Em 14 de janeiro de 1999, um sujeito atrapalhado tomou uma decisão histórica: anunciou a desvalorização do real e libertou o País de um regime cambial que o levaria à bancarrota. Em apenas quatro meses, o Brasil já havia queimado US$ 40 bilhões de suas reservas. Foi então que o economista Francisco Lopes, chefe interino do Banco Central, teve a ousadia de flexibilizar o câmbio, desafiando seu superior – Pedro Malan, ministro da Fazenda, era contra a desvalorização. No auge da tensão surgiu, porém, a informação de que dois bancos que apostavam contra a desvalorização, o Marka e o Fonte- Cindam, não teriam como honrar seus contratos na BM&F. Diante da percepção de que haveria um “risco sistêmico”, os diretores do BC autorizaram uma operação especial e isso deu origem a um rumoroso escândalo que acaba de chegar ao principado de Mônaco, onde Salvatore Cacciola, ex-dono do Marka, foi preso. O que se dizia à época era que Cacciola comprava informações privilegiadas no Banco Central. O que ninguém explica, no entanto, é a mais óbvia das contradições. Se havia esse esquema, por que ele não foi avisado da desvalorização?

Bom, mas essa é uma história para ser esclarecida no processo. Em primeira instância, Cacciola foi condenado a 13 anos de reclusão e deixou o País em 2000. Chico Lopes, por sua vez, pegou dez anos de prisão, em regime fechado, e hoje recorre da decisão. O que cabe discutir aqui é outro ponto. O que aconteceria no Brasil se ele não tivesse desvalorizado o real? Certamente, o Brasil viveria uma história parecida com a da Argentina, que adiou ao máximo a sua desvalorização. O segundo governo FHC, na melhor das hipóteses, teria sido semelhante ao de Fernando de la Rúa, com corralito dos depósitos bancários, caos econômico e moratória da dívida. Foi disso que o Brasil escapou.