Quando a situação está prestes a ter um desfecho trágico, costuma-se dizer que “o gato subiu no telhado”. A frase bem que poderia ter sido dita entre a sexta-feira 22 e a manhã da terça-feira 26, quando o mercado financeiro viveu seu momento mais conturbado desde que surgiram as primeiras denúncias sobre o pagamento do mensalão a políticos, há cerca de dois meses. A Bolsa de Valores de São Paulo despencou 3,39% em apenas um dia, o dólar chegou a acumular alta de 5,48% no mês, o risco-país subiu 20 pontos (bateu nos 422) e muitos investidores estrangeiros venderam ou trocaram suas posições com medo de a crise política contaminar a economia. De quebra, as agências de riscos rebaixaram a recomendação para os títulos da dívida brasileira negociados no Exterior. Passado o furacão, políticos, empresários e economistas passaram a defender uma espécie de blindagem para que a economia não sofra as influências negativas do caos político.

A idéia de blindar os bons resultados econômicos foi encampada pela indústria e ganhou voz no governo, especialmente depois que o próprio presidente Lula admitiu que a economia do Brasil ainda é “muito vulnerável”. Do lado dos industriais, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) iniciaram uma mobilização das lideranças empresariais para montar uma agenda mínima que assegure a governabilidade e tire o Congresso Nacional da paralisia. “O Congresso precisa legislar e o governo, governar”, disparou Armando Monteiro Neto, presidente da CNI, que levará pessoalmente a proposta ao presidente Lula ainda esta semana. Entre os pleitos, a retomada dos investimentos em infra-estrutura pelo Executivo e a volta das votações de projetos de interesse do empresariado no Legislativo. Do lado do governo, o presidente do BNDES e ex-ministro do Planejamento, Guido Mantega, foi encarregado de gestar uma proposta que proteja a economia do caos que tomou conta da política. O documento ainda em fase de formulação será apresentado à classe política e empresarial nos próximos dias e, segundo Mantega, tentará contemplar sugestões dos representantes da indústria, do senador Jefferson Peres e do deputado Delfim Netto (PP-SP), que sugeriu recentemente o déficit zero.

O compromisso é trabalhar em torno do que Mantega chama de garantia dos fundamentos econômicos, dando continuidade à política econômica com as metas de redução da inflação, do superávit primário, bem como à política de desenvolvimento e de responsabilidade fiscal. “Temos condições de blindar a economia até 2006”, diz ele. Para o economista Heron do Carmo, presidente do Corecon-SP, o conselho paulista de economia, o nervosismo do mercado financeiro é natural em meio a tantas denúncias envolvendo políticos e autoridades do governo. “O importante é o presidente Lula reiterar que vai manter a política econômica”, sugere ele. Mais cauteloso, o presidente do Instituto de Estudos para Desenvolvimento da Indústria (Iedi), Júlio Sérgio Gomes de Almeida, alerta para a paralisia do governo e do Congresso Nacional, que já começa a afetar os investimentos. “Os resultados econômicos obtidos até agora já são uma blindagem”, afirma Almeida, referindo-se às reservas em dólar por volta de US$ 65 bilhões, o superávit comercial acumulado de quase US$ 40 bilhões e o real valorizado. “Temos bala para enfrentar essa crise.” Será?


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