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Um abraço fraterno dado no sábado 14 de fevereiro, acredita o deputado Ciro Gomes (PSB-CE), deve colocá-lo de volta à corrida pela sucessão do presidente Lula em 2010. Em seu apartamento, em Fortaleza, ele fez as pazes com seu irmão do meio, o governador do Ceará, Cid Gomes. Desde as eleições municipais, em outubro, os dois só se falavam para trocar insultos e acusações. Naquele dia, aniversário de 50 anos do irmão mais velho, Lúcio, Ciro conseguiu reunir outra vez uma família que a disputa eleitoral do ano passado havia fragmentado. Para ele, resolvia-se o problema que vinha lhe tirando a tranquilidade e o ânimo para a disputa política. A briga entre os irmãos o levou a ter problemas de saúde, a desinteressar-se pela rotina do Legislativo e a praticamente desaparecer do cenário nacional. Ciro preferiu deixar a política de lado para cuidar de questões pessoais, familiares ou paroquiais. Durante seu desaparecimento, foi atropelado pelos adversários. Ele promete voltar à cena nesta semana. Mas talvez seja tarde demais. "Todos os problemas de Ciro são justos e compreensíveis, mas ele precisa voltar para o jogo, ou vai ficar fora", cobra o secretário-geral do PSB, senador Renato Casagrande (ES). Ele não é o único no partido preocupado com o sumiço de Ciro. Na tarde da quarta-feira 21 de janeiro. o presidente do PSB e governador de Pernambuco, Eduardo Campos, ligou para um amigo comum do Ceará. "Você tem alguma ideia de como é que eu posso localizar o Ciro?", perguntou. Campos não conseguia falar com ele.

"Você tem alguma ideia de como eu posso localizar o Ciro?"
Eduardo Campos, presidente do PSB, em telefonema a um amigo

E não era o único no PSB nessa situação. "Não falo com Ciro há um mês", reclamou Casagrande à ISTOÉ. "Ele nos diz que quer ser candidato à Presidência, mas não age como alguém que queira. Nós precisamos que ele queira mesmo. Quem não se desloca não recebe a bola", comparou.

"Se nós continuarmos parados, o máximo que vamos conseguir é o posto de fotógrafo no casamento entre o PT e o PMDB em 2010", emenda o deputado Beto Albuquerque (PSB-RS), vice-líder do governo. "Ele tem de começar a se mexer agora. Não dá para perder mais tempo", completa o líder do PSB na Câmara, Rodrigo Rollemberg (DF). Ciro comprometeu-se com Rollemberg a retomar a sua agenda de candidato depois do Carnaval. Assim, Rollemberg agendou, para quarta-feira 4, um seminário da bancada com Ciro para a discussão da crise econômica mundial. A ideia é que Ciro apresente pela primeira vez seu diagnóstico sobre a crise, apontando propostas e sugestões. A ausência de Ciro nesse debate sobre a economia é algo que vem intrigando até o próprio presidente Lula. Por mais de uma vez nas últimas reuniões do seu conselho político, Lula comentou com os ministros estranhar a mudez de Ciro. A partir do seminário, organiza-se uma agenda que inclui viagens a Porto Alegre e a Vitória.

O problema é que até o PSB começa a desconfiar das possibilidades de reação de Ciro. Para o mesmo encontro em Vitória para o qual convidou Ciro, Casagrande chamou também o governador de Minas Gerais, Aécio Neves. "Se nesse processo das prévias no PSDB, o Aécio ficar sem clima para continuar no partido, o PSB pode ser um bom destino", arrisca Casagrande. No Carnaval, a principal estrela política convidada por Campos para a festa no Recife e em Olinda foi Dilma Rousseff . Ciro preferiu a discrição de um bloco no bairro do Jardim Botânico, no Rio de Janeiro (leia quadro ao lado). Ou seja: diante da falta de movimentação de Ciro, o PSB começa a marcar triplo na loteria da sucessão presidencial.

As razões do sumiço de Ciro remontam a uma série de percalços que o acompanham desde que fez a aposta errada na sua ex-mulher, a senadora Patrícia Saboya, do PDT, como candidata à Prefeitura de Fortaleza, no ano passado. Foi essa escolha que fez com que Ciro rompesse com seu irmão, Cid Gomes, que apoiou a reeleição da prefeita petista Luizianne Lins e venceu a parada. A briga dividiu os demais irmãos. Lúcio, o mais velho, e Lia, a mais nova, ficaram ao lado de Ciro. O deputado estadual Ivo Gomes ficou com Cid. A situação corroía Ciro e a reconciliação no aniversário de Lúcio Gomes aliviou o ambiente. Ele e Cid conseguiram novamente conversar sobre política. Um prometeu não atrapalhar os projetos do outro. A disputa com Cid incomodava Ciro não apenas pela questão familiar, mas pelo que representava para seu futuro político no Ceará, sua base eleitoral. Em 2006, Ciro elegeu-se deputado federal com 620 mil votos. Foi proporcionalmente o mais votado do País. Cid, com o apoio de Ciro, foi eleito governador. Com a derrota no ano passado, Ciro viu-se perdendo espaço para o irmão: ele despontava como uma força independente que, isolada, poderia vir a se tornar um forte entrave para suas pretensões futuras.

