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No mundo da aviação é comum dizer que, quando a situação está muito boa, o “céu é de brigadeiro”. Uma mostra dessa máxima aconteceu na cidade do Rio de Janeiro, na quartafeira 17, no Instituto Cultural da Aeronáutica, onde houve o batismo da primeira aeronave da Azul Linhas Aéreas – empresa criada pelo fundador da JetBlue Airways, David Neeleman, que promete revolucionar o mercado aéreo nacional com passagens a baixo custo. Durante a solenidade, Neeleman era só sorrisos. Havia bons motivos para o entusiasmo desse empresário americanobrasileiro: a Azul, que começa a operar no País em janeiro de 2009, comemorava o aporte de mais US$ 50 milhões em seu cofre, totalizando US$ 200 milhões em caixa para o início das decolagens. Segundo Neeleman, a cifra é o maior montante em investimentos de uma empresa aérea do mundo em início de operação. Mas tamanha alegria também tinha outro motivo: Neeleman está convencido de que poderá ganhar a concessão de alguns aeroportos brasileiros, especialmente o Galeão, no Rio, e Viracopos, em Campinas (SP), no processo de privatização aeroportuário. Mas a ambição de Neelman não será fácil de ser realizada: ele terá de disputar mercado com outras empresas aéreas nacionais, com os fundos de pensão e várias construtoras num negócio cujo montante pode atingir cerca de US$ 250 bilhões, mas a Infraero, a empresa que administra os aeroportos brasileiros, diz que ainda não existe uma estimativa precisa. Na contabilidade da concessão, o País tem 67 aeroportos, dos quais dez valem mais de US$ 100 bilhões, e somente 15 deles – os que dão lucros – serão transferidos à iniciativa privada. Em 2007, a receita líquida do setor aeroportuário atingiu a cifra de R$ 2,1 bilhões. Só o aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, faturou mais de R$ 300 milhões e Congonhas, também de São Paulo, outros R$ 100 milhões.

Mas, se para o empresariado o “céu está para brigadeiro”, dentro do governo as concessões dos aeroportos têm provocado divisões mesmo com a ordem do presidente Lula de “dar velocidade no processo” por causa da Copa de 2014. A presidente da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Solange Vieira, e o presidente da Infraero, Sérgio Gaudenzi, divergem sobre o modelo a ser adotado no processo de concessão dos aeroportos. Solange quer entregá-los à iniciativa privada o mais rápido possível, enquanto Gaudenzi prefere manter o patrimônio da Infraero nas mãos do Estado, abrindo o capital da empresa pública ao mercado.

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Nos bastidores há quem diga que o processo de concessão está tão acelerado que a velocidade que o presidente Lula exigiu poderá atropelar as intenções de Gaudenzi. No início do mês o novo modelo de gestão dos aeroportos foi apresentado aos empresários pela Estruturadora Brasileira de Projetos, formada pelo BNDESPar e por grandes bancos. O governo decidiu aplicar a “concessão onerosa”, um processo no qual a Infraero ficará responsável pelos aeroportos não-lucrativos. “Quero sigilo dessa reunião”, disse Solange. “O assunto é reservado, pois as pessoas podem não entender.” Em conversas também reservadas, Gaudenzi alertou que a concessão dos aeroportos lucrativos pode transformar a aviação em um “caos”, caso não haja a garantia de repasses para a Infraero, pois os aeroportos deficitários serão fechados por falta de dinheiro. O Tesouro Nacional, alertou Gaudenzi, é quem vai pagar a conta dos aeroportos deficitários. O secretário de Aviação Civil do Ministério da Defesa, Jorge Godinho, também demonstrou surpresa: “Já decidiram vender os aeroportos”, comentou com diretores da Infraero. “A essa altura, estamos fazendo papel de besta aqui.” Na impossibilidade de reverter o processo, a Infraero vai sugerir ao presidente Lula um modelo semelhante ao da telefonia: quem pegar um aeroporto de cidade importante, muito lucrativo, leva junto um lote de quatro ou cinco aeroportos não-lucrativos. “Sem isso, não haverá aeroporto em cidade pequena”, comentou Gaudenzi com seus diretores.

Ao mesmo tempo que prepara a concessão dos aeroportos, a Infraero vai retomar o controle dos estacionamentos dos aeroportos, hoje nas mãos de dez empresas privadas. O controle de entrada e saída é falho, a estatal não recebe a totalidade do dinheiro e o índice de corrupção é muito alto. Há casos de aeroportos que concederam até 900 credenciais gratuitas em apenas um dia. Os maiores índices de desvios estão no Aeroporto Santos Dumont, no Rio. Antes de retomar o controle dos estacionamentos, a Infraero está implantando o Gest, um sistema eletrônico de controle de entrada e saída de carros. Hoje, em alguns estacionamentos, é o concessionário que avisa à Infraero sobre o número de carros que entram no estacionamento.