i55509.jpg

A contagem regressiva com sons emitidos por 2.008 tambores de bronze antecedeu a explosão de 11 mil diferentes fogos de artifício que encheram de luzes coloridas o superpoluído céu de Pequim. Assim foi iluminado um país decidido a mostrar uma nova face ao mundo. Mais do que a solenidade inaugural de um evento esportivo, para a China a abertura oficial da Olimpíada de Pequim pode pavimentar o caminho para conquistar a credibilidade de que o país necessita. Nos últimos sete anos, todas as agendas chinesas estiveram voltadas para a concretização do espetáculo que se iniciou exatamente às 20h (9h no Brasil) do dia 8 de agosto de 2008, quando os termômetros em Pequim registravam 30 graus centígrados e vaporizadores eram usados para procurar dar mais conforto aos mais de 100 mil espectadores no Ninho de Pássaro, como é conhecido o novo Estádio Nacional da China. Num emocionante espetáculo cênico, aliando elementos de uma cultura milenar com tecnologia de ponta, transmitido para quatro bilhões de pessoas dos cinco continentes, os chineses procuraram passar a mensagem de que a tradição de cinco mil anos não é incompatível com a modernidade.

Favorecidos pela disciplina que lhes é característica, os chineses fizeram no gramado do Ninho de Pássaro uma impecável festa orçada em US$ 100 milhões. Durante cerca de uma hora, efeitos luminosos e 15 mil figurantes dirigidos pelo conceituado cineasta Zhang Yimou contaram a milenar história da China até os dias atuais. Numa linguagem futurista, boa parte da encenação foi desenvolvida sobre um enorme papiro eletrônico e nas arquibancadas mais de uma centena de voluntários conduzia as reações do público. Em determinados momentos solicitavam aplausos. Em outros orientavam a levantar os braços. Terminada a apresentação, teve início o desfile das 205 delegações que estarão brigando pelas medalhas olímpicas. O Brasil, conduzido pelo velejador Robert Scheidt, foi o 39º país a se apresentar, uma vez que a ordem de entrada foi definida pelos hierogramas chineses e não pelo alfabeto romano. As exceções couberam à Grécia, tradicionalmente a primeira a desfilar por ser o país que apresentou a Olimpíada ao mundo, e à China, que, por ser a anfitriã, fechou o desfile. Cerca de 100 líderes mundiais estavam presentes, entre eles o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

i55510.jpgi55511.jpg

i55512.jpgHoras antes de declarar abertos os Jogos Olímpicos de Pequim, o presidente da China, Hu Jintao, abriu as portas do Grande Palácio do Povo para um banquete oferecido aos chefes de Estado que se deslocaram a Pequim. Além de Lula, compareceram George W. Bush, dos Estados Unidos, Nicolas Sarkozy, da França, e Vladimir Putin, da Rússia. Na ocasião, em uma linguagem coerente com o que foi mostrado na festa de abertura, Jintao reafirmou o compromisso de retirar a China do isolamento histórico e procurou mostrar que problemas internos como os dissidentes do Tibete, por exemplo, não ameaçam seu projeto de globalização. "Promover os Jogos Olímpicos é a oportunidade que tivemos para provar ao mundo que honramos todos os compromissos assumidos em 2001", afirmou. Em seguida, relatou que, para cumprir o que foi acertado há sete anos, a China investiu cerca de US$ 40 bilhões com a ampliação de 13 centros esportivos, a construção de outros 16, o maior aeroporto do planeta e cerca de 84 quilômetros de metrô. É a Olimpíada mais cara da história. Os números não assustaram o presidente Lula, em plena campanha para que o Brasil seja a sede da Olimpíada de 2016. "É preciso acabar com essa história de que só os ricos podem sediar as Olimpíadas. Tenho certeza de que o Brasil pode realizar um evento como esse e saio convencido de que conquistei o apoio da China para isso", disse Lula depois de uma conversa de aproximadamente uma hora com Jintao.

O presidente brasileiro desembarcou em Pequim na quinta-feira 7. Esteve reunido com o dirigente chinês e visitou os atletas brasileiros na Vila Olímpica. Acompanhado por três ministros e pelo governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, fez a campanha olímpica brasileira e chegou a se irritar com um jornalista espanhol que questionou como uma cidade com problemas de segurança como o Rio pode ambicionar sediar uma Olimpíada. "Nosso problema é mais fácil de ser resolvido do que outros que andam por aí e vamos resolvê-lo. O importante é que no Brasil não existe terrorismo", disse Lula, referindo-se ao ETA, grupo separatista que atua na Espanha. Madri é uma das cidades que também disputam a Olimpíada de 2016.

Em Pequim, Lula não se limitou a se dedicar à campanha esportiva. Fez de seus aposentos no Hotel Legendale Beijing, um cinco-estrelas inaugurado em março, um QG para procurar articular uma retomada da fracassada Rodada de Doha, de comércio multilateral. Em reunião com o presidente chinês, Lula relatou que havia telefonado para o colega Bush com esse objetivo e prometeu ligar para o primeiro-ministro indiano. "Deixa destensionar um pouco e nós vamos retomar isso", explicou. EUA, China e Índia foram os principais protagonistas do fracasso de Doha e Lula acredita que poderá servir de mediador para um novo acordo.

i55514.jpg

Se encontrar em seus interlocutores o clima olímpico dos atletas em Pequim é possível que o presidente brasileiro tenha êxito. Mas, no terreno político, as relações são mais complicadas do que nas quadras de esportes. Em Pequim, enquanto no interior do estádio o clima era de tranqüilidade, do lado de fora, policiais não escondiam a tensão. Havia na China o temor de que atos terroristas pudessem comprometer a festa ou que ativistas contrários à política do presidente Hu Jintao tentassem promover alguma manifestação. Para se precaver, o governo espalhou 100 agentes de segurança pelas ruas da capital e equipamentos antimísseis foram estrategicamente distribuídos ao redor do Estádio Nacional. Agora, passada a tensão da abertura, cerca de dez mil atletas estarão em busca dos pódios. Que os Jogos Olímpicos de Pequim ocupem apenas as páginas esportivas.