Estudos revelam que a maneira como as escolhas são feitas pode determinar o sucesso ou o fracasso de cada um. Personalidades contam como fazem para tomar uma decisão importante.
 

Todos os rumos de nossas vidas são definidos por decisões. Não passamos um dia sequer sem fazer escolhas, das mais simples, como que roupa vestir, às mais complexas. Casar ou não casar? Mudar de emprego ou não? Morar em outro país ou ficar onde está? Aguentar firme ou jogar tudo para o alto? Decidir pode influenciar não só os caminhos de quem escolhe, mas também dos que estão próximos ou dependem, de alguma maneira, daquele que deseja fazer modificações pessoais e profissionais. Não é fácil. Pode ser, inclusive, doloroso.

O assunto é tão complexo que já existem especialistas em ciência da decisão. Porém, são principalmente os bons exemplos, como os apresentados ao longo desta reportagem, que servem de inspiração. São brasileiros de destaque em suas áreas de atuação, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o publicitário Washington Olivetto, compartilhando experiências de como agem durante o processo decisório na hora H. E gente comum, como o ourives Thiago Mendes Joazeiro, que se jogou no meio de uma enxurrada para salvar uma desconhecida. Eles contam quais foram as mudanças cruciais enfrentadas em suas trajetórias e como fazem para tomar uma decisão importante.

Como cruzar o deserto da indecisão

Fernando Gabeira, 68 anos, deputado federal pelo PV
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"Antes de sair do PT, que era o governo, para me tornar oposição, pesei bastante o que perderia e o que ganharia. Concluí que, naquele momento, para o desenvolvimento das minhas ideias, era melhor estar na oposição. Mas não foi uma decisão fácil. Nessas horas, o importante é obter o máximo de informações sobre uma situação antes de fazer a escolha. Nem sempre só isso é o suficiente. Complemento com minha intuição para avaliar melhor. Não acho que razão e intuição sejam mecanismos separados. Porque ninguém toma decisão contra a própria vontade. Muitas decisões são árduas como uma passagem pelo deserto. Mas, como descendente de árabe, com um copo d’água atravesso um deserto bem."

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Porção intuitiva

Cristiana Arcangeli, empresária do ramo dos cosméticos

"Sou pisciana com ascendente em câncer, não posso negar minha porção intuitiva! Dou atenção e valorizo essa minha faceta. Mas reconheço a importância do meu lado racional e o utilizo na gestão dos negócios. Peso prós e contras, avalio as opções e decido. Quando se trabalha na indústria, toda decisão envolve centenas de funcionários, fornecedores, etc. Mas, quando vou desenvolver um produto para uma linha de cosméticos, criar uma nova embalagem ou escolher um aroma, sou absolutamente intuitiva. Tenho que ser, pois muito dos cosméticos são escolhidos dessa maneira. Me arrependo da decisão mais difícil que fiz na vida, a venda da Phytoervas, minha primeira grande empresa. A promessa era de que, com a venda, a marca ganharia o mercado internacional, mas a empresa que adquiriu o grupo cancelou os planos."

 

Uma das novidades mais recentes sobre a tomada de decisão vem de um estudo da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos. Os pesquisadores descobriram que, durante o sono, os neurônios fazem novas conexões cerebrais, estimulando a solução de problemas. A expressão "I will sleep on it" (algo como "vou dormir pensando nisso, deixar para amanhã") dá uma ideia do que os cientistas querem comprovar.

A decisão solitária do líder

Fernando Henrique Cardoso, 78 anos, ex-presidente da República (1994 a 2002). Está à frente do Instituto Fernando Henrique Cardoso
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"Ao contrário do que muita gente pensa, minha decisão mais difícil no governo não foi a de deixar flutuar o real. Até porque aquilo não foi propriamente uma decisão, mas uma imposição do mercado. Minha decisão mais difícil ocorreu em 1994, quando eu ainda era ministro da Fazenda do presidente Itamar Franco. E foi justamente a de fazer o Plano Real. Havia muita dúvida sobre o sucesso do plano, muitos interesses contrariados e eu poderia ter agido como meus antecessores, que foram acomodando a situação. Houve momentos difíceis, de quase desistência. Mas, nessa hora, por mais que você consulte seus assessores, a decisão do líder é sempre solitária. É ele quem será julgado pela história. Depois disso, os momentos mais complicados foram as demissões de ministros e auxiliares – alguns amigos de várias décadas. Mas, nessas horas, é preciso saber separar a ética pessoal da ética pública."

