Max Ernst – Uma semana de bondade/ Museu de Arte de São Paulo (MASP)/ de 23/4 a 18/7

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SETE DIAS
Ambientadas nos dias da semana, colagens de Ernst ilustram tragédias naturais,
violência física e desordem mental

No domingo, um homem condecorado e com cabeça de leão envolve-se em perseguições, assaltos, torturas, sequestros, culminando em um assassinato. Na segunda-feira, enxurradas inundam a cidade de Paris, derrubando pontes e afogando gente. Na terça-feira, asas de morcego e caudas de serpente irrompem como próteses de corpos humanos. Na quarta-feira, a moral é confrontada por relações incestuosas. Na quinta-feira, as atitudes obscenas de homens com cabeça de galo ameaçam o símbolo nacional da França, acionando uma campanha antinacionalista. Na sexta-feira, tudo o que é visível torna-se estranho. No sábado, mulheres começam a flutuar e entramos em território desconhecido. Mesmo que essa sequência narrativa percorra os sete dias da semana, não há linearidade nem lógica que conduzam o leitor no romance-colagem “Uma Semana de Bondade”, de Max Ernst. Afinal, o intuito desse romance visual, no momento de sua publicação em fascículos, em 1934, era confundir os sentidos e desafiar as certezas da sociedade europeia.

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A atualidade e a universalidade da narrativa apocalíptica do surrealista Ernst poderão ser conferidas em exposição no Masp, a partir de 23 de abril. A ironia e a acidez crítica da obra começam logo no título, apropriado do nome de uma campanha assistencialista que ocorreu em Paris, em 1927. A mesma burguesia parisiense, convocada a apresentar seus bons sentimentos cristãos, é o alvo da campanha surrealista que, em 184 colagens – a partir de recortes de jornais e revistas –, ironiza o comportamento psicologicamente correto e reprimido da época. Num processo de inversão da bondade e dos bons costumes, Ernst produz uma narrativa visual de conteúdo altamente perigoso, comparável ao poder sinistro dos “Caprichos” de Goya. O dedo que Goya colocou na ferida da aristocracia e do clero da Espanha do século XVI, com suas imagens de extravagâncias, erros e vícios, é o dedo que Ernst coloca sobre os traumas da Primeira Grande Guerra. Não é à toa que considera- se a célebre frase “O sono da razão produz monstros”, da gravura nº 43 dos “Caprichos” de Goya, uma antecipação da mecânica do surrealismo. A crença no “sono da razão” e a feroz crítica anticlerical, presentes em Goya, são compartilhadas por Ernst, Buñuel, Breton.

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Integrante do grupo surrealista que se formou ao redor de André Breton, o alemão Max Ernst tem na colagem sua principal linguagem expressiva. Segundo o crítico Werner Spies, no catálogo da exposição na Fundación Mapfre, em Madri, toda a sua obra em pintura, desenho, escultura e texto pode ser considerada como desdobramento da colagem. Em “Uma Semana de Bondade”, a banalidade de uma semana francesa é abalada pela intervenção crítica das tesouras de Ernst.

Max Ernst - Uma semana de bondade


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