i65567.jpgJanuária seria uma típica cidadezinha mineira, com coreto na praça e paralelepípedo nas ruas, se não tivesse uma estranha particularidade: nos últimos cinco anos o município teve nada menos que seis prefeitos – três deles cassados. Com 65 mil habitantes e localizada no norte de Minas Gerais, Januária pode parecer mais corrupta do que a maioria. Ou revelar mudanças políticas importantes que vêm acontecendo no País, como o surgimento de uma sociedade civil mais vigilante, um Ministério Público e uma Justiça Eleitoral mais enérgicos. Lá, prefeitos vêm sendo extraordinariamente cassados e punidos por delitos que costumam passar em branco em outros municípios Brasil afora.

Em 2004, o então prefeito Josefino Lopes Viana (PP) foi cassado por propaganda eleitoral irregular durante sua campanha à reeleição, em 2000. Também acusado de desviar R$ 447 mil de recursos do governo federal, Viana chegou a ser preso durante seis dias. "A política em Januária é muito violenta", foi sua justificativa à ISTOÉ. Depois dele, assumiram quatro prefeitos em menos de um ano. O primeiro, João Ferreira Lima (PMDB), foi nomeado pela Justiça Eleitoral para substituir Viana.

Durou pouco: o então presidente da Câmara Municipal, Manoel Ferreira Neto (PL), entrou na Justiça e conseguiu assumir o posto em seu lugar. Mas a prefeitura também não ficou nas mãos dele muito tempo. Envolvido em denúncias de fraude numa licitação em um hospital, Ferreira Neto foi cassado poucos meses depois pela Câmara de Vereadores. Entrou o então presidente da Câmara, Waldir Pimenta (PSDB), que conseguiu finalmente terminar o mandato.

Seria cômico se a tragédia não continuasse. O mesmo João Ferreira Lima que havia ocupado a prefeitura por poucos dias em 2004 venceu as eleições no final daquele ano. Exerceu o cargo até abril de 2007, quando foi afastado por pressionar testemunhas em uma investigação sobre a Máfia dos Sanguessugas na qual constava como acusado. Dando continuidade à triste saga, depois dele assumiu o atual prefeito, Sílvio Aguiar (PMDB), já envolvido em processos com denúncias de corrupção e com seu mandato sob risco de ser cassado. "É perseguição política", disse Aguiar à ISTOÉ. A Associação dos Amigos de Januária (Asajan) estima que quase 40% do orçamento da cidade, de R$ 45 milhões, seja perdido devido à corrupção. O qüiproquó mineiro remete o diretor executivo da ONG Transparência Brasil, Cláudio Abramo, a um raciocínio positivo:

Prefeitos profissionais
Em alguns municípios vizinhos de Januária, prefeitos parecem ter descoberto a fórmula de como fazer para permanecer no poder por 16 anos: basta mudar o domicílio eleitoral. É o caso do atual prefeito de Pirapora, Warmillon Braga (DEM), que busca a reeleição na cidade depois de ter governado a vizinha Lagoa dos Patos por dois mandatos consecutivos. Em Coração de Jesus, o atual alcaide, Ronaldo Mota Dias (PL), usa a mesma fórmula. Ele busca a reeleição depois de ocupar a prefeitura por oito anos em São João da Lagoa.

"Isso me parece uma indicação de que tem gente vigiando os prefeitos, o que é um bom sinal." O dirigente da Asajan, Fábio Oliva, diz que "a população está mais consciente". Para o analista político Ricardo Ribeiro, da MCM Consultores, de São Paulo, o caso atípico reflete uma tendência de maior rigor na fiscalização dos prefeitos e vereadores pelo Ministério Público e pela Justiça Eleitoral. "Eles estão mais atentos às irregularidades", diz Ribeiro. Para alguns moradores, entretanto, a história se resume em desesperança. "Eles só visam interesses próprios. Não apareceu, até agora, nenhum prefeito que queira cuidar da cidade", disse a secretária Andréia Rodrigues.