26/09/2012 - 11:19
O revisor do processo do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski, retoma nesta quarta-feira seu voto sobre réus ligados a partidos da base aliada do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao julgar a relação do presidente do PTB e delator do esquema do mensalão, Roberto Jefferson. Lewandowski ainda vai analisar a conduta do ex-deputado Romeu Queiroz, do ex-secretário do partido Emerson Palmieri e do ex-deputado pelo PMDB e atual prefeito de Jandaia do Sul (PR), José Borba.
Caso o voto do revisor não ocupe todo o tempo da sessão desta quarta, que terá início a partir das 14h, os demais ministros da Corte poderão apresentar seus argumentos sobre o repasse de dinheiro pelo PT em troca de apoio político aos projetos do governo federal na Câmara dos Deputados. A expectativa é que na próxima semana, nos últimos dias que atecedem às eleições do dia 7 de outubro, sejam julgados os réus ligados ao PT – José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares.
Na sessão de segunda-feira, Ricardo Lewandowski contrariou o relator, Joaquim Barbosa, e votou pela absolvição do ex-sócio da corretora Bonus Banval Breno Fischberg por lavagem de dinheiro e corrupção passiva. Ele também absolveu João Claudio Genu da acusação de lavagem, mas condenou o ex-assessor do PP, o ex-deputado Pedro Corrêa e outro sócio da Banval, Enivaldo Quadrado, por formação de quadrilha.
Ao analisar as condutas dos réus ligados ao PL (atual PR), o revisor do mensalão ainda condenou o deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP), o ex-tesoureiro do partido Jacinto Lamas e o ex-deputado Bispo Rodrigues por crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Nesse item do capítulo seis, o único absolvido foi o ex-assessor do PL Antonio Lamas.
O voto do revisor sobre a condenação de Costa Neto por lavagem de dinheiro chegou a causar um mal estar com o ministro Joaquim Barbosa, que se surpreendeu com os argumentos adotados por Lewandowski. O revisor vinha aplicando o princípio do ne bis in idem, cujo conceito significa que ninguém pode ser julgado duas vezes pelo mesmo fato. Foi assim quando inocentou o ex-deputado Pedro Corrêa do crime de lavagem. Na opinião de Lewandowski, ao receber ilegalmente uma quantia de dinheiro, o que caracterizaria a corrupção passiva, o réu não teria a intenção de esconder o montante.
"Não admito que se impute, que se dê ao mesmo fato, uma dupla classificação penal. Por isso não entendo a concomitância automática do crime de corrupção passiva com a lavagem de dinheiro, salvo se existirem outros atos", disse Lewandowski. Barbosa interpelou o revisor e questionou se ele não reconheceria o artigo 70 do Código Penal, que versa sobre a aplicação de duas penas ao mesmo ato cometido de forma intencional. Lewandowski rebateu afirmando que não utilizaria o princípio no caso de Costa Neto porque teria enxergado operações distintas cometidas pelo deputado. Barbosa retrucou e disse que Costa Neto "vai reclamar, e com razão" porque o revisor aplica um conceito a um réu e não a outro.
Próximas votações
Após ser concluído o voto de todos os ministros sobre o capítulo item seis – incluindo o julgamento dos petistas José Dirceu, Delúbio Soares e José Genoíno -, o julgamento deve prosseguir com a análise do item sete, que tem como foco os saques feitos no Rural por petistas e pelo ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto. O penúltimo capítulo, o oitavo, é dedicado à evasão de divisas e lavagem de dinheiro atribuídas aos publicitários Duda Mendonça e Zilmar Fernandes.
Por fim, o capítulo dois deverá levar ao plenário do Supremo o ápice do julgamento. É nesse ponto que estão descritas as condutas de Dirceu, Delúbio e José Genoíno, ex-presidente do PT, que resultaram na acusação de formação de quadrilha.
O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.
No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.
Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.
O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
A então presidente do Banco Rural Kátia Rabello e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.
Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e do irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.
A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira decisão tomada pelos ministros foi anular o processo contra o ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão. Durante três anos, o Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.