i57972.jpgO nepotismo é uma praga da administração pública com raízes profundas. Na célebre carta ao rei de Portugal Dom Manuel, datada de 1º de maio de 1500, Pero Vaz de Caminha solicitou um emprego para o genro. “Peço por me fazer singular mercê, mandar vir da Ilha de São Tomé, Jorge Dozoiro, o meu genro, o que dela receberei muita mercê”, escreveu Caminha. O trecho foi lido na quarta-feira 20 pela ministra Cármen Lúcia durante a sessão em que o Supremo Tribunal Federal decidiu dar um basta à contratação de parentes no País, sem concurso, em cargos de chefia, direção ou assessoramento na administração pública. O STF aplicou ao Legislativo e ao Executivo a proibição que está em vigor no Judiciário desde 2005.

A regra disciplina órgãos das esferas dos Três Poderes em níveis federal, estadual e municipal. “Trata- se de gesto ilegítimo de patrimonialização do Estado”, disse o ministro Celso de Mello. Quem for enquadrado deverá ser demitido sob pena de sofrer ação do Ministério Público. Só estão livres da restrição ministros e secretários de Estado e de municípios.

Segundo cálculo do relator da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que previa o fim do nepotismo na Câmara, deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), cerca de 1.500 servidores em cargos de confiança no Congresso Nacional têm grau de parentesco com parlamentares. No Senado, o vício vinha da cúpula. O presidente da Casa, Garibaldi Alves (PMDB-RN), que emprega um sobrinho, admitiu, na quinta-feira 21, que terá de demiti-lo. O primeiro-secretário, senador Efraim Morais (DEM-PB), emprega seis parentes em seu gabinete. No último dia 7, depois de o assunto ser divulgado pela imprensa, o senador exonerou a filha Caroline Morais, 21 anos, que recebia R$ 3.600 mensais como assessora parlamentar. Permanecem lotados em seu gabinete, no entanto, sobrinhos e primos de sua mulher. O senador Mão Santa (PMDB-PI) também terá que demitir a mulher, Adalgisa – que ocupa cargo de confiança em seu gabinete.

Entre os governadores, Roberto Requião (PMDB), do Paraná, tem seis parentes empregados, entre eles a mulher e dois irmãos. Na Câmara, existem pelo menos 16 filhos e 12 mulheres de parlamentares empregados em cargos de comissão. O deputado Átila Lins (PMDB-AM), por exemplo, emprega um filho e já teve uma filha trabalhando com ele, exonerada em outubro de 2007. Um dos casos mais clamorosos, porém, envolve seu irmão, o presidente da Assembléia Legislativa do Amazonas, Belarmino Lins. Ele tem 12 parentes trabalhando em seu gabinete em Manaus, entre os quais a mulher e cinco filhos. Lins já empregou a mãe de 80 anos, mas diz que a exonerou. Perguntado sobre o que sua mãe fazia no gabinete, Belarmino Lins disse: “O que uma mãe faz? Aconselha os filhos, os protegem, os orienta.” Para exercer essas tarefas, uma mãe, obviamente, não precisa ocupar um cargo público. Afinal, a administração do País não é a casa-da-mãe-Joana.


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