“Taí, eu fiz tudo pra você gostar de mim/ Oh meu bem não faz assim comigo, não/ Você tem, você tem que me dar seu coração.” A marchinha de Joubert de Carvalho, um dos maiores sucessos de Carmen Miranda, retrata bem o temperamento generoso da Pequena Notável, que do alto de seu 1,53 m nunca mediu esforços para agradar ao público e aos amigos que a cercavam. Passados 51 anos de sua morte, o uso de sua imagem motiva uma disputa judicial injusta com um dos maiores mitos nacionais. A briga envolve os herdeiros, a ex-mulher de Caetano Veloso, Paula Lavigne, o escritor Ruy Castro e o diretor de cinema Aníbal Massaini Neto. Em 1998, a produtora Rio Vermelho arrematou por US$ 200 mil (cerca de R$ 400 mil) os direitos sobre a imagem de Carmen Miranda. Era um dos projetos mais ambiciosos das sócias Paula Lavigne e Renata de Almeida Magalhães, que planejavam fazer um filme. Acabaram envolvidas em um projeto da Rede Globo de lançar uma minissérie antes do centenário de Carmen, que se completa em fevereiro de 2009. Quase ao mesmo tempo, Massaini, diretor do documentário Pelé eterno, ambicionava realizar um sonho de seu pai, Oswaldo, e levar Carmen às telas. Para isso, sondou seu colega Carlos Manga para dirigir uma produção sobre a artista. O veterano Manga, porém, abandonou a família Massaini e embarcou no projeto da minissérie da Globo, convidando, inclusive, a novelista Maria Adelaide Amaral para escrevê-la. ?A idéia ficou só no desejo?, lamenta Massaini. O problema é que os dois projetos ? o da Globo e o de Massaini ? são alvo de processos movidos pela Copyrights Consultoria Ltda., representante dos herdeiros de Carmen, que temem pelo uso da imagem da artista. ?Em tese, a produtora (Rio Vermelho) não teria o direito de fazer o filme porque o contrato com eles termina este mês?, alega a advogada da Copyrights, Adriana Vendramini. O que se sabe é que só 10% do valor do contrato foi quitado. Mas a produtora acaba de obter o direito de pagar o restante da dívida em juízo. ?Cumpro o que a Justiça determinar?, rebate Paula Lavigne. Outra envolvida é a empresa americana CMG Worldwild, com escritório no Rio. Entre as 300 celebridades cujos direitos de imagem estão sob seus cuidados estão Marilyn Monroe, James Dean e, claro, Carmen Miranda. Verdinhas à vista: ?Há interesse dos estúdios americanos em fazer um filme sobre Carmen?, antecipa a diretora Kitty Monte Alto. O escritor Ruy Castro, autor de biografias como a de Garrincha e a de Nelson Rodrigues, que vendeu no ano passado à Globo os direitos sobre seu livro Carmen: uma biografia ? a vida de Carmen Miranda, a brasileira mais famosa do século XX, um calhamaço de 600 páginas, parece perdido diante de tanta polêmica. ?Não há impasse, apenas um desencontro momentâneo?, acredita Castro. A Central Globo de Comunicação informa que os direitos do livro foram comprados por R$ 50 mil, ?como os de várias outras obras?, mas alega que o projeto ainda está em estudos. Quem conheceu Carmen de perto fica triste diante desse quiproquó. ?Ela foi muito especial, isso não tem nada a ver conosco?, suspira Carmen Guimarães, 70 anos, filha de Cecília, única dos seis irmãos ainda viva, com 92 anos.