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ELE VIU
A polícia diz que Bruno testemunhou a morte da ex-amante

Eu não aguento mais apanhar.” Esta teria sido a última frase dita por Eliza Samudio antes de ser estrangulada. Era um pedido de clemência, mas seu algoz, supostamente o ex-policial Marcos Aparecido dos Santos – também conhecido por Neném, Bola ou Paulista –, respondeu apenas: “Você não vai mais apanhar. Você vai é morrer.” Em seguida, Santos teria amarrado as mãos dela e dado uma “gravata” em seu pescoço até asfixiá-la. Morta no chão, Eliza ainda teria sido chutada por outro comparsa, Luiz Henrique Romão, o Macarrão. Ato contínuo, Santos teria esquartejado o corpo e jogado os pedaços para quatro rottweilers famintos. “Neném retirou a mão de Eliza e arremessou para dentro do canil”, disse à polícia o adolescente J., que também teria presenciado a execução, em Vespasiano, na Grande Belo Horizonte. “Os cachorros, no mesmo momento, começaram a comer a mão.” Segundo ele, o que sobrou da jovem estaria enterrado e cimentado na própria casa, mas a polícia diz ter indícios de que o corpo foi queimado.

Os detalhes do que pode ter sido este crime hediondo chocaram o País. Não só pela barbárie, mas também porque por trás da macabra arquitetura do assassinato estaria um ídolo, o goleiro Bruno, ex-amante de Eliza e com quem brigava para não assumir a paternidade de um menino de quatro meses. Bruno jura inocência, mas há fortes evidências contra ele, como o sangue dela no carro dele, os depoimentos de testemunhas e o fato de o bebê ter estado no sítio do goleiro, também na Grande BH, e depois ter sido encaminhado por Dayanne, mulher de Bruno, para a casa de amigos. Se a culpa dele for comprovada, a forma cruel com que se desvencilhou de Eliza e a frieza com que agiu antes, durante e depois de ir para a prisão fazem dele um monstro. “Foi um crime premeditado, planejado e friamente executado”, disse o delegado Edson Moreira, que conduz as investigações em Minas Gerais e ouviu mais de 30 pessoas até agora.

Segundo o delegado, Bruno levou Eliza até o local de seu sacrifício e, após o desfecho, teria ido tomar cerveja e bater bola – antes ateou fogo à mala dela. Quando o desaparecimento dela veio a público, o goleiro deixou-se fotografar treinando no Flamengo, no Rio de Janeiro, às gargalhadas. Na semana passada, enquanto os indícios de homicídio se avolumavam, continuou indo ao centro de treinamento e, segundo funcionários, mostrava-se tranquilo e sorridente. Puxava brincadeiras, mas jamais tocava no caso Eliza. Manteve-se inabalável até depois que se entregou à polícia carioca, na quarta-feira 7. Em conversa com Macarrão e seu advogado, gravada pela Rede Globo, Bruno revelou sua preocupação maior: “Se eu tinha esperança de disputar a Copa de 2014, acabou.” De acordo com o livro “Treinamento do Goleiro de Futebol”, do professor universitário Adalberto Viana, “controlar as emoções” é quesito fundamental para um craque dessa posição. Bruno, excelente pegador de pênaltis, parece ter aprendido a lição.

Apenas dois lampejos de bondade teriam ocorrido logo após o homicídio de Eliza. Envolvido no crime, Sérgio Rosa Sales (conheça a participação de cada um no quadro na pág 78) declarou à polícia que o bebê também seria morto, mas foi salvo, na última hora, por interferência do suposto pai. Primo de Bruno, Sales também disse que, depois do assassinato, já de volta ao sítio, o goleiro teria chorado e dito: “Tô arrependido.” No dia seguinte, porém, voltou à frieza habitual.

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VOZ
Acima, o adolescente J. com a cabeça coberta. Ele contou detalhes do crime
Abaixo, polícia apreende cães que teriam comido partes do corpo
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Para o psiquiatra forense Talvane de Moraes, o comportamento dele não indica nenhum tipo de patologia. “Fingir normalidade depois de praticar um crime faz parte da dissimulação, não significa doença”, explica Moraes. O professor de psiquiatria forense da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de Campinas Eduardo Henrique Teixeira diz que a aparente tranquilidade demonstrada pelo goleiro do Flamengo, é comum nas pessoas que perdem os pais cedo, caso do goleiro, órfão de pai e abandonado pela mãe. “Num processo de psicopatia, eles deixam de aprender a questão do amor, do afeto, do altruísmo. Perdem o parâmetro”, diz. Outros familiares de Bruno também tiveram problemas com a polícia. O irmão foi preso por roubo no Piauí, a mãe foi investigada por tentar matar a tiros uma mulher em 1996 e o pai foi acusado de furto e teve a prisão pedida sete vezes.

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ALGOZ
Marcos Aparecido dos Santos, suspeito de ser o assassino, foi preso em Minas

Seis dos dez envolvidos no caso estão presos e quatro continuavam foragidos até a sexta-feira 9. O advogado de Bruno, Ércio Quaresma Firpe, que também defende outros cinco envolvidos, criticou o trabalho da polícia mineira e o depoimento do adolescente J. apreendido na casa de Bruno, no Rio. “A Santa Inquisição foi reeditada em Minas Gerais e ninguém mais é respeitado pela polícia”, bradou. As informações de J. foram cruciais para os investigadores entenderem a dinâmica do crime, embora haja contradições em relação às declarações de Sales, outra testemunha-chave. J. diz que Sales – e não Bruno – presenciou o assassinato de Eliza, o que ele nega.

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Em torno da tragédia maior, tragédias paralelas se revelam. Veio à tona o processo contra o pai de Eliza, Luiz Carlos Samudio, acusado de abusos sexuais contra uma filha de 10 anos que teve com a irmã de uma ex-mulher. Com isso, Sônia, a mãe de Eliza, que abandonou a filha na infância, ganhou a guarda do neto, provável herdeiro do patrimônio de Bruno, na Justiça. Depois de uma rápida passagem pelo presídio Bangu II, no Rio, o goleiro está numa carceragem de Minas e teve seu contrato suspenso com o Flamengo. O clube de maior torcida no Brasil lhe deu cartão vermelho: deixou-o sem o salário de R$ 200 mil e cortou o apoio jurídico. Sua patrocinadora, a Olimpikus, também tirou o time de campo e rescindiu o contrato. Criado em uma família humilde na cidade-dormitório de Ribeirão das Neves, na Grande Belo Horizonte, Bruno conseguiu mudar de vida graças ao futebol. Agora, deixa escapar pelas mãos seu próprio futuro.
Colaboraram: Solange Azevedo e Eliane Lobato

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