Ao depor sobre as acusações de ter recebido cerca de R$ 7 milhões em propina da fraude do crédito consignado, o ex-ministro Paulo Bernardo recorreu à estratégia mais vil até mesmo entre habitantes de casas de detenção. Na terça-feira 19, ele usou a conhecida tática de lançar a culpa no mordomo para negar seu envolvimento aos investigadores da Polícia Federal da capital paulista. No caso, o mordomo é Guilherme Gonçalves, ex-advogado de Bernardo e de sua mulher, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR). Paulo Bernardo deu a entender, no depoimento, que o defensor teria usado o seu nome, sem autorização, para pedir subornos da empresa Consist.

Seria um inédito caso de corrupção sem corrompido. Guilherme Gonçalves, segundo o Ministério Público Federal, realmente lucrou e participou do esquema que desviou R$ 100 milhões entre 2010 e 2015 de um contrato fechado pelo ministério do Planejamento com a companhia para administrar o banco de dados de concessão dos empréstimos consignados a servidores públicos. Bastam, no entanto, duas perguntas para derrubar os artifícios do petista e confirmar que o advogado era seu operador no esquema, como mostram documentos aprendidos pela Polícia Federal. Quem chefiava o ministério quando o acordo com a empresa foi fechado? Paulo Bernardo. Quem tinha despesas pessoais, aluguéis, salários de funcionários e recursos de campanhas pagos pelo advogado? O casal petista.

De operador a bode expiatório

Para os integrantes da força-tarefa da Operação Custo Brasil, não há dúvidas de que Paulo Bernardo usou do posto de ministro para selar o contrato superfaturado. A certeza é tamanha que os procuradores conseguiram inclusive que a Justiça decretasse a prisão do ex-ministro no final de junho. Ele acabou libertado após uma controversa decisão do Supremo Tribunal Federal. “Foi ele quem indicou pessoas estratégicas para que o esquema se iniciasse, de primeiro e segundo escalão. Para que esse esquema pudesse não só ser instaurado, mas mantido pelos cinco anos”, disse o procurador Andrey Borges quando deflagram a investigação.

O esquema, aliás, é mais um daqueles da gestão petista em que se fez de um problema uma oportunidade de ganhos ilegais. Em 2010, acumulavam-se reclamações de bancos sobre o sistema federal que gerenciava os empréstimos com desconto em folha. Havia falhas que permitiam que os valores emprestados superassem o percentual máximo estabelecido a ser descontado. Para corrigir os erros, foi aberta pelo ministério do Planejamento, comandado então por Paulo Bernardo, uma concorrência para selecionar uma empresa privada para oferecer o serviço. O resultado já se conhece. De acordo com as investigações, o contrato tirou dinheiro de servidores públicos e aposentados para abastecer o bolso de políticos, como Paulo Bernardo.