Céticos pediram cautela, na quarta-feira, a respeito de uma pesquisa americana que sugeriu que o excesso de ácido fólico, uma importante vitamina do complexo B, durante a gravidez pode aumentar o risco de autismo.

Os resultados foram apresentados em uma conferência em Baltimore, no estado americano de Maryland, por pesquisadores da Escola de Saúde Pública Johns Hopkins Bloomberg, e ainda não foram publicados, nem revistos por pares.

Alguns especialistas classificaram as alegações como “irresponsáveis” e os resultados como improváveis de serem reproduzidos, e afirmaram que a pesquisa mostra uma correlação, mas não uma relação de causa e efeito.

“Com base nos seus dados, que não foram revisados por colegas, os autores estão provocando riscos”, disse Max Davie, do Royal College of Paediatrics and Child Health, que não participou do estudo.

Davie acrescentou que os pesquisadores “estão sendo bastante irresponsáveis em solapar o trabalho de saúde pública que tem sido feito há décadas para aumentar o número de mulheres que tomam folato antes e durante a gravidez, a fim de prevenir doenças neurológicas potencialmente devastadoras”.

O folato é uma vitamina B que está presente naturalmente em frutas e legumes. Uma versão sintética, o ácido fólico, é frequentemente usada para enriquecer pães e cereais, e também é encontrada em suplementos vitamínicos.

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Quando as mulheres grávidas não recebem folato suficiente, seus bebês têm um risco maior de terem malformações no cérebro e na medula espinhal.

Risco duas vezes maior

O estudo acompanhou 1.391 mães e seus filhos do centro clínico Boston Birth Cohort – uma população predominantemente de baixa renda.

Mães com um nível muito alto de folato no sangue logo após o parto enfrentavam um risco duas vezes maior de que a criança desenvolvesse transtorno do espectro autista, e os filhos das mulheres com altos níveis de vitamina B12 tinham o triplo do risco de desenvolver a doença.

Nos casos em que ambos os níveis eram extremamente altos, o risco da criança desenvolver o transtorno aumentava 17,6 vezes, segundo a pesquisa apresentada na International Meeting for Autism Research de 2016 em Baltimore.

“Esse pode ser um caso de excesso (prejudicial) de uma coisa boa”, disse o autor principal do estudo, Ramkripa Raghavan, pesquisador da Johns Hopkins, em um comunicado divulgado antes da apresentação.

“Dizemos às mulheres que elas devem garantir a ingestão de folato no início da gravidez. O que temos que descobrir agora é se deveriam ser feitas recomendações adicionais sobre qual seria a dose ideal”, acrescentou.

A maioria das mulheres que participaram do estudo relataram terem tomado suplementos vitamínicos durante o pré-natal.

Poucas delas – uma em cada dez – tinham o que os pesquisadores consideram uma quantidade excessiva de folato no sangue (mais de 59 nanomoles por litro), e 6% tinham excesso de vitamina B12 (mais de 600 picomoles por litro).

A Organização Mundial da Saúde considera que a quantidade adequada de folato para uma mulher no primeiro trimestre de gravidez é entre 13,5 e 45,3 nanomoles, enquanto o nível ideal de vitamina B12 não é estabelecido.

– Pedido de cautela –


Especialistas que não participaram do estudo alertaram que a pesquisa mediu o folato na hora do nascimento, enquanto o período crucial para ingerir suplementos que previnem defeitos no tubo neural, como a espinha bífida, são as primeiras semanas e meses de gravidez.

“Essa pesquisa não sugere nenhum efeito prejudicial dos suplementos de folato tomados no início da gravidez”, disse Andrew Shennan, professor de obstetrícia na King’s College London.

“As mulheres deveriam continuar a ingeri-los”, acrescentou Shennan, que não participou do estudo.

James Cusack, diretor de pesquisas da Autistica, fundação de apoio aos estudos sobre autismo, concordou.

“Embora os resultados sejam surpreendentes, é essencial lembrar que esta pesquisa está em um estágio muito inicial. Efetivamente, essa informação veio simplesmente de um único cartaz em uma conferência”, disse.

“Ainda é muito cedo para dizer se o resultado é correto, de modo que as famílias não devem se preocupar muito”, acrescentou.

Craig Newschaffer, professor na Drexel University School of Public Health, disse que a pesquisa pede um melhor entendimento do papel do folato durante a gravidez.

“O papel do suplemento de ácido fólico no desenvolvimento neurológico pode ser bastante complexo”, acrescentou.

Cerca de uma em cada quatro mulheres nos Estados Unidos não recebe folato suficiente na gravidez, segundo o Centers for Disease Control and Prevention.

O transtorno do espectro autista é uma condição do neurodesenvolvimento infantil que afeta uma em cada 68 crianças nos Estados Unidos, e provoca dificuldades na interação social e na comunicação, assim como interesses restritos, entre outros sintomas.

Suas causas continuam pouco conhecidas, mas pesquisadores afirmam que a doença é provavelmente resultado de uma combinação de fatores genéticos e ambientais.

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