Hollywood se permite extravagâncias que muitas vezes se tornam históricas – quando não catastróficas. Em 1980, por exemplo, os estúdios United Artists injetaram US$ 40 milhões, uma fortuna para a época, na saga O portal do paraíso. Foram à falência. A mais nova extravagância hollywoodiana chama-se Trovão tropical (classificação indicativa a conferir), uma comédia maluca escrita, produzida, dirigida e estrelada por Ben Stiller, cujo orçamento chegou à casa dos US$ 100 milhões. Sátira escrachada aos filmes de guerra e ao meio cinematográfico de Los Angeles, a produção não vai levar à bancarrota a sua produtora, a DreamWorks. Muito pelo contrário: atualmente é o filme mais visto nos EUA. Mas vai entrar para a história como o mais caro besteirol já feito pela indústria cinematográfica americana. Quem for aos cinemas a partir da sexta-feira 29 vai entender por que Trovão tropical está causando tanta polêmica, deve preparar o humor para a sucessão quase histérica de piadas – tanto ótimas quanto de mau gosto – e refrescar a memória para identificar e rir com mais vontade das infinitas referências ao mundo pop.

A primeira piada está nos próprios tipos mostrados na comédia, todos eles pertencentes ao meio do cinema. Eles estão envolvidos na produção de um caríssimo filme de guerra, o tal Trovão tropical do título, cuja ação se passa durante a Guerra do Vietnã. Encabeça o elenco desse "filme dentro do filme" o bombado Tugg Speedman (Ben Stiller), astro decadente de uma série tipo Rambo e protagonista de um drama sobre um fazendeiro com deficiência mental, que conversa com animais; Jeff Portnoy (Jack Black), estrela de comédias escatológicas sobre uma família de obesos flatulentos, viciado em heroína; Alpa Chino (Brandon T. Jackson), rapper de estilo pornográfico, cujo sucesso I love tha’ pussy é melhor nem traduzir; e Kirk Lazarus (Robert Downey Jr.), ator australiano ganhador de cinco Oscars, que se submeteu a um escurecimento de pele para interpretar o sargento negro Lincoln Osiris.

Defensores do politicamente correto chiaram com cada um desses personagens. O que está dando mais o que falar é o ator australiano interpretado por Downey Jr., que usou creme no rosto, peruca e uma prótese para aumentar os lábios. Eles acusam Stiller de lançar mão do abominável "blackface", recurso de pintar o rosto de atores brancos com tinta preta para interpretar personagens negros, em voga no teatro e na Hollywood do passado. Bobagem. Na verdade, Stiller está escrachando é com a presunção do ator australiano, um daqueles tipos que adoram um laboratório e levam sua profissão muito a sério. Ao explicar ao colega Speedman por que ele nunca ganharia um Oscar com seu filme Simplesmente Jack, Lazarus faz um apanhado de todos os "retardados" do cinema – nenhum deles é "100% retardado" como o personagem de Speedman. Mas é graças a esse papel que os atores conseguem se livrar da maior enrascada – na grande reviravolta da história, o diretor do "filme dentro do filme" resolve transformar o set numa espécie de reality show e o elenco se perde nas matas asiáticas. Alguns atores caem nas mãos de um cartel do tráfico de heroína em Miammar e só não são mortos porque os traficantes adoram Simplesmente Jack.

Essa é apenas uma pequena amostra da trama absurda de Trovão tropical, que funciona como se Platoon ou Apocalipse now fossem assinados pelo grupo inglês de humor Monty Phyton. No desfile de tipos hollywoodianos de caráter duvidoso aparecem ainda o técnico em explosões Cody (Danny Mc- Bride) que "quase cegou a atriz Jamie Lee Curtis em Sexta-feira muito louca" e o ex-veterano, autor da história em que se baseia o roteiro, um tal de John "Quatro Folhas" Tayback (Nick Nolte), que na verdade nunca pôs os pés no Vietnã. Quando Cody descobre a sua farsa, lhe diz: "Então você é o Milli Vanilli do patriotrismo" (Milli Vanilli era uma dupla dos anos 80 que cantava em playback). A melhor piada, contudo, é a aparição de Tom Cruise na pele do produtor do filme, um homem de meia-idade gordo, careca, peludo, desbocado e fã de rap boca suja. É de fechar as portas da cientologia.