Controlada pela siderúrgica CSN, a ferrovia Transnordestina, uma das grandes promessas do governo Lula, tem sido bancada basicamente por recursos federais. Até agora, 79% dos R$ 6,3 bilhões investidos na obra – que está seis anos atrasada e só concluiu metade do traçado – saíram dos cofres de órgãos públicos. A CSN colocou R$ 1,3 bilhão, sendo metade financiada pelo BNDES.

Na estrutura societária, o poder público detém 50,98% do capital total e a siderúrgica, 49,02%. Pelas regras do contrato, apesar dessa equação, o controle da ferrovia continua nas mãos da empresa de Benjamin Steinbruch. “É uma obra pública transvestida de concessão”, diz o presidente da consultoria InterB, Claudio Frischtak.

O problema é que, em tempos de ajuste fiscal, o governo tem revisado uma série de práticas adotadas até agora. Nos últimos dias, além de limitar novos aportes no empreendimento – que deveria ligar a cidade de Eliseu Martins, no interior do Piauí, aos portos de Pecém, no Ceará, e Suape, em Pernambuco -, já levantou a hipótese de intervenção na ferrovia, uma ameaça também feita no início do governo de Dilma Rousseff. Uma série de reuniões marcadas para esta semana pode traçar o futuro do megaprojeto.

O mal-estar dentro do governo se deve à sequência de cronogramas frustrados e à constante necessidade de financiamento. Há dez anos em obras, a Transnordestina ainda está pela metade e com o orçamento estourado. Os primeiros estudos apontavam que o valor mais razoável da obra girava em torno de R$ 8 bilhões. Mas o governo pediu mudanças no projeto e reduziu o valor para R$ 4,5 bilhões. Em 2012, o valor já estava em R$ 5,4 bilhões, e subiu para R$ 7,5 bilhões depois de uma série de negociações entre os acionistas.

Apesar do rearranjo feito em 2012, que elevou o valor da obra, fontes afirmam que o novo orçamento não foi suficiente para concluir a ferrovia, que tem um traçado de 1.753 quilômetros. Executivos ligados ao projeto destacam que, mesmo na época da renegociação com o governo federal, já se sabia que o projeto beirava os R$ 10 bilhões.

Trava

O entrave atual gira em torno de uma liberação de R$ 300 milhões pelo Fundo de Investimento do Nordeste (Finor), que detém 0,4% de participação no projeto. No final de setembro, a Transnordestina enviou uma carta para a estatal Valec, sócia na ferrovia com 41%, para iniciarem a aprovação de mudanças na estrutura de capital da empresa. Para receber o valor do Finor, seria necessário converter algumas ações preferenciais (sem direito a voto) detidas pela Valec em ordinárias (com direito a voto) até meados deste mês.

Em resposta à Transnordestina, a estatal afirmou que não poderia autorizar tal medida sem a aprovação dos ministérios dos Transportes e da Integração Nacional. Além disso, afirma que não foi informada sobre a realização do aporte de R$ 300 milhões pelo Finor. Na CSN, a informação é de que esses recursos já estavam previstos e que os aportes estão atrasados, prejudicando o andamento das obras. Projetada para iniciar operação em 2010, a ferrovia não tem previsão para ficar pronta antes de 2020.

O bloco de acionistas públicos é formado por BNDES, BNDESPar (o braço de participações do banco de fomento), Valec, Finame e Finor. Pelos dados apresentados pela Valec, até agora, apenas 31,9% do volume acordado em 2012 foi liberado pelo Finor e 57% pelo BNDES. Em compensação, o volume liberado pela Valec aumentou 489%. “O problema de ter uma obra pública em forma de concessão é que fica difícil a fiscalização para garantir que está sendo tocada sob os melhores métodos de engenharia e custos ideais. Afinal, o dinheiro é público”, destaca Claudio Frischtak.

Segundo ele, em qualquer lugar do mundo, ferrovias são construídas com dinheiro público. Mas não nesse modelo. Fontes próximas à Transnordestina afirmam que, embora o controle esteja com a CSN, o governo federal tem um forte poder político dentro da empresa.

Para o ex-diretor executivo da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), Rodrigo Vilaça, apesar de todo imbróglio envolvendo a obra, o governo precisa tomar uma medida que permita seu término. “Se a opção for um novo sócio, é necessário um cronograma fiel do projeto, pois nenhum investidor estrangeiro vai querer entrar no empreendimento na situação atual.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.