Ao circular entre as prateleiras dos supermercados ao redor do Brasil pode-se notar duas coisas com facilidade: a primeira é que os preços aumentaram e a segunda é que o tamanho e peso dos produtos diminuíram. O fenômeno é generalizado. A tática da indústria de reduzir embalagens e manter o preço da mercadoria já é antiga e praticada principalmente com a alta da inflação — O IPCA, índice usado nas metas de inflação do governo, subiu 1,06% em abril e já acumula alta de 12,13% em 12 meses. O que antes era conhecido como maquiagem de produto, agora, na era da internet e das redes sociais, ganhou o nome de “reduflação”, ou seja, a inflação camuflada pela redução do peso ou pelo encolhimento da mercadoria.

Em 2020, o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, junto com a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), fez uma pesquisa sobre a prática, mas não foi constatada uma adoção generalizada. Dois anos depois, com a pandemia sendo vencida, entretanto, as coisas mudaram. Em centenas de produtos de variedades e marcas diferentes é possível constatar a redução do peso e tamanho. A caixa de fósforos da marca Fiat Lux, que trazia 240 unidades, apresenta uma caixa compacta com apenas 200 palitos – 40 a menos. A caixa de ovos, que costumava ter 12 unidades, agora tem dez e o preço não caiu. O pacote de biscoito Bono, da Nestlê, diminuiu seu peso de 140 gramas para 126 gramas (uma redução de 10%); O pão de forma Pullman diminuiu 4% (de 500g para 480g). Há produtos que estão ganhando novas versões. O famoso leite condensado Moça da Nestlê, ganhou recentemente uma fórmula mais econômica. O novo produto que é descrito como uma “mistura láctea condensada de leite, soro de leite e amido” é vendido em uma embalagem parecida com a original. Clientes reclamaram nas redes sociais e alegam que são levados ao erro pela semelhança entre as caixas. “O preço é o mesmo, mas leite condensado não é mais”, reclamou um internauta.

A Nestlê, por meio de nota enviada à ISTOÉ , disse que “a adoção de novos formatos e tamanhos de embalagens pela empresa tem como objetivo acompanhar as tendências de mercado, garantir a adequação a inovações tecnológicas ou também padronizar a gramatura dos produtos das marcas, de forma a manter sua competitividade” e que todas as mudanças ocorrem em conformidade com a legislação vigente.

Apesar do que muitos acreditam, a prática não é ilegal. Ela só se torna crime quando os fabricantes não seguem as regras de informar claramente sobre as mudanças. Uma portaria divulgada pelo Ministério da Justiça em setembro de 2021 endurece algumas regras que já existiam sobre a “reduflação. O fornecedor fica obrigado a informar na embalagem, em um local de fácil visualização, a quantidade existente na embalagem antes e depois da alteração, bem como os termos absolutos percentuais. As letras precisam estar em caixa alta, negrito e em cor contrastante com a do fundo do rótulo. As alterações precisam estar na parte frontal da embalagem.

Além disso, as informações sobre as mudanças devem permanecer no rótulo pelo prazo mínimo de seis meses. Outra alteração é que passa a ser obrigatório o Serviço de Atendimento ao Cliente de cada empresa informar com precisão sobre as reduções ao consumidor. “É possível que haja uma nova pesquisa e fiscalização, pois a reduflação cresceu e se tornou generalizada”, afirma Adriano Fonseca, advogado do Proteste Associação de Consumidores. “A quantidade de reclamação não acompanha o crescimento da prática. Acreditamos que os consumidores não perceberam ou estão descrentes em buscar o seu direito”, disse.
No Estado de São Paulo, além da portaria do Ministério da Justiça, há uma lei de 2002 que deixa as regras sobre alteração de produtos mais rígidas. Tanto na esfera estadual quanto na federal, caso seja constatado que a empresa não seguiu as regras, o consumidor tem o direito de trocar o produto por qualquer outro ou receber de volta o valor pago. “Sai caro desrespeitar o consumidor. Precisamos de uma informação clara para uma escolha consciente”, diz Guilherme Farid, diretor-executivo do Procon-SP. “O que não pode é ludibriar o cliente. Este elemento surpresa é uma conduta abusiva na relação de consumo.” Daqui para frente, portanto, não se espante. Com a inflação em alta, os produtos continuarão diminuindo.