 

A pessoa encontra uma saída melhor para a dúvida se parar de pensar nela exaustivamente. Dormir é o descanso ideal para o cérebro ativar a criatividade na fase REM (sigla em inglês para o movimento rápido dos olhos). Ela acontece depois dos sonhos. Nesse período, a questão permanece na mente, mas livre de preconceitos que acabam influenciando as decisões quando estamos acordados. "Esse estudo reforça outros trabalhos", disse à ISTOÉ o psicólogo americano John M. Grohol, um dos entusiastas da tese. "Já existiam evidências de que, quanto mais pensamos sobre um assunto, pior a decisão tomada. No sono, o inconsciente trabalha sem teorias preconcebidas."


Treino para internalizar reações

Rogério Ceni, 35 anos, goleiro do São Paulo

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"Meu pai sempre disse: ‘Só erra quem decide.’ E quem quer liderar precisa saber decidir. Em campo as decisões acontecem com base em probabilidades. Na chance que o jogador X tem de chutar no canto esquerdo ou do jogador Y abrir a barreira. Estudo meu adversário para jogar em sua margem de erro. E acho que as decisões intuitivas são consequência da experiência. A intuição que acerta surge em quem já viveu situações parecidas. Por isso treino tanto com repetição. A ideia é internalizar reações. Curiosamente, a decisão mais difícil da minha vida não foi tomada em campo. Dois dias antes da final do Mundial de Clubes de 2005, que disputaríamos com o Liverpool (Inglaterra), percebi que estava com uma lesão no joelho. Decidi não treinar para render mais no jogo. Valeu a pena – tive de operar o joelho quando voltei ao Brasil, mas joguei os 90 minutos e pude dar tudo no jogo mais importante da minha vida."

 

Mas uma boa noite de sono sozinha não faz milagres. Há obstáculos a serem vencidos para que as escolhas sejam equilibradas. Entre eles, está o medo de perder vantagens. "Os pensamentos confusos que limitam as decisões têm origem no temor de ficar sem alguma coisa", afirma a psicóloga Adriana de Araújo, especialista em hipnose e programação neurolinguística (PNL). Mas isso vai acontecer, independentemente da decisão. É o peso dos prós e contras que tornam as escolhas complicadas. O temor pelas responsabilidades que serão assumidas também é um problema. É preciso dar conta de tudo o que acompanha a nova conquista. Portanto, é essencial ter certeza absoluta de que o desejo não é fogo de palha.

No limite emocional

Ana Paula Padrão, 44 anos, apresenta o "Jornal da Record"

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"Deixar a Rede Globo foi uma decisão muito difícil para mim, porque estava saindo de uma emissora de porte, num momento em que meu coração pesava ao pensar na minha vida familiar. Queria encontrar meu marido à noite, jantar com ele, curtir minha casa e não dormir mais às 3 horas da madrugada. Não via perspectiva de futuro onde eu estava. Não me sentia dona da minha carreira. Já aceitar o convite da Rede Record para deixar o SBT foi fácil. Dessa vez, não mudaria muito a minha vida. Não era algo radical, os horários eram os mesmos. Geralmente, preciso estar num limite emocional para decidir. Dizem que isso não é bom, mas para mim funciona.

Sou racional, mas minha emoção também me orienta. Isso não quer dizer que eu não pondere: penso 30 mil vezes em um assunto. Mas percebi que dou uma volta enorme para chegar à minha emoção de origem, aquela que gerou a dúvida."

 


Nada, no entanto, é tão inimigo da tomada de decisão quanto a impulsividade. "A emoção é uma catástrofe nessas horas", diz o coach Sulivan França, presidente da Sociedade LatinoAmericana de Coaching. "Quanta gente não chuta o balde no trabalho em um momento emocionalmente tenso, vai para outra empresa e o lugar é pior?" Ele garante que 90% das vezes em que a escolha é impulsiva o resultado é o arrependimento.

O inesperado na sala de cirurgia

Miguel Srougi, 63 anos, cirurgião e urologista

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"Faço 60 cirurgias por mês há três décadas. Já passei por todos os imprevistos que podem surgir em uma mesa de operação. Então, não posso dizer que é no ato cirúrgico que tomo as decisões mais difíceis. A meu ver, reconhecer que não faz mais sentido dar continuidade a um tratamento é a decisão mais difícil a tomar. Quando era novo, decidia com mais facilidade. Usava modelos estatísticos para resolver que caminho seguir e o objetivo era sempre dar sobrevida ao paciente. Hoje já peso o tipo de vida que o paciente terá depois das intervenções. Com a maturidade, você passa a entender o valor do sofrimento e questões menos objetivas integram o processo decisório."

 

Por outro lado, a indecisão pode gerar problemas tão graves quanto a impulsividade ou uma escolha equivocada. Porque quem empurra as decisões com a barriga verá a vida ou alguém decidindo por ele. Parece cômodo, mas não é. O impacto é negativo. "A pessoa pode ver o tempo passar e se sentir frustrada por não realizar nada", diz Fernando Montero da Costa, diretor de operações da Human Brasil, empresa de orientação profissional. "Ou culpar os outros por algo que tenha dado errado para ela, um considerável prejuízo para suas relações." Para não delegar a terceiros as próprias decisões, um caminho é se informar ao máximo sobre um assunto para se sentir seguro. Um estudo da Universidade de Sydney, na Austrália, indicou que pacientes menos instruídos e conhecedores de seus problemas de saúde deixam nas mãos dos médicos a decisão pelo tratamento com mais frequência, aceitando sem questionar ou pedir outras alternativas.

A impulsividade é positiva em um cenário muito específico: o de risco.

No livro "Fontes do Poder – O Modo como as Pessoas Tomam Decisões" (Ed. Instituto Piaget), o psicólogo americano Gary Klein mostra que os profissionais próximos do perigo, como bombeiros e policiais, acabam por desconsiderar tudo o que estudaram anos a fio e seguem a intuição em momentos de pressão. Vem à tona o instinto de sobrevivência e a internalização do dever a que o indivíduo se comprometeu ao escolher o ofício. Não importa como salvar. O que importa é salvar. As outras pessoas também estão sujeitas a esse impulso, mas os profissionais treinados podem acessar instintivamente o que aprenderam, sem parar para pensar racionalmente, elevando a chance de essa decisão perigosa dar mais certo.

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Impulso na situação-limite

Thiago Mendes Joazeiro, 23 anos, de São José do Rio Preto (SP), que se jogou em uma enchente para salvar uma desconhecida

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"Em retrospecto, posso dizer que me jogar na enchente para salvar uma desconhecida foi a decisão mais difícil que tomei na vida. Sou casado e tenho um filho de três meses. Mas na hora você não pensa em nada. Estava voltando a pé do almoço e começou a chover. Vi uma moça em cima de uma moto sendo puxada pela correnteza. Umas 20 pessoas viram a cena comigo e todas diziam ‘alguém tem que ir lá ajudar’, mas ninguém ia. Aí fui. Um sujeito arrumou uma corda que amarrei na cintura para não ser levado pela correnteza. Foram quase dez minutos de luta para tirá-la da água. Não costumo ser impulsivo, mas acho que em situações limite a gente faz coisas que não entende. Não lembro de ter pensado nos riscos."

 A intuição faz parte da razão

Marcio Fortes, 68 anos, ministro das Cidades
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"Uma decisão difícil foi trocar uma carreira militar segura pela carreira diplomática. Mas acredito que não existe decisão isolada. A regra é estar em algum contexto. O importante é estar bem informado e avaliar possíveis desdobramentos. A emoção, o coração sempre influenciam. Mas ceder pode levar a arrependimentos. Prefiro a razão. E a intuição faz parte da razão. A intuição, mesmo que não se queira admitir, também resulta do amadurecimento."

 

 

30 segundos para decidir o futuro

Washington Olivetto, 57 anos, publicitário e presidente da W/

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"No final de um episódio desagradável que vivi em 2001 (Olivetto passou 53 dias sequestrado – ele não usa a palavra sequestro desde que foi libertado), me dei 30 segundos para decidir se continuaria no Brasil ou venderia tudo para morar no Exterior, longe da violência da qual fui vítima. Esse tipo de coisa, se você não decide de forma definitiva e rápida, o atormenta o resto da vida. Então, nesses 30 segundos repensei os 53 dias e a carreira que construí como publicitário. Vi que o que me alimenta é o meu trabalho e é no Brasil que eu o faço melhor. Continuo na W/, fui pai de novo e vivo uma vida plena. Sou muito intuitivo. Costumo brincar que, em termos de intuitividade, sou uma comitiva de mulheres. Na hora de decidir levo em conta tanto interpretações racionais quanto percepções intuitivas. Se empatar, opto pelo que diz a minha intuição."

Sensação da opção certa

David Neeleman, 50 anos, presidente da Azul Linhas Aéreas

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"Tenho uma família muito grande, com nove filhos, então mudanças sempre foram complicadas. A primeira, quando saí de Utah para ir para Nova York, foi sem dúvida a mais difícil. Meus filhos estavam todos na escola, tinham amigos, uma vida montada. Foi trabalhoso, mas valeu a pena. Hoje, só quatro vivem comigo e minha mulher. Estamos pensando em nos mudar para o Brasil, onde temos a Azul. Ser mórmon ajuda nessas escolhas. Temos uma comunidade bastante unida em praticamente todas as cidades do mundo.Valorizo muito a razão, mas sem intuição não faço as coisas. É o que eu chamo de "gut feeling", algo como sentir, sem saber muito bem por que a decisão escolhida é a correta."

 

A tomada de decisão acontece no córtex pré-frontal, área do cérebro responsável, entre outras coisas, por gerar crenças e testar opiniões. É a parte da razão. A lucidez que nos indica o que é coerente e quais são as consequências das nossas ações. E quem consegue decidir sem nem um pouquinho de sentimento? Ninguém, graças à amígdala, região cerebral onde ficam guardadas as memórias ligadas à emoção.

A briga entre o córtex e a amígdala na hora da decisão pode ser compreendida pelos relacionamentos amorosos instáveis. Enquanto um diz "termine, você sabe que será magoado de novo", o outro insiste: "Ah, lembra daquela viagem romântica, dos momentos tão especiais?" A motivação dirá quem vence a batalha. E ela depende muito de como o indivíduo desenvolveu a necessidade de decisão da infância à vida adulta. Isso inclui aprender a empreender, ter responsabilidades, pesar vantagens e desvantagens e saber perder.

O modelo de escolha saudável é reforçado pelas figuras que cercam cada um de nós. Na última semana, foi divulgada uma pesquisa da Universidade de Nova Gales, na Austrália, indicando que pessoas mal-humoradas e tristes têm melhor capacidade de julgamento. Mas não quer dizer que o sofrimento seja a chave da decisão coerente. O mesmo estudo mostrou ainda que um estado de ânimo positivo facilita a criatividade, outro fator do processo decisório.

