Elite, no Rio de Janeiro, é uma tradicional gafieira da rua Frei Caneca, no velho centro da cidade. A casa cobra R$ 20 pela entrada.

Logo, está livre da suspeita de elitismo. E, em matéria de programa social, seu forte é o Baile do Balacobaco. Dito assim, parece que a elite chegou ao fim da linha. A sociedade brasileira aguenta tudo, menos qualquer insinuação de que anda metida com essa tal de elite. Prefere neologismos que dão e passam tão rápido que o País mal tem tempo de pensar se eles são politicamente corretos – como “emergentes”,
“colunáveis”, “famosos” ou “do BBB”.

Mas a veneranda gafieira carioca prova que a impopularidade da elite não veio de baixo, ou não continuaria ali, no mesmo endereço da Frei  Caneca. O que vem a calhar em debates onde o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso critica o “populismo autoritário” e Caetano Veloso chama Lula de “analfabeto”. Alguém sabe do que eles estão falando?

A turma da Elite provavelmente sabe. E, se ela souber, a hora é esta para a elite tentar a volta por baixo, talvez promovendo seu próprio Baile do Balacobaco, que pelo jeitão deve ser o da Ilha Fiscal pelo avesso. Quando a palavra elite ainda não estava banida da língua portuguesa educada, queria dizer muito mais do que a pura e simples “grã-finagem”, outra palavra caída em desuso que faz muito menos falta à sociologia e à política do que à elite.

Um povo que não sabe mais o que é elite acaba condenado a viver distraidamente sob uma oligarquia, achando que está tudo arrumado lá no andar de cima. Com isso, paga preços até mais altos para sustentar os mesmos privilégios de poucos.

E nem sempre as sobras que os antigos inquilinos às vezes deixavam cair no andar de baixo. Na vida real, é tão comum confundi-las que, para mostrar como elite e oligarquia podem e devem ser diferentes, o economista americano Lester Thurow começou por defini-las como sendo, basicamente, o mesmo grupo de pessoas que se tratam pelos apelidos de infância, casam-se com os melhores dotes genéticos e pecuniários, ganham mais que a patuleia e mandam bastante no País.

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Se o argumento de Thurow parasse por aí, qualquer um estaria disposto a trocar uma pela outra sem pedir volta. Ou, melhor ainda, livrar-se de ambas. Mas Thurow queria dizer com isso que, no fundo, a elite e a oligarquia não diferem pelo modo de se comportar entre si, mas pela maneira de conviver com o país. A elite costuma enxergar, sobretudo nos momentos de crise nacional, muitos palmos adiante de seus interesses particulares, porque do alto de um passado relativamente mais longo tem mais visão do futuro. E a oligarquia está sempre muito ocupada com a própria sobrevivência.

Ultimamente, virou moda estudar o comportamento da oligarquia na escola natural de luta pelo poder que é a sociedade dos primatas superiores. Entre os babuínos de Botsuana, por exemplo, as oligarquias têm tamanhas prerrogativas e tal sofreguidão que seus mandatos duram, em média, oito meses. Os babuínos são políticos hábeis de nascença. Mas ainda não inventaram a reeleição. E só com muita reeleição as oligarquias compram o tempo necessário a adquirir certas manias típicas da elite saciada, como doar coleções de arte a museus ou dinheiro próprio para benemerência.

Como a política brasileira está em plena fase da voracidade oligárquica, é o que Caetano Veloso e Fernando Henrique estão tentando dizer. Mas as palavras não deixam.

Marcos Sá Correa é jornalista e editor da revista Piauí


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