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É difícil resistir a uma boa história, independentemente de quantos anos se tenha. Mas quem a conta precisa dominar a arte de monopolizar as atenções, surpreender, criar suspense e compreender os sentimentos humanos. Levado a outros mundos, o ouvinte aprende a usar a imaginação e melhora sua capacidade de concentração. No caso das crianças, os ganhos são ainda maiores: ouvir histórias é uma troca de afeto. E, claro, garantia de diversão.

Literatura é a história dos sentimentos, diz Gabriel Chalita, ex-secretário de Educação do Estado de São Paulo e autor de 46 livros. Ele está lançando o título infantil O segredo das quatro letras, em que o personagem principal, Bonifácio, é um contador de histórias que desfia seus casos, alguns tristes, outros alegres, mas todos com intenção de sensibilizar. Contar história ajuda na formação de valores. “Com as histórias, você ganha transversalidade no processo educativo, ao explorar as coisas que não vê, mas imagina”, completa o escritor, que é candidato a vereador em São Paulo. Para Chalita, as histórias auxiliam também na dimensão afetiva, ao colocar educandos e educadores num contato muito próximo.

Não à toa, muitas escolas têm incluído as histórias entre as atividades das crianças. No Jardim Escola Mágico de Oz, em São Paulo, elas fazem parte da rotina diária. “Para nós, formar leitores é muito importante e esse recurso nos ajuda”, diz Fanny Schneider, coordenadora pedagógica. A história faz parte do dia-a-dia da criança, por meio de livros, fantoches e ambientações. “É uma atividade que trabalha o imaginário, a criatividade, a curiosidade, a oralidade, as emoções”, completa. Na Mágico de Oz, como em várias outras instituições de ensino, as crianças são habituadas a levar livros para casa e partilhá-los com os pais.

O uso das histórias em cada fai xa etária depende, muitas vezes, apenas da abordagem. Se as crianças são pequenas, a função é formar uma visão de mundo e criar um repertório inicial. Mais tarde, elas ajudam na percepção de elementos complexos, como o suspense e o humor. “Quanto mais variedade for oferecida, melhor para elas”, diz a contadora de histórias Cibele de Lucas Faria. Habilidades como a capacidade de concentração também são favorecidas, porque elementos de linguagem como começo, meio e fim exigem atenção. Também é possível combinar as histórias com outros saberes. Junto com um chef de cozinha, Cibele participa de oficinas no Madame Aubergine Atelier Escola de Cozinha, em São Paulo, em que os pequenos misturam a criatividade nas panelas com a criação de personagens e enredos. “Eles podem não gostar de comer abóbora em casa, mas depois de ouvir histórias com elas e cozinhar com as próprias mãos eles adoram”, conta Cibele.

Mas não é preciso estar na escola para se juntar à roda. A Livraria da Vila, em São Paulo, por exemplo, oferece desde 2003 essa experiência. Recentemente, ela também lançou o Brunch de Histórias, em que é possível degustar um café da manhã ouvindo narrativas. Para os adultos, existe o Degustação de Histórias, que une uma seleção temática do repertório de mais de 600 contos de Ilan Brenner com menu típico elaborado pela chef Carole Crema, inspirado em assuntos como a Índia, chocolate, erotismo ou Grécia, por exemplo.

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“As histórias requerem elementos de arte e por isso exigem um aprofundamento técnico do contador”, diz a professora da Universidade de São Paulo (USP) e contadora Regina Machado. Pioneira dessa arte no Brasil, Ela conta que houve um renascimento da tradição em diversos países, simultaneamente, a partir dos anos 1970, e que a moda explodiu, entre outros fatores, graças ao momento atual de abertura ao multiculturalismo. “A alma do ser humano está seca. É preciso regá-la, e as histórias são fonte de boa qualidade. No mundo de hoje, é preciso escutar algo que faça sentido, buscar uma situação de encontro”, acredita Regina. Sob esse prisma, ouvir histórias pode ser uma experiência transgressora.

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