Original, criativa, esplendorosa sem ostentação. A cerimônia de abertura da Rio 2016 merece diversos adjetivos, além do inegável mérito de resgatar a autoestima nacional, tão abalada pela sucessão de crises econômicas, políticas e morais. A festa encheu nossos olhos sem apelar para a pieguice ou a patriotada e sem esconder algumas de nossas mazelas do passado e do presente. Nossa história escravocrata e devastadora foi retratada com inteligência, abrindo espaço para um evento repleto de significados. Mensagens em defesa da diversidade, tolerância, responsabilidade social e ambiental nunca foram tratadas tão abertamente, ao vivo, para uma audiência tão grande. Os organizadores do espetáculo podem ser lembrados, no futuro, como os precursores de um movimento transformador: a partir de agora, quem estiver à frente de qualquer evento – de menor ou maior alcance – terá de incluir, mesmo nos momentos mais solenes, uma dose generosa de propósito. Terão de se engajar e comunicar suas causas a seus públicos.

Quando baixa a poeira do deslumbramento, porém, é possível encontrar alguns reparos a fazer aos produtores do show que abriu os Jogos Olímpicos. Assim como demonstraram ali a competência da produção cultural brasileira, não teria sido importante apontar para o mundo que há por aqui excelência e propósito em outras atividades econômicas e científicas? Falaram com propriedade do Brasil arcaico, mas esqueceram do Brasil moderno e dos seus propósitos. Mostraram como os antigos senhores da terra a exploraram à exaustão, mas poderiam ter contado a bilhões de espectadores em diversos continentes que boa parte dos alimentos que eles consomem hoje possui origem, esforço, competência e ciência brasileiros.

Era possível fazer o emocionante voo do 14 Bis chegar aos jatos da Embraer ou apontar o papel de liderança do País nas discussões sobre a elaboração de um compromisso global nas questões climáticas e ambientais. O Brasil, de fato, ainda está longe de ser uma nação justa e desenvolvida, mas precisa se orgulhar de suas ilhas de competência, até mesmo para estimular que outras venham a surgir. O primeiro ato da Rio 2016 foi inesquecível. O segundo poderia ter sido o de plantar outra semente, a do Brasil que já dá certo.


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias