Para compreender o arco de ascensão e queda do capitalismo americano vale recordar a cena do expresidente Bill Clinton, triunfal, escrevendo um zero na cartolina ao mostrar o tamanho do défi cit dos EUA naquele momento. Apenas oito anos depois, às vésperas de deixar o governo, seu sucessor, o presidente George Walker Bush, entrega um caixa quebrado, com US$ 500 bilhões de rombo, um mercado de capitais destroçado, bancos sem lastro até para pagar a luz do prédio, uma indústria imobiliária refém do calote monstro – que ninguém sabe ainda aonde vai dar –, milhares de desempregados protestando pelas ruas, indústrias afogadas em prejuízo e um estado de perplexidade generalizado que abateu a população. Eis a gestão Bush em seu estado puro. Uma gestão que sobreviveu por anos baseada na guerra insana “contra o mal” no Oriente Médio. E foi justamente lá que Bush queimou quase um trilhão de dólares com seus soldados e armas. Mesmo debaixo de críticas, seguiu em frente o mandatário, como um Nero romano. Visto sob a ótica de balanço de governo, é tenebroso o legado que Bush deixa. Wall Street vive como uma Pompéia nos últimos dias. As fi nanças do país estão em frangalhos. Os nervos de seus concidadãos, idem.

A confi ança que o mundo deposita nos EUA e no presidente americano hoje não vale mais nem um dólar furado. A cadeia destrutiva e sistêmica que ali se armou – baseada num esquema inconseqüente de alavancagem de créditos sem fi m – levará anos e mais alguns trilhões de dólares para ser ordenada. No pandemônio, economistas de todas as correntes sugeriram rezar. Na contramão dessa onda, o Brasil – que não deve deitar em berço esplêndido e viver de brisa diante do vendaval – dá sinais de uma robustez de resultados, se não tranqüilizadora, ao menos promissora. Como na fábula da formiga e da cigarra, o País fez sua lição de casa. Seguiu a cartilha da estabilidade e do crescimento sustentável e está razoavelmente pronto para os dias de inverno fi nanceiro. Com mais de US$ 200 bilhões em reservas para defender a moeda, o País ainda conta com empresas exibindo lucro nas nuvens, um setor público com baixo endividamento em dólar, consumidores pouco expostos ao crédito, até pela prática de juros altos, e instituições fi nanceiras tão sólidas que muitos falam até que elas irão comprar a concorrência de fora. A crise, aqui, não será “quase imperceptível”, como pregou o presidente Lula, mas também não será o apocalipse.

 


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