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 O escritor e artista plástico Nuno Ramos mostra-se conciso e à vontade na escrita dos contos e histórias mínimas de “O Mau Vidraceiro” (Globo). Ele transita por diversos temas e confere à obra uma equilibrada combinação de humor, densidade e lirismo, sem deixar de revelar certo escárnio pela espécie humana, o que se vê ao menos nas narrativas de “Fazendeiro do Ar” e “Não Pode Sobrar Nenhum”.

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Leia "Lua ou Chão", parte da obra "O Mau Vidraceiro", de Nuno Ramos

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Agradeço ao chão ter sustentado meus passos; receberá sem juros a minha carne grata. Agradeço ao chão ser plano tantas vezes e outras vezes montanhoso, instável. Agradeço à lua boiar. Agradeço aos dois e sigo adiante, acenando ao alto e ao baixo.

Aqui. Escutem. Há corpos por toda parte. Aqui se morre muito. Há gente tapando os olhos, dormindo de dia para não ver isso. Nasci no meio da terra dos outros, no meio da tarde dos outros. Este lugar nunca foi meu. Meu truque, chão, foi me manter em movimento, an-dando em zigue-zague, apagando minhas pegadas, disfarçando meu odor, engolindo minha raiva. Meu tru-que, lua, foi olhar para cima enquanto caminhava. E amar os sargaços que você, lua, move lentamente, amar o couro da sola dos pés que você, terra, suja e engole.

E cantar bem alto a mesma vogal: áá.

Lua ou chão? Ambos.


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