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ENCONTRO
Os 320 participantes debateram
os modelos de gestão pública e privada

O cenário encantador da ilha de Comandatuba, no litoral sul baiano, parecia mais convidativo a conversas amenas e a atividades de lazer. Serviu, no entanto, como palco para discussões fundamentais para o Brasil, principalmente num ano eleitoral: gestão pública e desenvolvimento econômico sustentável. Com a autoridade de quem comanda uma das maiores produções de aço do mundo, Jorge Gerdau Johannpeter, do Grupo Gerdau, inaugurou a demanda por melhor planejamento e gestão dos gastos públicos. Acostumado a estabelecer metas para 20 anos em suas empresas, Gerdau defendeu a ideia de que modelo similar deve ser adotado pelo setor público, em geral atrelado ao período no cargo de cada mandatário. “Não é fácil nem politicamente agradável, mas não é mais viável aumentar a carga tributária para obter mais receitas. É preciso gerir melhor os gastos públicos”, afirmou Gerdau na semana passada, durante o 9o Fórum Empresarial, promovido pelo Grupo de Líderes Empresariais (Lide), cujas 650 empresas associadas representam 44% do PIB privado nacional.

O chamado choque de gestão aplicado pelo ex-governador Aécio Neves logo que assumiu o governo de Minas Gerais, em janeiro de 2003, foi apontado como referência de administração baseada nos métodos da iniciativa privada. “O governo mineiro conseguiu atingir o equilíbrio fiscal em apenas um ano e meio”, lembrou Vicente Falconi, do Instituto de Desenvolvimento Gerencial (INDG), que atuou como consultor naquele processo de saneamento administrativo. “Redução de custos, no caso do setor público, significa redução do desperdício.” Pouco depois de Gerdau apelar por um maior envolvimento dos empresários na vida pública, Falconi revelou que, quando sua empresa foi contratada para assessorar o governo mineiro, Aécio avisou que não tinha recursos em caixa para pagá-lo. O problema foi resolvido, contou Falconi, quando o então governador autorizou “passar o chapéu entre os empresários”. O consultor afirmou também que a implementação de modelos privados em gestões públicas só funciona quando o governante consegue vencer resistências instaladas no
escalão intermediário da máquina pública.

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O senador Romero Jucá 

Coube ao governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), interceder a favor do setor público, ao destacar que “demonizar qualquer setor como culpado por tudo” não é o melhor caminho para o diálogo. “Sabemos que tem santo e diabo tanto no lado público quanto no privado”, afirmou o governador. “O debate é fundamental para que as boas práticas do setor privado sejam aplicadas no setor público.” A dicotomia entre empresários e políticos, que não aparecera no debate anterior, com o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, se  estabeleceu. Em dois momentos seguintes do seminário, a diferença de pontos de vista ficou evidenciada: quando se discutiu a infraestrutura aeroportuária do País e as leis de incentivo ao esporte e à cultura.

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PARCERIA
O governador da Bahia, Jaques Wagner
com João Doria Jr., presidente do Lide

Classificado como sensível, o tema aeroportos foi levado a Comandatuba pelo ministro do Esporte, Orlando Silva, que apresentou os planos previstos para a Copa do Mundo de 2014. O maior desafio, ressaltou o ministro, serão os aeroportos, que receberão investimentos de R$ 6 bilhões para superar suas deficiências. “Será preciso cumprir rigorosamente os planos da Infraero para reformar os aeroportos das 12 cidades que farão parte do roteiro da Copa”, disse Orlando Silva. Questionado por João Doria Jr., presidente do Lide, se a privatização não seria a melhor solução para resolver os gargalos do País em infraestrutura aeroportuária, o ministro garantiu que não há nenhuma conclusão nesse sentido. Sua posição foi reforçada pelo deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), líder do governo na Câmara. “No Brasil, qualquer pessoa pode fazer um aeroporto”, disse Vaccarezza. “E não há grande diferença entre os serviços aeroportuários do Brasil e do Exterior”, completou o parlamentar, provocando indignação na plateia, que teve até um começo de vaia puxado pelo executivo de uma multinacional. Convidada para o encontro, a atriz Regina Duarte forneceu munição para a segunda polêmica do seminário, ao perguntar a Orlando Silva se as mudanças previstas para a lei de incentivo à cultura não afetariam a legislação similar no esporte. “O que está preocupando o campo das artes, da cultura, é a centralização”, reforçou Gerdau. “Nós, empresários, gostamos de descentralizar”, completou o presidente do conselho de administração da Gerdau, sob aplausos da plateia. Em tom amistoso, mas firme, o ministro lembrou que “o governo atende ao programa para o qual foi eleito” e que a valorização de algumas tradições culturais são exemplo de atividades não absorvidas pelo mercado. Da plateia não se ouviu nenhuma vaia, mas também não chegaram sinais de aprovação, o que não intimidou o ministro: “Não vejo o espectro do Estado circundando a cultura, não vejo o espectro do Estado circundando o esporte.”

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DEBATE
O ministro do Esporte, Orlando Silva

Entre os pontos de convergência dos dois grupos estava a necessidade de planejar um futuro sustentável para o País. Luiz Fernando Furlan, ex-ministro do Desenvolvimento do governo Lula, chegou a propor que o Brasil usasse a economia verde para reposicionar sua imagem no mundo. “Sustentabilidade é diferencial”, afirmou Furlan. Na sequência da exposição de Furlan, o presidente da Tetra Pak, Paulo Nigro, aproveitou a presença de cinco senadores no seminário para pedir atenção especial à Lei de Resíduos Sólidos, que regulamenta a destinação do lixo no País e acaba de ser encaminhada para o Senado, depois de 19 anos de tramitação na Câmara. Um dos senadores presentes, Romero Jucá (PMDB-RR), prometeu que a Casa resolveria a questão em três meses, mesmo que fosse necessário fazer um posterior ajuste, por meio de medida provisória. “Melhor do que uma lei perfeita é uma que avance”, defendeu Jucá. No que diz respeito ao meio ambiente, o próprio fórum já fez a sua parte: as 700 toneladas de gás carbônico emitidas por causa do encontro estão sendo neutralizadas por meio de subsídios a projetos sustentáveis brasileiros certificados pela Bolsa do Clima de Chicago, nos Estados Unidos.