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A vida que o dono do falido Banco Marka, o ítalo-brasileiro Salvatore Alberto Cacciola, 64 anos, leva hoje é certamente bem diferente do cotidiano de milionário que tinha antes de retornar ao Brasil e ser mandado para a penitenciária Bangu 8, no Rio de Janeiro – mas nem por isso ele pode reclamar. No cárcere, Cacciola é uma celebridade que atrai atenções e consegue manter um mínimo de conforto. O ex-banqueiro tem um frigobar, tevê e DVD. Não veste uniforme, só suas próprias roupas, boa parte delas de grifes italianas. Não come a gororoba do Desipe. Normalmente, alimenta- se com comidas enviadas pela família. Só bebe água mineral – de galão, é verdade. Ele abastece sua geladeira com coisas vendidas na cantina da cadeia, como sanduíches, biscoitos e refrigerantes. Mas apesar desses “luxos”, Cacciola não é malvisto pelos presos comuns porque transformou-se numa espécie de guru. Freqüentemente, ele passa horas conversando com seus novos “colegas” deprimidos. Gesticula, abraça, conforta. A “audiência”, não raro, termina em gargalhadas.

O ex-banqueiro já conversou com o ex-subchefe da Polícia Civil do Rio, Ricardo Hallac, preso pelo suposto envolvimento com a máfia dos caça-níqueis. Mais do que ajudar, ele se tornou “amigo de infância” dos irmãos Jerônimo e Natalino, respectivamente vereador e deputado estadual, acusados de chefiar milícias na zona oeste do Rio. Os dois passaram a chamá-lo de “mestre”, numa referência que se supõe ser a seu comportamento com os demais detentos. Para a direção da Secretaria Estadual de Administração Penitenciária, Cacciola, com todo o seu otimismo, tem ajudado muito os demais detentos da Penitenciária Pedrolino Werling de Oliveira, conhecida como Bangu 8, no Complexo Penal de Gericinó, no bairro Bangu, subúrbio do Rio. A prisão tem capacidade para abrigar 257 detentos. O preso ilustre costuma usar bermudas e camisas tipo pólo, de diversas cores, calçando sandálias de couro, mocassins ou tênis. Também caminha pela pequena quadra desportiva da penitenciária com moletons sofisticados, tênis Nike ou Mizuno, e meias esportivas.

Segundo fontes do sistema penitenciário, Cacciola é uma pessoa refinada, mesmo no xadrez. Advogados e parentes de outros presos dizem que ele fala pelo celular. Segundo uma prima de outro detento, o ex-banqueiro parece muito à vontade, conversa animadamente com os companheiros, conta piadas e ri muito. “Nem parece que está preso”, diz ela. Em dias de visita, recebe o irmão Renato e os filhos Fabrizio, que mora na Itália, e Rafaella, que todas as segundas e sextas-feiras sai de sua casa na avenida Epitácio Pessoa, na Lagoa, uma das áreas mais nobres do Rio, para ver o pai em Bangu. Os filhos evitam reclamar da situação do ex-banqueiro e afirmam apenas que ele está sendo tratado com respeito.

A pior parte é a falta de privacidade – já devidamente notificada por seus advogados. Cacciola divide uma cela de 125,23 metros quadrados com outros 32 presos VIPs; e a cela está apenas com 50% de sua capacidade ocupada. O que mais incomoda os presos de Bangu 8 é o aterro sanitário, que fica colado à penitenciária e acarreta mau cheiro, moscas e até ratos. Outra queixa é a falta de água quente. A cela possui dois banheiros: um com vaso sanitário e outro com chuveiros. “Mas quem pagar, consegue um banho com água quente”, garante a parente de um colega de cela do ex-banqueiro. “Aqui tudo gira em torno de um trocado”, completa. Ela se questiona: “Será que o Cacciola está mesmo tomando banho frio?”.

Nos dias em que está aberto à visitação, o Complexo Penal de Gericinó transforma-se em pista de desfile de carros caríssimos como Honda Civic, Toyota Corolla, Ford Hilux e os mais esportivos, também caros, Eco Sport e Cross Fox. Todos com vidro preto, claro. Bangu 8 é conhecida como prisão VIP porque é o endereço dos presos com curso superior, ricos e/ou poderosos, como delegados, detetives da Polícia Civil do Rio, advogados, bombeiros, policiais militares, a maioria supostamente envolvida em crimes de alta rentabilidade.

Cacciola foi preso em 2000, acusado de crimes financeiros, mas ficou apenas 37 dias na cadeia. Libertado graças a uma decisão do Supremo Tribunal Federal, ele fugiu para a Itália, onde estabeleceu residência – tem dupla cidadania e, por isso, não poderia ser extraditado para o Brasil. Em 2005 foi condenado à revelia a 13 anos de prisão por peculato e gestão fraudulenta. No ano passado, o ex-banqueiro foi preso pela Interpol quando passeava no Principado de Mônaco. Extraditado, chegou ao Brasil no dia 17 de julho. “Ele só tem uma pena a cumprir, de 13 anos, se nenhum recurso que impetramos para anular a sentença ou reduzir a pena for aprovado. Mesmo assim nosso cliente não ficará mais do que um ano preso”, explica o advogado Carlos Eluf.