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MEDO DO DESEMPREGO Sindicalistas fizeram vigília na porta dos prédios do BC e cobram taxas ainda menores

A decisão foi recebida com um misto de alívio e satisfação pelo Palácio do Planalto. Depois de uma longa resistência, o Comitê de Política Monetária do Banco Central finalmente reduziu a taxa básica de juros. Por cinco votos a três, prevaleceu a dose mais forte de um ponto percentual, o que não ocorria desde dezembro de 2003. E a taxa Selic baixou de 13,75% ao ano para 12,75%. Em nota oficial, a diretoria do BC anunciou que, diante dos indícios de que a inflação está sob controle, o Copom "inicia um processo de flexibilização da política monetária". Deu a entender, portanto, que veem por aí mais reduções. Para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a mudança de rumo do BC pôs fim a um pesadelo. Nos últimos tempos, ele não escondia de ninguém a decepção com a excessiva prudência de Henrique Meirelles. E lamentava com os auxiliares que o BC se mantivesse refratário às pressões de empresários e trabalhadores pela redução dos juros. Na manhã da quinta-feira 22, porém, reunido com a equipe econômica e diretores de bancos públicos, Lula mostrou-se bem-humorado e fez questão de saudar a novidade. Após comentar que o Copom, na véspera, baixou a taxa de juros, congratulou-se de público com o presidente do BC: "Parabéns, Meirelles!" Os presentes entenderam o recado e sorriram.

A exemplo do que aconteceu em dezembro, quando o Copom, também por cinco votos a três, resolveu manter o nível das taxas de juros, provocando choro e ranger de dentes, a reunião desta semana foi cercada de grande expectativa e realizou-se sob forte pressão. Mais de mil manifestantes, convocados pelas centrais sindicais, cercaram a frente do prédio do BC na avenida Paulista, coração financeiro de São Paulo. Desta vez, entretanto, a queda da Selic era tida como certa. O que estava em jogo era apenas a dosagem. O mercado aguardava no máximo uma redução de 0,75 ponto percentual, e os trabalhadores sonhavam com dois pontos percentuais. A ala mais conservadora do BC, com o diretor de Política Econômica, Mário Mesquita, à frente, defendeu 0,75 ponto, por temer que a desvalorização do real traga impacto inflacionário no futuro.

Outra corrente, liderada pelo diretor de Normas, Alexandre Tombini, quis passo mais acelerado de um ponto percentual, argumentando que os riscos inflacionários se dissiparam. Quem desfez o nó foi o próprio Meirelles, que preferiu respaldar a corrente menos conservadora de sua diretoria.

Em todo o País, a decisão do BC foi recebida com aplausos. O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro Filho, comemorou: "O Brasil não podia perder mais tempo. A atividade econômica caiu muito, não há pressão inflacionária e muitos países já reduziram seus juros." O presidente da Fiesp, Paulo Skaf, que não tem o hábito de dar trégua ao governo, ressaltou que "ao reduzir a Selic em um ponto, o Copom demonstrou que a política monetária mudou e isso não é ruim." Para Abram Szjaman, da Federação do Comércio de São Paulo, "o Copom finalmente compreendeu a gravidade da crise." Paulinho da Força Sindical pediu mais: "O BC acertou no remédio mas errou na dose." Os economistas não mostraram surpresa.

"Em dezembro, o Copom já havia sinalizado a baixa e o mercado tinha se antecipado. Tudo indica que haverá novas quedas, tanto assim que a taxa de juros de um ano está cotada a 11%", afirmou à ISTOÉ o economista- chefe do Banco Santander, Alexandre Schwartsman. Em sua opinião, como existem estoques de produtos que ainda sofrem o impacto da desvalorização cambial, é natural que o BC não avance o sinal.

Já o Departamento Econômico do Bradesco trabalha com previsão mais ousada. Para o economista- chefe do banco, Octávio de Barros, "há um caminhão de juros para cair no Brasil."

O Bradesco aposta numa taxa Selic de 10,75% até o fim do ano.

Para os consumidores, a baixa da Selic trouxe impacto imediato. Grandes bancos, como Itaú e Bradesco, anunciaram a redução dos juros do cheque especial para pessoa física, do crédito pessoal e também das linhas de capital de giro. No caso do Bradesco, o custo do cheque especial foi de 8,64% para 8,56% ao mês. Mas quem também teve bom motivo para comemorar foi Meirelles. Desde dezembro, corriam rumores de que, devido ao pé firme cado BC, ele estaria desgastado e poderia deixar o cargo. A intriga ganhou corpo e surgiu a informação de que Lula, na segunda-feira 19, teria dado um ultimato ao presidente do BC, exigindo a queda dos juros. Na verdade, faz parte da rotina de Meirelles despachar às segundas-feiras com Lula e nesta semana, segundo informação do Planalto, não foi diferente. "O presidente costuma dizer, com ironia, que jamais pediu esta ou aquela taxa de juros a Meirelles, pois, se o fizesse e Meirelles não seguisse a ordem, teria que demiti- lo", conta um assessor de Lula.

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GARANTIA DE EMPREGO Meirelles recebeu
"parabéns" de Lula e rumores de que
estaria desgastado e poderia deixar
logo o cargo perderam força.

Logo, Meirelles está firme no cargo e só deixará o BC se for candidato ao governo de Goiás em 2010. Opção provável, mas que ainda está no ar.

Quem está com a batata assando no Planalto são os presidentes da Caixa Econômica e do Banco do Brasil. Lula considera inadmissível que bancos públicos operem com spreads superiores aos dos bancos privados, como é o caso das linhas de capital de giro do BB. Na quinta-feira 22, cobrou ação imediata. Segundo o ministro da Fazenda, Guido Mantega, "os bancos oficiais são instrumentos de governo e têm de colaborar com as políticas públicas." Como prova de que está disposto a acionar todo o arsenal ao seu alcance para afugentar os efeitos da crise econômica internacional, o governo decidiu repassar R$ 100 bilhões do Tesouro Nacional para o BNDES, que ampliará seus empréstimos ao setor privado para R$ 166 bilhões neste ano. "É assim que nós enfrentamos a crise econômica mundial. Nossa resposta é manter o nível de investimento elevado", afirma Mantega. Mas ressalta que o esforço vai dar certo desde que o setor privado "abrace a camisa do crescimento". A queda dos juros é um incentivo fundamental nessa direção.