– Clique aqui para ler um trecho do livro “O Mundo Prodigioso que Tenho na Cabeça”, do escritor americano Louis Begley, sobre a vida do colega tcheco Franz Kafka

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O mercado de biografias e autobiografias sempre foi um dos mais promissores mundialmente. Segundo a livraria virtual Amazon, na última década as vendas desse segmento saltaram de 5% para 20%, considerando-se apenas os títulos incluídos na lista anual de best-sellers. Um dos motivos para esse crescimento é a própria renovação do gênero, que assiste ao aparecimento de um formato novo: o de retratos de personalidades consagradas da literatura, das artes plásticas e da história em geral, feitos por nomes também consagrados em suas áreas. No Brasil, a tendência chega com dois bons exemplos: “O Mundo Prodigioso que Tenho na Cabeça”, do escritor americano Louis Begley, que se debruça sobre a vida do colega tcheco Franz Kafka, e “Rimbaud – A Vida Dupla de Um Rebelde”, do também americano Edmund White, enfocando a trajetória do poeta francês (ambos editados pela Companhia das Letras). Os dois livros pertencem à coleção Vidas Ilustres, criada pelas editoras americanas HarperCollinsPublishers e Atlas & Co., que reúne sob a mesma fórmula mais de 40 títulos biográficos breves.

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AFINIDADE
Begley compartilha com Kafka a origem judaica e o título de advogado

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As diferenças dessas obras para os relatos biográficos convencionais são, essencialmente, duas: o escritor escolhe seu biografado por afinidade e não assume compromisso de relatar a vida da infância à velhice segundo uma cronologia óbvia. Ele concentra-se num aspecto da trajetória ou da personalidade do retratado. O francês Pierre Assouline, autor de dez livros biográficos, entre eles “Cartier-Bresson: o Olhar do Século”, é um mestre deste estilo. Ele o descreve no recém-lançado “Rosebud – Fragmentos de Biografias” (Rocco), que reúne em curtos textos perfis de celebridades como o romancista Rudyard Kipling , Lady Diana e o pintor Pablo Picasso. Assouline afirma que “é no detalhe que se desenrola o essencial do teatro de sombras do seu herói (o biografado). A sua escolha os desvela, quando não os denuncia (os biógrafos)”. É o que se pode conferir no livro de White sobre Rimbaud. Ele se revela logo na introdução ao relatar como o fascínio exercido pela vida e obra do poeta francês encorajou-o a viver uma relação homossexual com um professor da escola – e depois o levou a agir de forma abjeta em relação a esse amante.

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White faz uma mea-culpa ao contar que a autorrejeição que experimentou por ter cedido aos próprios desejos o fez denunciar o professor por fumar maconha – o que provocou a expulsão do docente da instituição. White, um especialista em biografias (tem obras sobre os romancistas Jean Genet e Marcel Proust, entre outros), narra a formação intelectual de Rimbaud, sua difícil convivência com a mãe dominadora, o turbulento romance com Paul Verlaine – que levaria este à loucura e prisão – e o exílio do escritor na África, trabalhando como traficante de armas. Atento aos fatos biográficos e históricos, os redimensiona num texto envolvente e carismático como aqueles que se leem nos bons romances. Esse tipo de identificação é natural e quase obrigatória em obras do gênero, mas agora se mostra mais reveladora. O escritor britânico Gerald Martin, autor de “Uma Vida”, sobre Gabriel García Márquez, trabalhou com um personagem ainda vivo e o perseguiu ao longo de duas décadas para escrever a sua biografia “definitiva” sobre o escritor colombiano.

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INSPIRAÇÃO
White faz revelações pessoais e diz que suas ações foram guiadas por Rimbaud

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Foi guiado por uma grande admiração pessoal. O mesmo impulso moveu o premiado escritor americano Louis Begley, autor de “Sobre Schmidt”. Ele encarou desafio semelhante ao escolher o seu autor preferido, o tcheco Franz Kafka, como assunto de “O Mundo Prodigioso que Tenho na Cabeça”. A partir da farta correspondência deixada pelo autor de “O Processo” e “Metamorfose”, Begley reconstitui a vida do advogado e funcionário público que morava em Praga e que, como ele, pertencia à classe média judaica. É mais uma prova de que, se a biografia de um personagem consagrado já nasce como forte concorrente a best-seller, essas chances são aumentadas se ela vem com a assinatura de um discípulo de talento reconhecido.

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