No arco de tempo que separou 1900 de 2000, o ser humano se reinventou em uma velocidade assombrosa. Da era em que nenhum barril de petróleo havia sido extraído nos Estados Unidos à inimaginável chegada dos astronautas na Lua, houve transformações incessantes, que alteraram radicalmente não só a forma como as pessoas vivem, mas também como elas nascem e morrem. Muito daquilo que moldou nossa vida, permitindo ter com mais conforto, prosperidade e bem-estar, surgiu no século 20.

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VIÉS POLÍTICO Escrito por biógrafo de Churchill, livro se concentra nas grandes disputas de poder

Foi um período em que sujeitos dos mais diferentes perfis acrescentaram novos capítulos à história da humanidade. Einstein, Hitler, Gandhi, Mao Tsé Tung, Martin Luther King e tantos outros marcaram seu tempo e mudaram o destino de milhões de pessoas. Alguns semearam conflitos, geraram disputas, provocaram genocídios. Outros contribuíram para o progresso dedicando-se à paz, à filantropia, ao crescimento espiritual ou à disseminação do conhecimento. Como resultado, tivemos uma era tão conturbada quanto fascinante. A ideia de sintetizar os fatos e as pessoas de maior importância naqueles cem anos foi levada a cabo pelo historiador britânico Sir Martin Gilbert (1936-2015), em três livros que somam 2.700 páginas. Ainda em vida, ele reduziu o texto para um único tomo, “A História do Século XX” (Editora Planeta, 836 páginas, R$ 99), que acaba de ser lançado no Brasil.

OLIMPÍADA

Logo nas primeiras páginas, a impressão é de uma narrativa excessivamente presa à geopolítica, enfatizando os conflitos que influenciaram eventos decisivos como a Revolução Russa, as duas grandes guerras, a era nuclear, a queda do Muro de Berlim. É verdade que esses foram os assuntos que mais atraíram o interesse do historiador Martin Gilbert ao longo de sua carreira. Biógrafo oficial de Winston Churchill (1874-1965), ele se especializou em eventos como os que tiveram o mais influente primeiro-ministro britânico no papel central. Porém, ao recapitular o século passado ano a ano, Gilbert não se furtou a falar de disputas em outros campos.

É o caso do esporte, com a lista das medalhas de ouro conquistada por cada país na primeira Olimpíada moderna fora da Grécia (em Paris, 1900), e de invenções como o revólver e o avião. Outros temas em que o autor mergulha dizem respeito à economia, relações de trabalho e conquistas sociais. Ele explica, por exemplo, como em 1913 os Estados Unidos emergiram como a maior nação industrial do mundo, cuja produção superava a soma de França, Reino Unido e Alemanha. Mas logo sua pena resvala para as refregas: “Enquanto a cultura e o comércio floresciam, as guerras e a destruição também marcaram aquele ano”, escreve, sobre 1913.

Os bastidores nos quartéis-generais e das tropas nos fronts podem cansar o leitor menos interessado nas duas grandes guerras. Por outro lado, apenas um parágrafo é dedicado ao massacre de civis na Praça da Paz Celestial, em Pequim, em 3 de junho de 1989 — cuja imagem de um único manifestante detendo a movimentação de tanques se espalhou pelo globo como símbolo de resistência.

Uma lacuna grave é o desinteresse por cultura, área que teve um período extremamente fértil no século passado. Exceto em casos pontuais, como Charlie Chaplin, pouquíssima atenção é dada aos artistas que tiveram papel fundamental ao captar e refletir o espírito de seu tempo. Uma característica que direciona o livro para o leitor mais interessado na história sob
o ponto de vista do poder.

Figuras centrais do século 20
Personalidades citados no livro que redefiniram a história