30 da madrugada trazendo a filha. Tomou café da manhã, deixou a menina sob a tutela do técnico da seleção e pegou tranquilo a estrada de volta a Minas Gerais. “Sem essa estrutura do Zé Roberto, o projeto não existiria”, explicou Benê. Antes de conversar com o jornal O Estado de S.Paulo, na última quinta-feira, o técnico recebeu o pentacampeão Edmílson, que queria alugar o espaço. Daniel Alves também já havia tentado. Ouviram que o local era a casa do Barueri/Hinode, seu novo time.

Ali, o treinador está a apenas 10 minutos de casa. “Mais gostoso do que trabalhar perto de casa é trabalhar com a família”, disse. A esposa, Alcione, administra o CT. As filhas o ajudam a cuidar da carreira. Anna Carolina, a mais velha, ainda é a diretora de marketing da equipe.

Apesar do projeto, Zé Roberto continua técnico da seleção. Na semana que vem, trará pelo menos uma dúzia de barras de chocolate suíço para pagar apostas com as jogadoras. Ficará uma semana na Europa a fim de representar o Brasil na comissão de técnicos da federação internacional (FIVB). Duas vezes por semana, em média, também viaja para palestras, sempre preocupado em voltar para dar treino.

Sob seu comando, o Barueri está invicto. Venceu três jogos da Superliga B e, se ganhar do Bradesco, pela 5.ª rodada, deve garantir o 1.º lugar da fase de classificação. Aí, vai direto à semifinal. A expectativa pelo acesso, e título, é tanta que a partida final, em abril, foi adiada a pedido de uma emissora de tevê.


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