A sensação de incerteza sobre o futuro das pesquisas científicas no Brasil se agravou com a divulgação de uma nota da pró-reitoria de pós-graduação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Na semana passada, a entidade alertou para um possível corte das bolsas financiadas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) a partir de setembro. O CNPq confirmou: não tem mais recursos para honrar o pagamento das bolsas e precisa que a equipe econômica do governo libere mais verbas. Agora, alunos brasileiros de graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado convivem com a possibilidade de ver suas bolsas suspensas e o resultado de suas pesquisas adiados – um prejuízo imenso para o País.

CORTE DE MEIO BILHÃO

O “desmonte da Ciência e da universidade pública no Brasil”, como diz a UFRJ em nota, não começou agora. Segundo o movimento Conhecimento Sem Corte, desde 2015 o governo já cortou mais de R$ 11 bilhões do orçamento das universidades públicas e da ciência e tecnologia no país. “São cortes nos orçamentos das universidades federais, do CAPES, e do MCTI”, explica Tatiana Roque, professora da UFRJ e coordenadora da campanha, referindo-se ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, ligada ao Ministério da Educação. “Nós perdemos R$ 500 mil reais por hora em áreas que afetam o ensino e a pesquisa.” No caixa do CNPq, que tem como fontes de recurso o governo federal e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), o que pesou foi o contigenciamento de 30% do orçamento do MCTI. Com orçamento de R$ 1,3 bilhão aprovado no final do ano passado, o CNPq já empenhou R$ 672 milhões e precisa que R$ 505 milhões sejam liberados para honrar o pagamento das bolsas de setembro a dezembro. “Conversei com o ministro Gilberto Kassab e ele está sensibilizado. Se comprometeu a convencer a área econômica a liberar o recurso, pela importância e fator estratégico da ciência para o Brasil”, afirma o presidente do CNPq Mario Neto Borges.

Caso os recursos não sejam liberados, o cenário pode ser o de atraso no resultado das pesquisas — muitas precisariam ser recomeçadas do zero —, e possível “fuga de cérebros” do Brasil. A doutoranda em ciências biomédicas, Camila Braggion, 24, iniciou este ano seu projeto sobre opções ao uso de animais em testes laboratoriais, com uma bolsa do CNPq. Com a remuneração de R$ 2.200, Camila passa ao menos oito horas diárias no laboratório, trabalhando em sua pesquisa. “Caso haja corte, vou precisar buscar outras fontes de renda e virei menos ao laboratório, o que vai atrasar os resultados”, afirma. Há também quem acabe optando por estudar em outro país. Guilherme Martignago Zilli, de 26 anos, chegou a começar o doutorado em engenharia elétrica e eletrônica aqui, mas preferiu se candidatar a bolsas no exterior. Ele vai para Montreal, no Canadá, na próxima semana. “Nós, que seguimos carreira acadêmica, dependemos muito da abertura de concurso público, já que grande parte da pesquisa do País está concentrada nas universidades federais e estaduais”, diz . “Com o corte nos gastos e investimentos, não temos muitas perspectivas por aqui”. Perdem eles, perde o Brasil.

 

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