Segurança no pouso forçado

Tenente Carlos Veiga, 32 anos, piloto da FAB que salvou nove vidas na Amazônia

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"Tive segundos para tomar a decisão mais difícil da minha vida: faríamos um pouso forçado no rio Ituí. Como não havia estrada ou clareira na mata, essa era a melhor opção. A gente treina exaustivamente para esse tipo de situação, mas é sempre no simulador. Quando acontece de verdade, temos que equacionar o nervosismo, mas já estamos tão escolados que as reações parecem ser automáticas. Do momento da perda de potência até o impacto no rio passaram cinco minutos. Entre os procedimentos de emergência, tive tempo de pensar nos meus quatro filhos e na minha mulher. Mas não me deixei levar pelas emoções. Consegui me manter concentrado."

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Competência para escolher

David Uip, 56 anos, infectologista e diretor-geral do Instituto Emílio Ribas

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"Fiz parte da equipe que cuidou do ex-governador Mario Covas durante sua luta contra o câncer. Dias antes de morrer, ele me disse que eu saberia até onde ir com o tratamento. Quando esse momento chegou, foi muito difícil. Primeiro porque, além de meu paciente, éramos muito amigos. Mas a ciência tem limites. Foi uma decisão baseada na minha experiência e na vontade dele e da família. Ele morreu no quarto, junto com familiares, como queria.

Sou treinado para tomar decisões. Na vida de médico, elas são uma rotina. Seja qual for a circunstância, não posso errar nas minhas decisões. Mas é preciso ter competência individual para decidir. Não ajo por impulso ou movido pela emoção. Algumas vezes uso a intuição, mas sempre pautada na minha experiência. Já tomei decisões erradas. E isso me ajudou a refinar os meus critérios."

Movido pela razão e a paixão

Eduardo Braga, 49 anos, governador do Amazonas

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"A decisão mais difícil da minha vida foi deixar a iniciativa privada, meio no qual fui criado, para me dedicar à vida pública. Neste quesito decidi baseado na intuição e na razão. Intuitivamente acreditei que teria muito a fazer e a contribuir para o desenvolvimento do Amazonas. Também intuí que teria muito a aprender com as pessoas que habitam meu Estado, teria muito a aprender com a vivência que a vida pública possibilita. Racionalmente, entendi que não seria um empresário completo, que não teria a excelência necessária para ter sucesso absoluto nos negócios, porque havia em mim a paixão pela vida pública. Então, usei a razão para decidir o que minha intuição me mostrava. E deu certo."

 

Ser indeciso pode ir além de um comportamento inconveniente. Há casos em que a incapacidade de escolha vem da intolerância à incerteza, característica do Transtorno de Ansiedade Generalizado. O futuro é incerto para todos. Mas as pessoas se programam para fazer escolhas e levar projetos adiante da mesma maneira. Para o portador do distúrbio, a falta de certeza causa uma preocupação tão intensa que ele simplesmente paralisa ou sofre por antecipação. "Esse indivíduo pensa que é melhor ficar arrasado antes até de tentar, já que pode não dar certo", diz o psiquiatra e psicoterapeuta Geraldo Possendoro, professor de atualização profissional em medicina comportamental da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Casos assim pedem tratamento com remédio e psicoterapia. Não significa que todo ansioso tem o transtorno. Mas quem depende de se sentir no controle e sofre demais para tomar decisões também pode se beneficiar da psicoterapia. Outro distúrbio caracterizado pela dificuldade de escolha é a personalidade obsessiva compulsiva. Nesse quadro, porém, a indecisão surge devido ao perfeccionismo. Tudo tem que ser feito como a pessoa preestabeleceu. E isso pode demorar. E a decisão nunca chegar. Também aqui remédios e terapia são recomendados.

O uso da razão com a intuição é o melhor método de escolha, dizem os especialistas. Ponderar é fundamental. Assim como considerar sensações baseadas na experiência. A intuição, ao contrário do que muitos imaginam, não tem nenhuma relação com crenças ou poderes paranormais. Ela é reflexo das recordações de situações vividas anteriormente. Também a observação é importante, já que algumas lembranças parecidas são negativas – e isso pode ser traiçoeiro para uma boa decisão. Em geral, todo mundo tem a chance de fazer boas escolhas. É possível, inclusive, aprender a desenvolver esse talento com cursos específicos e terapias. Mas, para chegar lá, é preciso ser honesto consigo mesmo nas avaliações mais íntimas, pesando as emoções que cada possibilidade causa. Como provam os entrevistados, uma decisão acertada se torna uma grande conquista.

