Até alguns anos atrás, não havia muitos subterfúgios em sala de aula. Era a lousa, a carteira, muitas lições e o sinal, que parecia demorar dias para tocar. Ou minutos, se o professor fosse bom. Hoje em dia, os recursos de sala são cada vez mais pirotécnicos, mas perdem o sentido se não manejados por um bom mestre. Harley Sato sabe disso. Antes de se formar em engenharia na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), ele constatou seu talento para ensinar física, uma das matérias mais temidas pelos alunos. Há 15 anos, dá aula no cursinho Anglo e, recentemente, passou a ensinar no ensino médio do Colégio Renovação, em São Paulo. “Acho que o que dá certo, no meu caso, é um misto de experiência, gogó e animação”, conta. Entenda por animação não só as brincadeiras em sala de aula, mas também as imagens em flash que ele mesmo cria para ensinar a matéria de uma forma mais didática.

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EXTRACLASSE
Felipe Silva (dir.), do São Bento, no Rio de Janeiro, durante aula de astronomia

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Em São Paulo, o Colégio Vértice, escola número 1 no ranking do Enem no Brasil, é prova da diferença que um professor de qualidade faz na educação. Com arquitetura simples, a instituição não privilegia recursos tecnológicos de última geração, que seduzem muitos pais. “Aqui o professor é a estrela principal”, frisa o diretor Adilson Garcia. Lá, a média salarial do corpo docente é de R$ 7 mil. A seleção é criteriosa, mas ex-alunos interessados em dar aula no colégio recebem uma atenção especial. “Eles já conhecem a nossa metodologia e têm um carinho grande pela escola”, diz Garcia. É o caso da professora de matemática Ana Carolina Koloszuk de Miranda, que foi aluna do Vértice, dá aulas no colégio e já tem a vaga garantida para a filha Laís, que deve nascer só daqui a dois meses. “Do jeito que está concorrido, acho que vou ter que entrar na fila”, brinca, se referindo à intensa procura pelo Vértice por causa do primeiro lugar no ranking. Segundo Garcia, cada vez mais mulheres grávidas garantem a inscrição para turmas que só vão iniciar daqui a três anos. É comum que pais definam a escola de seus filhos a partir de sua colocação no Enem. Mas a prática é observada com cautela por psicopedagogos e educadores. “Ir por esse caminho pode ser uma armadilha”, alerta Quézia Bombonatto, presidente da Associação Brasileira de Psicopedagogia. “Mais que uma boa colocação, é preciso que a escola dê importância ao desenvolvimento do raciocínio, do pensamento criativo e do senso crítico.” O ideal é que o Enem seja apenas mais um dado a ser avaliado, não o único.

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FUTURO
Os alunos do Colégio Sinodal, de São Leopoldo (RS), aprendem empreendedorismo no ensino médio

Geralmente descartadas pela classe média, as escolas públicas devem ser uma opção a ser considerada. “Dizer que só escola particular no Brasil é boa é um mito”, diz Marieta Lúcia Machado Nicolau, professora associada da Faculdade de Educação da USP. “Sem dúvida, é difícil encontrar escolas do governo de qualidade, mas elas existem e estão fazendo um ótimo trabalho.” Uma das vantagens é o universo plural e essencialmente democrático que elas oferecem. “Nas particulares, o aluno só convive com uma fatia bem delimitada da sociedade.” Foi isso que motivou a decoradora de festas Paula Fortuna a colocar os filhos Tiago, 13 anos, e Caio, 11, numa das instituições mais conceituadas do Brasil, o Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro. “Lá meus filhos escolhem seus amigos por afinidade, não pelo endereço”, diz. O segredo do colégio público mais badalado do Brasil é o mesmo do particular número um do Enem, o Vértice: os professores. “Mais da metade do nosso corpo docente se dedica exclusivamente ao Pedro II”, explica Anna Cristina da Fonseca, diretora de ensino. No ano passado, a diretoria conseguiu atender 90% dos pedidos de afastamento para realização de teses de mestrado e doutorado. Resultado: mais de 80% dos mestres têm pós-graduação.

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ARTE
Todos os alunos do Sinodal têm aula de música. Camila escolheu tocar violino

Para aprimorarem o método pedagógico e melhorar a qualidade do que é oferecido a seus alunos, muitas secretarias municipais do País aderiram às redes de ensino, como Anglo, COC, Objetivo e Positivo, que terceirizam suas apostilas e treinam os professores. De acordo com um estudo da Fundação Lemman, de São Paulo, as notas das escolas públicas que adotaram o sistema melhoraram consideravelmente nos exames do Prova Brasil, do MEC. “É um modelo que funciona muito bem para escolas que não têm condições de investir nos professores”, afirma Guilherme Faiguenboim, diretor da Associação Brasileira de Sistemas de Ensino (Abrase) e do Anglo. “Para as públicas, tem dado certo.” Além das apostilas, os professores são treinados e acompanhados ao longo do ano letivo, o que nem sempre acontece quando dão aulas com os livros didáticos do MEC.

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DEMOCRACIA
Paula colocou os filhos em escola pública para ampliar o universo de convivência deles

Um terço das escolas particulares brasileiras também utiliza esses sistemas, principalmente as localizadas no interior. Mas especialistas alertam sobre os problemas dessas redes de ensino. Elas privilegiam o conteúdo sem valorizar a formação do aluno como indivíduo, preocupação constante nas particulares com projeto consistente.

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SIMPLICIDADE
Classes pequenas, bons professores e atenção individualizada são
as características do Vértice (SP), o campeão do Enem

Uma maneira de valorizar a formação do aluno e suas aptidões pessoais são as disciplinas diferenciadas e as aulas extraclasse. No Colégio Sinodal, de São Leopoldo, número 1 do Enem do Rio Grande do Sul, além de uma forte ênfase nas artes e nos esportes, há aulas de educação financeira para todos os alunos a partir do quinto ano do fundamental. No ensino médio, os adolescentes aprendem emprendedorismo como disciplina obrigatória. “Eles precisam, inclusive, montar um plano de negócios de uma empresa”, conta Ivan Renner, diretor da escola. “Queremos que eles tenham espírito empreendedor.” No Colégio Equipe, do Recife, primeiro lugar do Enem de Pernambuco, o infantil tem até aula de horta, na qual aprendem o valor do campo e da alimentação.

Na hora de escolher uma escola, também é muito importante observar se o discurso está aliado à prática. Uma maneira de medir os valores de uma instituição de ensino é questioná-la, por exemplo, sobre inclusão social e de deficientes físicos. “Esse é um meio de formar adultos conscientes”, lembra Quézia Bombonatto. Além disso, não custa saber como ela lida com questões tão incômodas quanto atuais, como o bullying e o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH). Aquela que tiver programas anti-bullying e cuidado especial para a criança TDAH está alinhada com temas do momento, que devem ser tratados com atenção. Com tantas variáveis, é inevitável que os pais se cobrem demais de si mesmos. Principalmente se perceberem que fizeram a escolha errada. Mas, se for preciso, nada impede que decisões sejam revistas. Se os pais estiverem seguros, garantem os especialistas, o filho também ficará. Além de muito mais satisfeito. E não é isso, afinal, que um pai mais deseja para seu filho?
Colaborou Danilo Tenório, do Recife (PE)

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