Há mais de 30 anos trabalhando na área musical, Rick Bonadio coleciona uma série de afetos e desafetos. Responsável por “descobrir” os Mamonas Assassinas e trabalhar com bandas como CPM 22, Titãs, Ira! e Tihuana, o paulistano de 47 anos acaba de lançar a biografia Rick Bonadio, 30 Anos de Música (Seoman). Escrito pelo jornalista Luiz Cesar Pimentel, a publicação conta a trajetória do produtor desde os tempos em que cantava hip-hop (ele chegou a gravar um CD em 1986) e pisou em um estúdio pela primeira vez. O livro também conta os bastidores de gravações, além de trazer detalhes e curiosidades sobre vários discos de sucesso. “Eu acho que tudo que faz ou fez sucesso tem algo de bom. Nunca emplaquei um artista bonito. A Luiza Possi é a única que me vem à cabeça e, mesmo assim, demorou para caramba para engrenar. Os feios são os que dão mais certo”, diz ele.

Palmeirense fanático e jurado do reality musical X-Factor, da Band, Bonadio recebeu a reportagem do jornal “O Estado de S. Paulo” em um dos seus estúdios, o Midas, que fica na zona norte de São Paulo, para falar sobre o livro e o mundo da música. Leia a seguir trechos da entrevista.

Apesar das aparências, você é um cara que teve de batalhar muito na vida. O livro, inclusive, ressalta sua origem humilde na zona norte de São Paulo. Alguns pensam que você nasceu em berço de ouro.

Muita gente pensa que herdei esse lugar gigantesco. Ninguém sabe que eu tinha um estúdio minúsculo no quintal de casa e colocava anúncio no jornal para atrair artistas. As pessoas mal imaginam que fiquei doente de tanto gravar artista independente. Minha intenção, no entanto, não era surpreender as pessoas. Meu objetivo era mostrar para a garotada que uma ideia pode dar certo. Se você está motivado, tem talento e se dedica de corpo e alma àquilo, amigo, vai funcionar. Isso, obviamente, vale para qualquer profissão. O sucesso está atrelado ao número de vezes que você tenta.

Qual seu critério na hora de selecionar um artista? Você geralmente pensa no resultado final – o potencial sucesso que este cara pode fazer – ou apenas no quão bom musicalmente ele é?

Meu gosto pessoal dita as regras do jogo. Isso fala mais alto que qualquer outra coisa. Trabalho com música há 30 anos e minha forma de pensar não mudou. Eu vejo o talento do cara somado ao potencial que ele tem de sucesso. Se for um artista muito talentoso, mas sem ‘estrela’, eu simplesmente não me interesso. Não gosto de trabalhar artistas só por trabalhar. Sempre busco o sucesso. É uma coisa que faz parte da minha realização profissional.

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Você leva a estética em consideração?

De jeito nenhum, até porque os feios são os que dão mais certo. Eu nunca emplaquei um artista bonito. A Luiza Possi é a única que me vem à cabeça e, mesmo assim, demorou para caramba para engrenar. O Chorão (Charlie Brown Jr.) era muito feio. Todos os vocalistas das bandas de rock que lancei também. Talvez o NX Zero tenha os integrantes menos feios (gargalhada). As meninas do Rouge não eram nada bonitas. Aquilo era só banho de loja (mais uma gargalhada).

Como você define ‘potencial de sucesso’?

O artista precisa ter personalidade. Aquela coisa contundente, com músicas boas e estilo próprio: alguém diferentão e de pegada única. Um artista que não seja só mais um na multidão. A pessoa precisa olhar para ele e sacar que ali tem algo a mais. É isso que procuro.

Como você lida com o sucesso? Algumas bandas são hipócritas ao dizer que não querem ser tocadas nas rádios?

Eu acho que muitas bandas são imaturas e ingênuas. O cara sabe que ele necessita fazer sucesso para continuar trabalhando com aquilo. Ele precisa fazer sucesso para ter um segundo disco. Alguns artistas conseguem ter maturidade suficiente para enxergar isso. Outros, entretanto, não. Muitos são inseguros e começam a espalhar pelos quatro ventos que o sucesso é irrelevante e o importante é preservar a sua obra. Pense o seguinte: se não tiver público lá no show para me assistir, do que adianta compor? Se o artista não fizer um sucesso mínimo, ele morre na praia. Todo mundo quer fazer sucesso, todo mundo quer ganhar dinheiro, todo mundo quer sair com a mulherada e viver de música pelo resto da vida. Ninguém quer viver de música por um tempo e depois ir à falência. Os melhores artistas eram pobres. Eu vejo muita gente comentando que quem faz sucesso tem dinheiro. Isso não é verdade. Em mais de 30 anos de carreira, eu não conheço ninguém que tinha dinheiro e fez sucesso. O cara rico não corre atrás do sucesso porque ele já é rico. Comigo nenhum rico brilhou. Os manos do Charlie Brown e dos Mamonas eram ferrados pela vida.

Música é negócio, paixão ou talento?

Os três, na verdade. Negócio sem talento não dá certo, não vai gerar lucro. Já talento e negócio, se não tiver paixão, você se desmotiva. Não dá para ficar 30 anos numa coisa que só dá dinheiro. Eu, por exemplo, não preciso mais trabalhar. Conseguiria perfeitamente administrar minha vida com o que tenho. Os três elementos, portanto, são essenciais para se manter motivado. O segredo de tudo é a motivação. A coisa mais fácil de acontecer no mundo da música é se desmotivar. Porque você sente o gosto do sucesso e, de uma hora para outra, perde tudo. Eu tive isso várias vezes na vida. Quando os Mamonas morreram, em 1996, eu era o cara. Depois da morte deles, pronto, não era mais ninguém. Eu simplesmente parei de receber ligações. Você se desmotiva muito rápido. O segredo é manter a motivação lá no alto o tempo todo. Trata-se de um ponto crucial para a vida de todo mundo.

Tudo que é bom faz sucesso?

Não. Eu acho que tudo que faz ou fez sucesso tem algo de bom. Com a internet, a música ficou popularesca. Não tem mais filtro. Hoje em dia qualquer um vai lá e coloca seu produto na web. Às vezes até tem uma sacada legal, uma babaquice que vira febre. Isso atrapalha os artistas com carreiras mais consistentes porque as gravadoras vão em cima dessas pequenas coisas. Daí os bons, que estão fazendo um trabalho consistente, ficam à margem.

Você fica incomodado com as críticas que recebe sobre esse seu ‘lado comercial’?


Isso é balela. Em todas as profissões, sempre vai existir a desculpa. É fácil inventar uma desculpa por não ter conseguido algo. Eu mesmo tenho várias desculpas para os meus problemas, assim como todo mundo tem. Eu sou um cara um pouco mais sincero em relação a isso e muita gente me acha polêmico.

Qual a importância dos Mamonas Assassinas na sua carreira?

Foi a coisa mais incrível da minha vida. Tanto profissionalmente quanto pessoalmente. Algo do destino. Eu não existiria sem eles.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.


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