Tim Burton sentiu uma afinidade “quase sobrenatural” ao ler o livro “O Orfanato da Srta. Peregrine para Crianças Peculiares”, de Ransom Riggs. “Por um segundo, questionei se eu mesmo não tinha escrito a obra literária”, brincou o diretor, de 58 anos, referindo-se ao universo igualmente excêntrico do autor. Povoado por mulher que vira pássaro, menino invisível, gêmeos com poderes telepáticos e garoto que solta abelhas pela boca, entre outros tipos com habilidades incomuns, o mundo de Riggs não poderia ter encontrado cineasta mais apropriado para traduzi-lo nas telas.

“Não procuro necessariamente personagens estranhos. Mas eles sempre dão um jeito de chegarem até mim”, disse Burton, responsável pela adaptação que estreia no dia 29 no Brasil, intitulada “O Lar das Crianças Peculiares”. Foi por sugestão dos produtores Jenno Topping e Peter Chernin que o diretor leu o livro — criado a partir de fotografias antigas sombrias (e até mesmo perturbadoras) que Riggs coleciona desde criança. As imagens são reproduzidas no livro, em pontos estratégicos da trama. “As fotos chamaram a minha atenção por lembrarem filmes clássicos de horror.’’

GUARDIÃ Eva Green como a srta. Peregrine: ela acolhe quem o mundo renega
GUARDIÃ Eva Green como a srta. Peregrine: ela acolhe quem o mundo renega

Poesia e Mistério 

Trata-se da história de Jake (Asa Butterfield), um jovem forçado a viajar para uma ilha após presenciar o assassinato de seu avô, devorado por um monstro. Lá, ele conhece a srta. Peregrine (Eva Green) e as crianças especiais que vivem sob os seus cuidados. Entre elas, Emma Bloom (Ella Purnell), por quem Jake se apaixona, apesar de a garota flutuar, sendo obrigada a usar sapatos pesados para ficar presa ao chão. Mesmo se achando “normal”, Jake terá a missão de proteger os órfãos de ameaças externas. “Tudo isso faz sentido para mim”, contou Burton, conhecido por transportar a plateia para ambientes bizarros, onde imperam os elementos surreais, o visual gótico, o humor negro e os protagonistas incompreendidos.

ARMADOS Os seres extraordinários do orfanato: eles precisam se proteger das ameaças de fora
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Diretor de “Batman” (1989), “Edward Mãos de Tesoura’’ (1990), “A Noiva Cadáver” (2005), “Alice no País das Maravilhas” (2010) e “Frankenweenie” (2012), Burton procurou se manter fiel “à poesia, ao mistério e à simplicidade” da obra de Riggs. “Mas não sei se ele vai gostar. Quando vi a reinterpretação de ‘Edward Mãos de Tesoura’ feita pelo coreógrafo Matthew Bourne, para o mundo da dança, senti como se estivesse saindo do meu corpo. Foi como se a minha vida estivesse acontecendo,
sem que eu estivesse lá’’, lembrou, rindo.

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ENTREVISTA

Tim Burton
“Meu único prazer era imaginar histórias”

De onde vem o seu gosto pelas histórias obscuras?
Para mim, os elementos arrepiantes são inerentes à vida. Ainda bem que as crianças gostam do que eu faço, provando que não sou tão sinistro. Até os cães gostam de “O Mundo Estranho de Jack” (1993)!

Por que acha que as crianças gostam?
Elas são atraídas pelo abstrato. E é importante que elas aprendam cedo a lidar com um imaginário mais sombrio, incluindo o tema da morte, mesmo que elas não processem isso intelectualmente. Incorporo elementos cômicos e emocionais para facilitar esse entendimento.

Que tipo de criança você foi?
Já nasci com 80 anos (risos). Agora é que eu estou me tornando criança. Por me sentir um extraterrestre perto dos outros garotos, cresci isolado. Meu único prazer era imaginar histórias.

Como lida com o fato de ter um estilo único, reconhecível logo nas primeiras cenas?
Não penso nisso. Tudo o que eu queria era deixar de ser uma coisa para me transformar em ser humano. Mas isso não durou muito. Ao ganhar projeção como diretor, eu me tornei novamente uma coisa, rotulado de esquisito. Mas é apenas a minha visão do mundo.


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