Aos 46 anos, o presidente interino do Senado, Tião Viana (PTAC), é um homem acostumado a enfrentar grandes desafios. Ele despertou para a política na esteira de seu irmão Jorge Viana, duas vezes governador do Acre. Durante o primeiro governo do irmão no Estado (1999-2002), Tião, médico infectologista, criou um programa de saúde itinerante, que levava profissionais de saúde às regiões distantes, dentro da floresta. Hoje, seu desafio é pacificar o Senado depois da crise que, há duas semanas, levou Renan Calheiros (PMDB-AL) a pedir licença da presidência da Casa para tentar conter a onda de representações que se abateu sobre ele desde a denúncia – até hoje não comprovada – de que o lobista de uma empreiteira pagava as contas da filha que teve numa relação extraconjugal com a jornalista Mônica Veloso. A julgar pela avaliação de seus pares, Tião Viana vem se saindo muito bem. O senador Jefferson Péres (PDTAM), um dos poucos parlamentares que preservam hoje no Congresso uma imagem de respeito à ética e moralidade política, subiu à tribuna na quarta-feira 17 à tarde para fazer um rasgado elogio ao presidente interino da Casa. “O que eu vi hoje pela manhã no Senado foi política com P maiúsculo”, disse Péres, referindo-se a uma reunião que Viana patrocinara pela manhã, entre os senadores e o também presidente da República interino, José Alencar (que substituía Luiz Inácio Lula da Silva, em viagem à África, na semana passada), para negociar a aprovação da CPMF. “O que se vinha fazendo no Senado até então era um tipo de política menor, que me dá alergia, urticária”, completou. Na verdade, o objetivo de Péres era unir-se à banda que fustiga o senador Renan Calheiros.

O elogio foi colhido com satisfação por Tião Viana. Será justamente a sua capacidade em conseguir conduzir o Senado de volta a uma situação de normalidade que poderá lhe dar a possibilidade de permanecer na presidência depois da licença de Renan. Nove entre dez senadores apostam que o alagoano não terá a menor condição política de retornar à presidência quando acabar a licença de 45 dias que pediu. Mas os mesmos nove senadores avaliam que as chances de Viana se efetivar no cargo são muito pequenas. Para reverter essa situação, o senador acreano aposta no seu talento de conciliação: se passar ileso pelo furacão, conseguindo aprovar a CPMF como quer o governo e sem ferir suscetibilidades na oposição, as chances de Viana podem virar.

“A tarefa é das mais complicadas: o Senado vive a maior crise dos seus mais de 180 anos de existência”, avalia o próprio Tião Viana. Nos seus primeiros dias na interinidade, Viana tem exercido o que é considerado uma das suas principais características políticas: a capacidade de ser duro sempre com um sorriso nos lábios. Era algo que a ex-senadora Heloisa Helena (PSOL-AL), no começo das divergências que acabaram levando à sua expulsão do PT, já observava quando Viana era o líder do partido. Tão logo chegou à presidência, Viana já pediu os dois principais cargos de confiança que tinha Renan Calheiros: a direção da Secretaria de Comunicação Social do Senado – que, entre outras coisas, administra a TV Senado – e a assessoria de imprensa. Um sinal claro da sua disposição de permanecer no cargo além da licença de Renan. O próprio Renan reclama que Viana, ao longo da crise, teria trabalhado de modo discreto para ajudar a inviabilizar a sua situação. Essa é uma das razões pelas quais a permanência de Viana na presidência do Senado é considerada difícil. “A vaga é dos peemedebistas, a não ser que eles abram mão dela”, observa o senador Renato Casagrande (PSB-ES). O que ajuda Viana é o fato de o PMDB não ter um nome claro que desponte como substituto de Renan. A oposição não aceita o senador José Sarney (AP), primeira hipótese aventada. Tem problemas também com o ministro das Comunicações, Hélio Costa (MG), que poderia voltar ao Senado se tivesse chances de virar presidente. Já Pedro Simon (RS) e Jarbas Vasconcelos (PE), quem não os aceita é o governo. Sobram nomes menos expressivos, como o senador Garibaldi Alves Filho (RN). Viana pode se beneficiar ainda com uma demora nas próximas ações de Renan. É dele o tempo para que se deflagre a sucessão: ela só acontece oficialmente se e quando ele renunciar à presidência do Senado. Renan já deu indicações de que renunciará, mas ainda não definiu em que momento.

Enquanto isso, Viana usará o tempo que lhe restar para mostrar a sua capacidade de pacificar o Senado. Conta com o bom trânsito que tem em todos os partidos. Não é de criar arestas. Tanto que era um dos principais amigos no Senado do ex-senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA), conhecido pelo seu temperamento difícil. É uma característica política que Viana herdou de seu irmão, o ex-governador do Acre Jorge Viana. O grande talento aglutinador de Jorge Viana fez dele praticamente o dono do Acre. Seu grupo político está no poder há 16 anos.

Tião e Jorge Viana são filhos de um ex-deputado do PDS, Wilde Viana. No Acre, isso é repetido para explicar a capacidade que ambos têm de negociar com todos os espectros ideológicos: “Foram criados pela direita e caminham hoje pela esquerda.” Os dois foram líderes estudantis e aproximaram-se do PT através do líder seringalista Chico Mendes. Primeiro, Jorge Viana, engenheiro florestal que se tornou assessor de Chico na luta contra os fazendeiros do Acre. Tião Viana surgiu depois, a partir da sua atividade como médico. Talvez agora o atual senador tenha novamente de recorrer às suas habilidades de infectologista para emplacar no comando do Senado. “A verdade é que o Senado já voltou a respirar sem a ajuda de aparelhos”, comenta Renato Casagrande.