Colaboraram: Greice Rodrigues, Hugo Marques, Leonardo Attuch e Sérgio Pardellas

Estar aberta para ouvir o outro

Ana Botafogo, primeirabailarina do Teatro Municipal do Rio de Janeiro

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"Aos 19 anos, tive que decidir se iria ou não morar sozinha no sul da França, numa época em que não existia internet. Era meu primeiro contrato internacional no balé. Talvez eu não conseguisse construir minha carreira como construí se não aceitasse. Já em 1989, quando acabara de ficar viúva, ganhei uma bolsa para me aperfeiçoar em Nova York. Não queria ficar sozinha naquela hora, pois vivia um turbilhão de emoções. Mas minha família me incentivou. Resolvi aceitar, e foi uma decisão sábia. Me deu forças para retomar minha vida e meu trabalho. Às vezes, não temos uma visão geral porque estamos muito envolvidos. Prefiro conversar com pessoas próximas, que estão do meu lado em momentos bons e ruins. É importante estar aberta para ouvir o outro. Minha vontade conta, mas acho bom saber que tenho esse respaldo. Jamais tomo uma decisão no calor da hora. Sou cautelosa. O que é feito sem pensar deixa falhas."

Tempo para decisões justas

Gilson Dipp, 65 anos, juiz-corregedor do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)

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"As decisões difíceis no CNJ são quando tenho que tomar medidas drásticas contra colegas de profissão, como afastamento de juízes. É pesado, porque sei das consequências. São doloridas, mas não me sinto constrangido. Tomo-as sem remorso. As decisões têm de ser amadurecidas, mas num prazo razoável de eficiência e duração. A decisão profissional é sempre mais complexa, atinge um número muito grande de pessoas. A pessoal está limitada à minha família. É mais fácil, mesmo que seja dolorosa. Uso a razão, mas tenho muito de intuição, que costuma fechar com a razão."

Intuição vem com o amadurecimento

José Carlos Grubisich, 52 anos, presidente da ETH Bioenergia e ex-executivo da Braskem

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"Para mim, vida pessoal e profissional são dois lados da mesma moeda. Por isso, minhas decisões mais difíceis sempre envolveram ambas. Quando resolvi me mudar para a França a trabalho, tive que pensar no bem-estar da minha família, que iria comigo. E logo que me estabeleci na Europa recebi proposta para voltar ao Brasil. São situações difíceis em que as variáveis são tantas que temos de misturar profissão com trabalho e razão com intuição para decidir. No início da carreira é natural que boa parte das decisões dependam apenas de uma avaliação racional, pois são de ordem prática, de consequências mais simples. Mas em um cargo mais alto – em que as decisões podem construir ou destruir a cultura de uma empresa e você é responsável pela motivação dos funcionários – deve-se levar a intuição em conta."

Informação é a chave

Lírio Parisotto, 56 anos, presidente do fundo Geração LPar, que tem mais de R$ 2 bilhões em investimentos

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"O segredo para uma boa decisão é simples: informação. Nos meus tempos de industrial lembro que a decisão mais difícil que tive de tomar foi a de transferir a minha fábrica de filmes, a Videolar, do Paraná para o Amazonas. Esperei a semana da eleição do presidente Collor para fazer a mudança. O País desaceleraria nesse período. E essa desaceleração diminuiria a pressão sobre a produção de vídeos da Videolar, abrindo uma janela para a mudança, sem comprometer as entregas. Na indústria, para tomar uma decisão, dependemos muito dos outros. Entrei para o mercado de investimentos porque nele podia decidir quase sozinho. Isso facilita a gestão."

 


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