O trabalho da Polícia Militar no Complexo do Alemão, principalmente a utilização de imóveis para servir de base de operações dos militares, foi discutido nesta segunda-feira (24) em audiência pública na Defensoria Pública do Estado. O conjunto de favelas está ocupado pela PM desde novembro de 2010, o que reduziu substancialmente os enfrentamentos, mas recentemente voltou ao noticiário com mortes de moradores, traficantes e policiais.
A defensora pública Lívia Casseres destacou que o principal direito violado, quando os PMs invadem um imóvel, ainda que desocupado, é a inviolabilidade do domicílio e o próprio direito à posse dessas famílias, que não residiam diretamente naquele imóvel, mas tiveram esbulho possessório praticado pelos agentes públicos.
“Uma das recomendações [da Defensoria] é a expedição nos boletins internos da Polícia Militar deixando claro a todos os membros da corporação que a invasão de casas particulares para utilizá-las como base militar não é uma conduta legal. É uma conduta ilícita, com violação dos direitos fundamentais daqueles moradores”, disse Lívia.
Um dos moradores que sofreu com a ocupação da laje de sua casa por policiais militares da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) é o pastor Jorge Félix, morador do Alemão há 23 anos, mas que precisou se mudar para outro bairro, por causa dos constantes tiroteios.
“Eu tive a minha casa invadida, ilicitamente, fui procurar como tirar o pessoal de lá e não teve resposta desde o dia 7 de março. Ficam seis policiais todos os dias na laje, onde é a área de lavar roupa. Eles alegam que o momento é de guerra e têm ordem superior para ficar lá. Disseram que só iriam sair após a instalação da cabine blindada no local. Ninguém aguenta mais morar lá. Eu saí porque a minha família já não estava suportando psicologicamente”, disse o pastor, que se mudou para o bairro de Campo Grande, na zona oeste, distante do Alemão.
O comandante da UPP Nova Brasília, major Leonardo Zuma, admitiu que deu a ordem para os policiais se abrigarem na laje, que estava abandonada, segundo ele, para se protegerem dos ataques dos traficantes, que usavam fuzis e até granadas.
“Legalmente, não houve invasão de domicílio, porque não havia ninguém morando ali. Existe mais de cinco imóveis abandonados lá dentro. Como lá havia várias casas abandonadas, eu autorizei que ficassem nelas para se protegerem. A casa, que estava vazia, já está sendo desocupada. O nosso planejamento prevê a instalação de cabines e torres blindadas para impedir que os traficantes possam trafegar livremente lá dentro”, explicou o major.
Uma cabine blindada foi instalada neste final de semana no local. Segundo o comandante, o projeto de UPP é irrevogával, apesar dele ter ouvido de alguns moradores, durante a audiência pública, pedidos para a saída dos policiais da comunidade: “Hoje nós ouvimos aqui o pedido de retirada da UPP. A hora que isso ocorrer, nenhuma viatura mais passará na Estrada do Itararé ou na Estrada de Itaoca [que circundam o Alemão]. Todas as comunidades lá dentro vão ficar com trilhos fincados na entrada, como era antigamente”.