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ÁFRICA DO SUL
Roupa da marca African Mosaique, da Nigéria, em desfile realizado em Johannesburgo
no ano passado, que reuniu 51 estilistas de 21 países africanos

A semana de moda mais perigosa do mundo. Assim foi apelidada, este ano, a fashion week do Paquistão, diante das ameaças de ataques terroristas do grupo Taleban e do risco de as modelos serem presas por mostrarem a pele – o país abriga uma das maiores populações muçulmanas do planeta. Além de símbolo de resistência, o evento jogou luz sobre uma indústria que movimenta anualmente cerca de R$ 20 bilhões no país, onde a tradição de recato imposto pela religião e a influência da libertária cultura ocidental dividem a passarela. Outras nações periféricas, como Índia, China, Turquia, Indonésia, Casaquistão, Venezuela, África do Sul – e mesmo o Brasil –, ganharam nos últimos anos suas próprias semanas de moda. Estima-se que haja mais de 150 no mundo, ou seja, é possível frequentar três eventos diferentes por semana.

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As fashion weeks são importantes para criar uma cultura de moda e impulsionar a economia local. Na Turquia, por exemplo, onde o primeiro evento aconteceu no ano passado por iniciativa do governo, o objetivo é formar um núcleo de design no país, que já conta com uma grande estrutura voltada à produção de roupas, tecidos e acessórios. A Turquia tem um dos polos têxteis mais importantes do mundo e produz para marcas famosas como Armani, Dolce&Gabbana e Gucci. O que se viu na primeira experiência foram estilos sensuais, com destaque para os vestidos vaporosos de sedas finas de inspiração oriental. Na Índia, país emergente de 1,1 bilhão de habitantes, ocorrem três semanas de desfiles por ano, que reúnem 150 profissionais. Estão todos atrás da maior demanda da crescente classe média por moda, antes um universo restrito aos muito ricos. Mas é difícil ultrapassar fronteiras. Apenas três ou quatro estilistas locais vendem suas criações para o exterior.

“Essas semanas de moda são relevantes apenas para o próprio país”, diz a stylist e consultora de moda Manu Carvalho. De fato, embora estejam se multiplicando, têm pouca importância aos olhos dos editores, estilistas e jornalistas especializados. Quem dita moda mesmo são as mecas fashion do planeta: Paris, Nova York e Milão. “São as ideias de meia dúzia de estilistas que acabam sendo pulverizadas para o mundo todo, tanto para as semanas periféricas quanto para as lojas populares”, explica a consultora. “É tudo muito comercial. Esses desfiles não acrescentam nada”, acrescenta Marco Sabino, autor do “Dicionário da Moda” e de “A História da Moda”, que será lançado em breve.

Segundo Sabino, o mundo da moda vive uma fase de exagero, marcada principalmente pela grande quantidade de desfiles. “Só em Paris, são 80 por ano”, diz. Ele acredita que a massificação deverá provocar um movimento de retorno às apresentações mais intimistas por parte das grandes grifes. “Tudo em excesso cansa. Não tem gente suficiente para usar esse monte de roupa”, afirma. Sabino dá como exemplo a marca francesa Givenchy, que este ano preferiu não participar da semana da coleção de inverno de 2011 de Paris. Em vez disso, está realizando exibições com horário marcado para um público seleto em sua própria maison. O motivo: criações de alta-costura, por serem mais elaboradas, devem ser vistas de perto, tocadas e avaliadas com cuidado.

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A opção mais intimista remete aos primórdios da alta-costura em Paris e Londres, entre os séculos XVIII e XIX, quando as primeiras apresentações de moda surgiram. Naquela época, as casas apresentavam suas novidades apenas para uma restrita classe de abastados. O pret-à-porter surgiu só nos anos 1960 e nas duas décadas seguintes os desfiles começaram a aparecer na forma como os conhecemos hoje. No Brasil, eles chegaram em meados dos anos 1990. Hoje, as duas semanas de moda mais importantes do País, a São Paulo Fashion Week e o Fashion Rio, podem não ditar estilo para o mundo, mas têm inegável relevância interna. Criam uma cultura de moda, impulsionam a indústria e aperfeiçoam o design nacional. Só aqui o setor fashion movimenta quase R$ 100 bilhões por ano (17% do PIB), envolve 30 mil empresas e emprega 1,7 milhão de pessoas.