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A pouco menos de um mês do início da mais importante reunião entre os líderes mundiais para discutir medidas de combate às mudanças climáticas, o governo brasileiro está rachado e não consegue definir quais posições pretende defender em Copenhague, onde acontece o encontro organizado pela ONU no início de dezembro. A indefinição do Planalto se concentra no percentual de redução das emissões de dióxido de carbono (CO2) com o qual o País pretende se comprometer junto ao mundo.

A proposta mais ousada defende uma redução de 40% no volume de emissão de CO2 previsto para 2020. A mais conservadora advoga que o País não deve apresentar números concretos na reunião. Na quinta-feira 5, o secretárioexecutivo da Convenção do Clima das Nações Unidas, Ivo Bôer, cobrou uma posição do País. “É preciso que um número seja quantificado”, disse em entrevista ao jornal “Folha de S. Paulo”.

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O Brasil é um líder histórico nas questões ambientais e a indefinição de agora causa surpresa entre os ambientalistas e expõe as dificuldades de um país em franca expansão em adotar na prática o quase consensual discurso verde. O ponto de discordância entre a equipe ministerial está na questão econômica.

Há três linhas de pensamento que não convergem para um denominador comum, por conta dos temores de parte do governo de que ao assumir um compromisso ousado o País possa estar comprometendo seu potencial de crescimento. As mais antagônicas são a tese ambientalista liderada pelo ministro do Meio Ambiente, Carlos Mince a desenvolvimentista, cuja bandeira é carregada pelo ministro da Agricultura, Ronald Stephanes e pela candidata à sucessão de Lula, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Há ainda uma posição de cunho mais ideológico, que defende que o Brasil não deve assumir um ônus que não lhe cabe por não ser um dos principais responsáveis pelos problemas ambientais que o mundo enfrenta. À frente dessa proposta está o chanceler Celso Amorim. O único consenso diz respeito à proposta do governo de reduzir em 80% o desmatamento da Floresta Amazônica até 2020, o que resultaria, pelas contas do Planalto, em uma diminuição de 20% no volume de emissões de CO2.

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As divergências entre Minc, Stephanes e Dilma se concentram nas projeções de crescimento do Produto Interno Bruto do País pelos próximos dez anos.
A depender da taxa escolhida, varia a previsão do volume de emissões de CO2. O Ministério do Meio Ambiente trabalha com uma taxa média de crescimento do PIB de 4%, o que resultaria em um volume de emissões da ordem de 2,8 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa em 2020. A Casa Civil estima que o País vá crescer em média de 4,5% a 6%, o que altera de forma considerável os esforços necessários para atingir a redução de 40%. O Ministério da Agricultura apoia a Casa Civil porque uma boa parte das emissões brasileiras sai exatamente do campo.

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Os especialistas em meio ambiente no País divergem sobre a indefinição do governo de acordo com suas ligações partidárias. Ex-ministro do governo do presidente Fernando Collor de Mello e ex-secretário do ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin, o professor da Universidade de São Paulo e especialista na questão energética José Goldemberg defende a tese de que o governo não consegue definir uma meta clara porque não quer se contrapor ao lobby da indústria. “O governo tem sido pressionado por empresas que acreditam que estabelecer metas pode influenciar na produção final”, disse. Goldemberg ainda afirma que há incapacidade técnica do governo em compreender as mudanças pelas quais passa o mundo. “Minha opinião é de que o pessoal que está tomando essas decisões em Brasília
não entende que é possível se desenvolver sem aumentar as emissões.

Eles são economistas clássicos e acham que o crescimento só pode ser feito à custa de mais carvão e petróleo.”

Já o diretor da Coppe/UFRJ e secretário executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, Luiz Pinguelli Rosa, afirma que as discussões no governo seguem um curso normal, com discussões naturais e que não há indefinição.

“Não há conflito algum, houve um consenso maior e a ideia de uma redução de 40% se tornou quase consensual”, disse, sem explicar por que, então, o governo não conseguiu ao final do encontro nem ao menos definir uma data de quando decidirá o que apresentar em Copenhague. Pinguelli tem uma relação estreita com o PT, fez parte do governo de transição em 2002 e foi presidente da Eletrobrás até 2004. De acordo com ele, Lula deve ter uma atitude semelhante à que teve em relação à crise de Honduras: “Será uma posição ousada, estou certo.”

De certo mesmo, por enquanto, não há nada. Lula definiu como prazo para o governo tomar uma decisão final sobre o assunto o dia 16 de novembro.

Até lá, as discussões devem continuar acaloradas na Esplanada dos Ministérios.

No final, caberá ao presidente definir quão verde será o Brasil nos próximos anos. Ao contrário de há 20 anos, quando o País estava atolado em uma crise que se estendia por uma década e liderou as discussões ambientais na ECO-92, dessa vez a decisão não parece ser tão simples.


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