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"Ele nos diz que quer ser candidato, mas não age como alguém que queira "
Renato Casagrande, secretário-geral do PSB

Ciro não se conformava com a aposta errada. Com seu temperamento irritadiço, envolveu-se várias vezes em discussões com eleitores que o provocavam no Ceará. Em Mombaça, interior do Ceará, chegou a descer de uma caminhonete para bater boca com militantes do PMDB.

Tenso, estressado ao extremo com a situação, fumando desbragadamente, na manhã de 8 de novembro do ano passado, amanheceu com a boca torta e com dificuldades de fala . Era o dia do casamento de Carla, filha do senador Tasso Jereissati (PSDB), antigo aliado de Ciro. Enquanto Carla se casava, o deputado estava internado no Hospital Monte Klinikum. Segundo amigos, no primeiro momento, Ciro chegou a pensar que tivera um AVC. Mais tarde, após os exames, soube que se tratava de uma paralisia facial, provocada por um vírus, que se manifesta quando a pessoa está com a imunidade baixa, justamente por conta de stress. Naquele estado, Ciro viu-se obrigado a se afastar. Tirou uma licença de 30 dias da Câmara por motivo de saúde e submeteu-se a sessões de exercícios faciais para recuperar a musculatura do rosto.

Somava-se a isso um profundo desgosto com a atividade parlamentar. Mesmo antes dos problemas de saúde, já era um dos deputados mais faltosos da Câmara. Levantamento feito pelo site Congresso em Foco no final do ano passado revela que Ciro faltou a 57,3% das sessões deliberativas em 2008. Até o dia 11 de dezembro do ano passado, ele só tinha comparecido a 41 das 96 sessões. Ciro não justificou 20 dessas faltas. Nas demais, como manda o regimento, teve o seu ponto cortado. A regra da Câmara define que um deputado que falta a mais de um terço das sessões pode ter seu mandato cassado, desde que não justifique as faltas.

Seguidamente, Ciro reclama do ritmo e da falta de objetividade dos trabalhos do Legislativo. Um exemplo disso aconteceu na semana anterior ao Carnaval. Na segunda-feira 16, ele tomou o avião e, no final da tarde, desembarcou em Brasília para uma sessão que estava convocada. A sessão foi cancelada por falta de quorum. "Ainda não sei o que eu vou fazer em 2010. Mas tenho absoluta certeza do que não vou fazer: não serei deputado federal", desabafou, irritado, enquanto seguia de volta ao seu gabinete, no Anexo III da Câmara, onde ficam as salas mais simples, sem banheiro. É o setor menos nobre da Câmara. Ciro o detesta.

"Ele não se ajusta bem à mecânica do Legislativo. Não parece mesmo ter muita vocação para ser deputado", diz Mauro Benevides (PMDB-CE), veterano do Congresso e um dos amigos de Ciro no Legislativo.

Ciro recuperou-se da paralisia facial no final do ano passado. Foi quando o PSB acreditou que poderia novamente contar com ele. Mas o deputado afastou-se de novo, desta vez por causa de Patrícia Pillar. No final do ano, a mãe da atriz começou a ter problemas de saúde. Contraiu uma pneumonia. No dia 1º de fevereiro, Lucy Gadelha morreu, aos 71 anos. Era a véspera da eleição da Câmara. Ciro faltou à votação. "No momento, minha mulher precisa de mim", disse Ciro à ISTOÉ, por meio de sua assessoria de imprensa.

Folião no Carnaval carioca
A aparição de Ciro Gomes e Patrícia Pillar na tarde de terça-feira 24, no bloco Último gole, no Jardim Botânico, bairro carioca onde moram, surpreendeu os vizinhos. Não pela empolgação carnavalesca do deputado, mas porque nos últimos meses os dois raramente foram vistos nos arredores. Durante a folia na bucólica pracinha Pio XI, a atriz tirou fotos com os fãs que a chamavam de Flora, nome de seu personagem na novela A favorita. Ciro serviu de fotógrafo. "Ele tirou pelo menos três fotos e atendeu a todos com muita simpatia", conta a estudante Bruna Ferreira, que os encontrou no bloco. Enquanto Patrícia ria e ensaiava passos de samba, Ciro – de calças jeans no calor carioca – resistiu ao som da bateria. Antes dessa cena carnavalesca, Ciro e Patrícia andavam sumidos do bairro. "Eles vinham aqui com muita frequência", conta Celso Passos, dono da banca de jornal na rua Jardim Botânico. "Há alguns meses não os vejo. Agora, quem compra os jornais é o motorista", completa.