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PATRULHA
Mais de mil soldados paraguaios foram enviados
à fronteira para combater a guerrilha

Uma espécie de entreposto do tráfico de drogas e armas e da pirataria, o Paraguai está firmando fama de “terra sem lei”. Para agravar a situação, surgiu agora no país vizinho uma guerrilha de tendência marxista, batizada de Exército do Povo Paraguaio (EPP). O grupo, que defende a luta armada para chegar ao poder, é pequeno no tamanho, com no máximo 50 membros efetivos. Mas realiza ações ousadas e de grande impacto midiático, como sequestros e ataques à polícia. Segundo informes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), os guerrilheiros têm como alvo preferencial os brasiguaios, como são conhecidos os brasileiros proprietários de terras no Paraguai. “Desde o início de fevereiro, a Abin fortaleceu o acompanhamento do cenário envolvendo o EPP, tendo repassado informações ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência”, disse à ISTOÉ o diretor-geral do órgão, Wilson Trezza.

A Abin também está investigando as supostas ligações do EPP com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Por conta dessa avaliação, o tema entrou na agenda do encontro que Lula terá com o presidente do Paraguai, Fernando Lugo, nesta segunda-feira 3, em Ponta Porã. “Vou conversar seriamente com Lugo sobre o que está ocorrendo na fronteira. Tenho informações primárias da inteligência”, afirmou Lula na quarta-feira 28. Ponta Porã está a apenas 170 quilômetros da cidade paraguaia de Horqueta, onde há duas semanas membros do EPP, armados com fuzis M-16 e AK-47, invadiram a fazenda do brasileiro Jorge Luiz Zenatti. Na ação, morreram três funcionários – dois deles brasileiros – e um policial paraguaio. “Certamente o EPP se preparava para me sequestrar”, disse Zenatti à ISTOÉ. Dono da petroleira Taurus, ele conta que os funcionários perceberam uma movimentação suspeita na reserva florestal contígua à fazenda. “Quando estavam chegando ao local, foram recebidos à bala.”

Em reação, o presidente do Paraguai declarou estado de exceção em cinco departamentos na fronteira com o Brasil. Mil soldados foram deslocados para a região, um batalhão ocupou a fazenda do brasileiro. Na comunidade de cerca de 350 mil brasiguaios, o clima é de insegurança. “Como a bandeira do EPP é a reforma agrária, os brasiguaios latifundiários são vistos como barreiras que precisam ser removidas”, explica Hernán Burguez, editor do diário paraguaio “La Nación”. Em agosto do ano passado, o EPP invadiu a fazenda do brasileiro Ronaldo Rodrigues de Assunção, em Capiibary, no departamento de San Pedro. Presos pela polícia, os atacantes se disseram membros da Mesa Coordenadora Nacional de Organizações Camponesas (MCNOC), que tem ligações com o governo de Fernando Lugo. No decorrer dos interrogatórios, entretanto, admitiram fazer parte do EPP. O nome EPP surgiu pela primeira vez na imprensa paraguaia em 13 de março de 2008, justamente num ataque à fazenda de outro brasileiro.

Por enquanto, a PF e o Itamaraty enxergam o EPP como um fenômeno restrito ao Paraguai e não como uma ameaça transnacional. “Pelas informações de que dispomos, o grupo tem causado problemas sérios lá. Mas, numa escala mundial, estão mais para um bando rural violento”, avalia o diretor de combate ao crime organizado da Polícia Federal, delegado Roberto Troncon Filho. Mesmo assim, a PF tem se disposto a auxiliar as autoridades paraguaias no combate à guerrilha.

Troncon conta que, entre dezembro e janeiro, cinco agentes da PF e três técnicos da Anatel foram enviados ao Paraguai para auxiliar nas investigações do sequestro do líder ruralista Fidel Zavala. O fazendeiro foi libertado após pagar o resgate, mas a PF entregou um relatório ao Ministério do Interior.

O EPP teve origem no extinto Partido Patria Libre (PPL), grupo inspirado na Teologia da Libertação. Seus dirigentes são acusados pela Procuradoria paraguaia de envolvimento em vários sequestros desde 2001. Uma das ações mais ousadas atribuídas ao Patria Libre foi o rapto de Cecília Cubas, filha do ex-presidente Raúl Cubas Grau, em 2004. Após quatro meses de cativeiro, ela foi assassinada. Os crimes comoveram a opinião pública paraguaia e levaram a Polícia Nacional a empreender uma caça aos membros do PPL. Desde 2003, três líderes do Patria Libre – Juan Arron, Anuncio Martí e Victor Colmán – estão refugiados no Brasil. Recentemente, Lugo pediu a revisão do refúgio e a extradição dos paraguaios. Mas a chance de o pedido ser aprovado pelo Comitê Nacional de Refugiados (Conare) é remota. “Eles são perseguidos políticos. Há vídeos comprovando que foram forçados a confessar um crime que não cometeram”, pondera um membro do Conare. Na corrida eleitoral de 2008, o então presidente, Nicanor Duarte Frutos, chegou a afirmar que o EPP era uma “invenção” do candidato Fernando Lugo. Só o tempo dirá se o risco da guerrilha é real.

PCC no Paraguai

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Num episódio sem relação com o EPP, mas que retrata bem a crise de segurança pública no Paraguai, homens armados tentaram assassinar o senador paraguaio Robert Acevedo em plena tarde da segunda-feira 26. O parlamentar voltava para casa quando foi fechado no trânsito por um grupo armado, que disparou mais de 30 vezes contra seu carro. No ataque, o motorista e um guarda-costas foram mortos. Acevedo conseguiu sair do carro, mas foi atingido em um braço e, de raspão, na cabeça. O senador acredita que o atentado foi planejado pelo Primeiro Comando da Capital, de São Paulo. “O PCC é muito forte aqui. Temos informações de que cometeram esse atentado agora porque denunciei muitos narcotraficantes da fronteira do Brasil com o Paraguai”, disse.