As digitais do governo federal estão presentes nas mortes dos jovens David Silva, 24 anos, Wellington Ferreira, 19, e Marcos Paulo Campos, 17. Por mais que o ministro da Defesa, Nelson Jobim, defenda agora a "punição exemplar" do soldado, do sargento e do tenente que entregaram em holocausto os três garotos aos traficantes de uma favela rival, ainda cabe a pergunta: o que faziam os militares no Morro da Providência? Protegiam a população local? Não. Combatiam o tráfico de drogas? Também não. Eles estavam lá apenas para garantir o bom andamento das obras de um projeto chamado Cimento Social. E o que é isso? Com R$ 12 milhões do Ministério das Cidades, trata-se de um programa de reforma dos telhados e das fachadas das moradias, que é a principal bandeira de campanha do senador Marcelo Crivella, aliado do presidente Lula, na disputa à Prefeitura do Rio de Janeiro. Ao colocar o Exército brasileiro a serviço de um projeto eleitoral, o governo federal aceitou correr o risco e tem agora suas mãos manchadas com o sangue de três inocentes – os jovens, brutalmente assassinados e despejados num aterro sanitário, estudavam, trabalhavam e voltavam de uma festa. Eram apenas negros. Um deles atuava como voluntário num programa social. E, mesmo que fossem ligados ao tráfico, nada justificaria o "corretivo" dado pelos militares, que alegaram "desacato à autoridade".

Os militares não estavam na favela a serviço da segurança, mas sim de um projeto eleitoral. Deu no que deu

Afinal, a pena de morte sumária, sem julgamento e sem direito de defesa, ainda não foi instituída no Brasil. Ao menos, formalmente. Outro personagem que se disse indignado com a morte dos três garotos foi o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral. Segundo ele, os militares são "marginais" que não honram a farda do Exército. Mas a política de segurança de Cabral também tem deixado seqüelas. Desde que ele assumiu o cargo, o número de "mortos em confronto com a polícia" cresce assustadoramente no Rio. Só no ano passado, foram 1.330 pessoas, especialmente jovens. Na gestão Cabral, têm ocorrido mais de três óbitos diários por "resistência", mas isso não impediu que as ocorrências de assaltos pulassem de 62,7 mil para 75,4 mil entre 2006 e 2007. É um paradoxo: os supostos bandidos são exterminados, mas o crime avança. No Rio, mata-se mais do que em Bagdá. E, quando ocorrem atos bárbaros, a classe média seduzida pela ideologia do Capitão Nascimento pede a presença das tropas nas ruas, como se os militares fossem um "Exército da Salvação Nacional". Pelo que se viu no Morro da Providência, a mais simbólica e antiga favela do País, essa está longe de ser a solução. E o que se espera do ministro Tarso Genro, patrono das indenizações milionárias às vítimas da ditadura militar, é que ele tenha o mesmo empenho em confortar as famílias de David, Wellington e Marcos Paulo.