img.jpg
RAÍZES
Filho de cafeicultores, Plínio até aceita ser chamado de
quatrocentão, mas não admite o rótulo de burguês

selo.jpg

O octagenário Plínio de Arruda Sampaio nunca teve tanta popularidade em sua longeva e prolífica vida política quanto nesta última semana. Candidato à Presidência da República pelo Psol, Plínio conseguiu dar molho a uma campanha presidencial insossa, em que os principais concorrentes tentam ser clones mal ajambrados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A conquista do reconhecimento popular foi meteórica e resultado direto de sua participação no primeiro debate entre os presidenciáveis, ocorrido na quinta-feira 5 e transmitido pela Rede Bandeirantes. Com tiradas irônicas, críticas mordazes e sem poupar nenhum de seus adversários, Plínio acabou conquistando o lugar do candidato de protesto. Coube a esse senhor de exatos 80 anos, aparência frágil e fala pausada trazer algo de novo à disputa eleitoral, ainda que a novidade trazida por ele tenha cheiro do álcool usado em mimeógrafos para reproduzir textos panfletários de décadas passadas.

Plínio é um candidato com ideias que foram esmagadas com a queda do Muro de Berlim e o esfacelamento do bloco soviético. Ainda chama os agricultores brasileiros de camponeses, ­defende o não pagamento de uma dívida externa já virtualmente quitada e prega uma reforma agrária agressiva, com a desapropriação de todos os latifúndios no Brasil. Mas seu sucesso entre os eleitores brasileiros, que agora o param nas ruas, desejam-lhe boa sorte e lhe oferecem beijos e afagos, parece ter pouca relação com as bandeiras ideológicas que esse advogado vem carregando há quase seis décadas. Está muito mais ligada, é verdade, ao papel que assumiu no debate da Rede Bandeirantes. Nele, chamou Marina de “eco-capitalista”, Serra de hipocondríaco e acusou Dilma de querer ser uma “mãe dos pobres”. “Isso aqui parece um encontro de polianas. Não pode. Alguém tem de ser contra alguma coisa”, disse ele, entre os vários protestos que fez durante o debate por não estar sendo tão questionado quanto seus adversários.

O antagonismo da figura quase plácida de Plínio com uma postura de um jovem punk da periferia paulistana conquistou admiradores de forma imediata. No Twitter, as 100 pessoas que o seguiam no início daquela quinta-feira ganharam a companhia de 20 mil outras em apenas sete dias. Seu nome entrou na lista dos assuntos mais discutidos da rede social e, em pouco tempo, mensagens de todo o País começaram a pipocar em sua página. “Esse velho é da hora”; “Chegou o tempero que faltava para essas eleições”; “Se tu olhares para a cara do tiozão, não dá nada. Mas vá ouvi-lo no debate. É show”; foram alguns dos milhares de citações que Plínio recebeu na internet. “Mesmo que seu discurso esteja na contramão da história, existe um nicho de eleitores que quer ouvir algo diferente”, explica a cientista política da USP Maria do Socorro Souza Braga. “Em uma eleição em que faltam ideias novas, existe um eleitor insatisfeito que está sem rumo e o Plínio está ocupando com sabedoria este lugar.”

Plínio pegou embalo na rebeldia. “Que mal faz um baseado?”, perguntou a uma plateia de estudantes, durante debate na PUC do Rio, na quinta feira 12. Ele defendeu a liberação da maconha, o direito ao aborto, a união de pessoas do mesmo sexo e a extinção do Senado. Com o novo jeito desafiador, de um dos quase invisíveis candidatos nanicos, passou a ter um espaço antes só reservado aos três primeiros colocados nas pesquisas eleitorais. Sua agenda, antes vazia, agora está repleta de pedidos de entrevistas, eventos políticos e, claro, muito convite de candidatos ao Parlamento em busca de qualquer sorte de apoio. “É o efeito Obama. A televisão é um perigo. Estou sendo conhecido na rua. É incrível”, comemorou Plínio, na manhã seguinte ao debate, durante uma panfletagem na capital paulista.

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail

img1.jpg

Apesar da rebeldia juvenil revestida pelo verniz já ressecado da década de 60, Plínio não é nem nunca foi um integrante da classe operária que ele durante toda a vida sonhou em levar ao paraíso. Suas origens remontam à elite paulista que dominou a Primeira República em conjunto com as oligarquias mineiras. Seu pai era um cafeicultor de Sertãozinho (SP) e desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo e ele, ainda jovem, entrou na seleta faculdade de direito do Largo São Francisco. Formou-se lá em 1954 e no mesmo ano tornou-se promotor de Justiça de Sertãozinho. Na vida política, ingressou ainda cedo no Partido Democrata Cristão, que viria eleger Jânio Quadros presidente da República em 1960. Por meio dele tornou-se deputado federal em 1962, cargo que lhe foi cassado pelos militares que tomaram o poder em 1964. Após mais de dez anos no exílio, voltou ao Brasil e participou ativamente de todo o processo de reconstrução democrática do País. Ajudou a fundar o PT e desligou-se dele em 2005 para criar o Psol. Entre todos os candidatos a presidente nestas eleições, Plínio é o mais rico. Tem bens avaliados em mais de R$ 2 milhões. Indagado sobre a dicotomia entre sua vida privada e seus ideais públicos, é taxativo: “Podem até me chamar de quatrocentão, mas de burguês jamais.” O difícil, nesses tempos em que as ideologias parecem não mais poder ser distinguidas umas das outras, é saber exatamente o que é ser burguês.


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias