Nos tempos de alta tensão entre os Estados Unidos e a extinta União Soviética, os moradores da vila de Prenden, na antiga Alemanha Oriental, olhavam com suspeição para a colina de Wandlitz, nas proximidades. Eles jamais puderam se aproximar, mas durante cinco anos acompanharam a distância o transporte de materiais para um projeto que julgavam ser um futuro depósito de mísseis. A obra ultra-secreta, codificada como projeto 17- 5001, era na verdade um sofisticado refúgio antiatômico. Em caso de ataque nuclear, abrigaria por até duas semanas a cúpula do poder do país – o dirigente Erich Honecker e outros 30 integrantes do Conselho Nacional de Defesa. Com eles, também entrariam 320 militares encarregados de sua segurança. Passado o perigo, os líderes comunistas subiriam à superfície, embarcariam em carros blindados até uma base aérea e, de lá, voariam para Moscou, então capital soviética.

O temido ataque jamais aconteceu. O Muro de Berlim, que dividia o mundo entre capitalistas e comunistas, foi derrubado em 1989. O bunker, que ficara pronto seis anos antes, acabou desativado depois da reunificação da Alemanha. Na semana passada, quando o complexo foi pela primeira vez aberto ao público, recebeu uma visita familiar à sua antiga rotina. Era o técnico Falco Schewe, que trabalhou na rede de comunicação do abrigo antiatômico, fato conhecido à época apenas por sua mãe e sua mulher.

“Eu estive nele todos os dias, entre 1987 e 1991”, contou Schewe à imprensa internacional. “Ficávamos sempre muito relaxados, mas achávamos que um dia o bunker poderia ser usado.”

Honecker, o líder da Alemanha Oriental que simbolizava o alinhamento incondicional a Moscou, só esteve no complexo uma vez, logo após a sua conclusão. Não ficou mais que 15 minutos, ou seja, não conheceu quase nada do projeto. Apenas para se ter uma referência, a visita guiada ao bunker dura duas horas. “Nesse tour você vai conhecer 20% do bunker, mas são as partes mais importantes”, anuncia a Berlin Bunker Network, organização criada em 2002 para pesquisar o espaço e abri-lo ao público.

Visto de fora, o bunker não passa de um buraco cavado no solo, no meio de um bosque, a 40 quilômetros de Berlim. Em três andares subterrâneos, porém, o complexo soma 7,5 mil metros quadrados de área, que começa em uma câmara de descontaminação. Na seqüência, foi montada toda a infra-estrutura necessária para a sobrevivência de líderes políticos em situação de crise, incluindo uma rede de comunicação com o resto do mundo. Chamado de Pérola por seus idealizadores, o bunker deixou de ser um segredo depois da queda do Muro de Berlim. Colocado sob os cuidados do Exército da antiga Alemanha Ocidental, teve parte de seus equipamentos retirados em abril de 1993, quando foi lacrado pela primeira vez.

Aventureiros e vândalos, no entanto, reabriram o complexo ilegalmente diversas vezes. O lugar também virou alvo da ação de saqueadores. Agora a BBN, que registrou o bunker em 1.500 fotografias, organiza visitas guiadas com o objetivo de arrecadar dinheiro para fechar o local de forma definitiva em outubro. “Não temos recursos para proteger o bunker nem queremos que ele seja destruído”, diz o fotógrafo Thomas Bergmann, da BBN. Melhor sorte teve o bunker construído pela antiga Alemanha Ocidental entre 1960 e 1970, ao sul de Bonn. Devidamente restaurado, o abrigo antiatômico destinado aos políticos capitalistas virou museu no começo deste ano.

 

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