Nem sempre a arte reproduz a realidade, mas, no caso do ator Caco Ciocler, o tom sensível do personagem Ed, na novela América, tem tudo a ver com o jeitão do ator. Carlos Alberto Ciocler olha no olho quando fala, há três anos se aprimora em uma terapia e diz que sua única dor é a distância do filho de oito anos, que mora com a mãe em São Paulo. Mas não deixa de passar um fim de semana na capital paulista, onde nasceu há 33 anos, para acompanhar de perto o crescimento do menino e namorar, numa discreta relação com a estudante da mesma Escola de Arte Dramática (EAD-USP), onde se formou. A auto-exigência de Caco é tanta – evita assistir à novela para não esquentar a cabeça – que o ator passou uma noite em claro na semana passada. “A cena era toda feita em cima das pausas, do não saber o que dizer, mas elas foram cortadas e me achei péssimo”, pune-se.

Mas essas nuances parecem passar desapercebidas aos telespectadores. A maioria das mulheres de terceira idade e crianças prefere assistir a Sol (Deborah Secco) nos braços de Ed, por sua sinceridade de propósitos. As adolescentes ainda suspiram mais nas cenas de amor com Tião (Murilo Benício). A anos-luz de qualquer arrogância, o próprio Caco tem uma explicação para o fenômeno. “O que seduz crianças e idosos é a integridade de Ed. Tenho sido procurado por esse público. Mas ele não demonstra libido em relação a Sol. Isso vai começar a mudar e vamos ver se a gente também ganha o público mais jovem”, especula. Aplausos à parte, o ator volta a se apunhalar: “Acho Ed muito paradão. A autora é como um Deus, capaz de induzir a opinião pública. E ela ainda quer a torcida por Tião”, avalia, deixando em aberto qualquer possibilidade futura.

São as pausas que tornam o teatro mais atraente para ele. “Gosto muito do silêncio. Os personagens dizem mais nas pausas que nas falas”, prossegue. Mas isso não significa, necessariamente, uma preferência escancarada pelas luzes da ribalta. “No teatro me sinto fisicamente com mais espaço, mas a televisão me ensinou a resolver rápido um personagem, mesmo sem tempo para ensaiar”, compara. Em agosto, ele estréia no Teatro Leblon (zona sul) Como é cruel viver assim, primeira peça de Fernando Ceylão, um craque que já emprestou seu humor ao texto de Muvuca e Zorra total, entre outros. Caco faz o protagonista Vladimir, que tenta escapar da própria mediocridade ao se envolver com um rocambolesco seqüestro.

Este ano, o ator brilhou no filme Como dois irmãos, de Lúcia Murat, no qual viveu
um guerrilheiro que não perde a ternura. “Só tenho elogios para Caco. Fizemos muitos workshops e ele contribuiu muito para o personagem. É um ator extremamente delicado”, suspira a diretora. “O cinema tem um lado muito técnico que custei a aprender. A ficha só caiu depois de dirigir meu primeiro curta, Carne”, lembra o ator. O filme, no momento, está tendo seu som remasterizado para ser distribuído em festivais. Caco continuou a pular a cerca no teatro, onde atuou no
ano passado na peça O senhor das flores, dirigido por Marco Rica, e dirigiu uma montagem em Lisboa, protagonizada por Jonas Bloch. A peça chega ao Rio de Janeiro neste segundo semestre. Para quem começou a atuar aos dez anos, na Hebraica de São Paulo, a trajetória ajudou a distinguir: “Minha preferência é pelo
bom personagem, independentemente do veículo.” De todos, o mais marcante foi
o monólogo Echos, aos 17 anos, sob a direção de Moisés Miastkwosky, quando ainda fazia teatro amador e estudava engenharia, curso que não chegou a concluir. “Foi um momento mágico, indescritível. Nunca mais senti um domínio completo sobre o personagem como aquele.”

Outra fase importante foi sua estréia na televisão, em 1995, quando interpretou Jeremias em O rei do gado. Em outubro, volta aos palcos com a bem-sucedida
Os sete afluentes do rio Ota, no Sesc Pinheiros. Não importa o que faça, qualquer trabalho do ator é marcado pela seriedade e dedicação. Talvez sua postura
explique o seu maior sonho: “Às vezes me dá vontade de fugir dessas estruturas rígidas e enfiar o pé na jaca.” Traduzindo: Caco gostaria de voltar ao espírito
libertário do teatro amador e correr o risco da experiência. “No dia em que não
me permitir o erro, será um mau sinal”, avisa.

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