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ARROCHO
Trabalhadores gregos protestam contra as medidas de ajuste fiscal sugeridas pela UE

No símbolo do euro, as duas linhas paralelas representam a estabilidade do mundo europeu. Mas, na semana passada, a moeda comum europeia sofreu o maior ataque especulativo de seus 11 anos, provocado pela tempestade econômica que se instalou no Velho Continente. A tensão na Zona do Euro é tão forte que nos Estados Unidos e na Inglaterra economistas passaram a usar a sigla PIGS (porcos, em inglês) para ridicularizar Portugal, Itália, Grécia e Espanha. No início do ano, bancos italianos, entre eles o Unicredit, pediram que a Irlanda substituísse a Itália no I. Mas o efeito foi contrário e a sigla ganhou na Irlanda um novo integrante e se tornou PIIGs. O fato é que o mercado não perdoa os pecados cometidos pela União Europeia, que  aglutinou açodadamente sob seuguarda-chuva países de fundamentos econômicos frágeis. “Os países emergentes da Europa tiveram almoço grátis nos últimos 18 anos”, afirma o economista- chefe do Bradesco, Octávio de Barros. “Eles se acomodaram em torno dos benefícios extraordinários, mas sem ajustar suas economias. Nos anos dourados, de 2003 a 2007, os problemas fiscais tinham importância mínima,  agora eles são explícitos.” O governo da Grécia, por exemplo, só cumpriu as metas do Tratado de Maastricht, que regulamenta a Zona do Euro, ao ingressar no bloco em 2002. Para tranquilizar a Alemanha e a França de que eles não teriam que socorrer outros países do bloco, o tratado fixou critérios como inflação de 1,5%, déficit menor que 3% do PIB e dívida pública menor do que 60% do PIB.

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AJUDA
Papandreou, da Grécia, e Zapatero, da Espanha, discutem saídas para a crise em seus países

Acontece que a própria União Europeia passou por cima dessas regras para expandir o bloco na tentativa de torná-lo mais influente do que os Estados Unidos. Seus dirigentes esqueceram,  porém, que os EUA têm administração única, ao contrário do bloco europeu, que, apesar de ter unificado a política monetária (inflação e juros), possui variadas políticas fiscais (receita e despesa). No ano passado, a festa acabou e o déficit fiscal da Grécia foi quatro vezes maior, com a dívida pública multiplicada por dois. O país precisa de 55 bilhões de euros este ano para refinanciar sua dívida e manter a máquina pública funcionando. “Portugal, Grécia, Itália e Espanha crescem pouco e têm um gasto social muito grande. Para eles, é difícil reduzir os gastos, principalmente com a economia desacelerada”, explica o economista sênior do Santander, Cristiano Souza. Uma saída seria desvalorizar o euro para torná-los mais competitivos e, assim, acelerar o crescimento, mas os países mais ricos não estão convencidos a depreciar a cotação, hoje em torno de US$ 1,35. Na quinta-feira 11, o presidente da União Europeia, Herman Van Rompuy, após reunião com a Alemanha e a França, anunciou um acordo para evitar que a crise fiscal grega acabe em moratória, pondo em risco a estabilidade do euro. Mas garantiu que o novo pacto exigirá rigor e determinação do governo de Atenas, com um plano de “austeridade digno dos piores tempos do FMI”. “A irresponsabilidade fiscal grega nos últimos anos não pode sair grátis”, afirmou. O plano inclui cortar despesas públicas em 2 bilhões de euros, reduzir em 30% as horas extras, congelar salários, aumentar a idade de aposentadoria e os impostos. “Só haverá ajuda se o governo grego levar a cabo as reformas de grande alcance”, afirmou o ministro da Economia da  Alemanha, Michael Meister. “A Grécia é o ponto mais crítico no curto prazo. Ela precisa recorrer ou à Europa ou ao FMI”, explica o economista Paulo Nogueira Batista Jr., representante do Brasil e de mais oito países no FMI.

Os trabalhadores gregos, prevendo momentos sombrios à frente, foram às ruas e protestaram. A operação de socorro concentrouse na Grécia, porque os demais países que formam os PIIGS garantiram que não vão dar calote em ninguém. E foram convincentes. Octávio de Barros considera que é exagero incluir a Espanha no mesmo balaio que a Grécia. Segundo ele, o problema da Espanha não é fiscal, mas o país sofre com a bolha imobiliária e a crise na construção civil. Tanto é assim que a Moody’s, que sacudiu o mercado ao afirmar que todos PIGS (nesse caso sem a Itália) sofrem do mesmo mal que os gregos, voltou atrás. “Espanha, Portugal e Grécia podem partilhar a mesma moeda, mas não mostram o mesmo tipo de perfil de crédito”, ponderou a Moody’s. O risco comum aos PIIGS é o crescimento econômico abaixo de 1%, o déficit fiscal bem acima da meta da eurozona e o desemprego acima de dois dígitos, com exceção da Itália (8,5%). Na Espanha, o desemprego ficou em 19,5%, duas vezes maior do que a média mundial. “Há uma crise de confiança grande, tanto do mercado quanto da Alemanha e da França, porque não têm muito fôlego financeiro e a conta sempre caiu no colo deles. Os problemas são sérios, mas somente para a Europa. Não vejo o contágio que ocorreu com a quebra do Lehman Brothers”, diz o estrategista-chefe do Banco WestLB, Roberto Padovani. A crise na Europa pode não bater na porta do Brasil, mas deixa seu recado.

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Em qualquer tempo, com ou sem crise, é preciso fazer o dever de casa. Agir mais como formiga do que como cigarra. Na Europa, a conta chegou rapidamente, porque se apostou no aumento do gasto público, como se a política econômica pudesse passar ao largo da responsabilidade fiscal. Agora, os PIIGS se veem obrigados a cortar gastos para provar aos credores que têm capacidade de pagamento. E as potências do Velho Continente estão pagando o preço pelo passo maior do que as pernas. Mas a lição da União Europeia vale para todo e qualquer país.