Quando recebia visitas em sua mansão no Cosme Velho, no Rio de Janeiro, o jornalista-magnata Roberto Marinho mostrava com gosto sua coleção de obras de arte. Afinal, não é para qualquer um o luxo de ter em casa 1.342 trabalhos de artistas como Cândido Portinari,
Di Cavalcanti, Ismael Nery ou Lasar Segall,
para citar uns poucos. Como relembra a
escritora e amiga pessoal Nélida Piñon, o fundador das Organizações Globo “tinha que fazer rodízio dos quadros, pois desejava
desfrutar de toda a coleção e já não havia paredes suficientes para exibi-los ao mesmo tempo”. Uma parte desse patrimônio, 147 peças, está agora em São Paulo para a exposição O século de um brasileiro – coleção Roberto Marinho, no Museu de Arte Moderna (MAM), até 22 de maio, depois de passar pelo Paço Imperial, no Rio.

A mostra celebra o centenário de Marinho, completado no dia 3 de dezembro de 2004. Considerada um recorte da produção artística nacional do século XX, a mostra paulista foi dividida em três módulos, nomeados de acordo com os elementos água, terra e ar. Água faz referência à pesca submarina, um dos hobbies do empresário, e conta com quadros como Piscina, de Milton Dacosta, de 1942. Terra é uma homenagem a São Paulo e seus modernistas, como Tarsila do Amaral (O touro, de 1925) e Lasar Segall (Paisagem brasileira, de 1953). O abstracionismo é o tema de Ar e traz nomes como Tomie Ohtake, com Pintura nº 2, de 1953, e Antonio Bandeira, com Panorama, de 1962.

Marinho tinha seus artistas preferidos, é claro, e um deles era o campineiro José Pancetti. Do óleo sobre tela Boneco, de 1939, costumava dizer que “toda vez que olho esse pequeno quadro de Pancetti, tenho a comovida sensação de estar olhando dentro de mim mesmo”. Já as duas telas de Roberto Rodrigues, irmão de Nelson Rodrigues, merecem atenção porque são praticamente as únicas. Artista promissor, na década de 20 Roberto fazia ilustrações para o jornal Crítica. Sua carreira foi interrompida ao ser assassinado a tiros, em 1929, pela escritora Sylvia Thibau. O motivo foram as ilustrações para uma reportagem sobre um suposto caso extraconjugal da escritora. Roberto Marinho era apaixonado pela sua coleção e foi o ciúme que alimentava por essas obras que acabou salvando alguns quadros de autoria do japonês Manabu Mabe. Em 1979, o governo do Japão solicitou a museus e a colecionadores brasileiros o empréstimo de telas de Mabe que comporiam uma exposição em sua homenagem a ser realizada em Tóquio. Receoso, Marinho deixou de atender o pedido. Assim que a exposição terminou, o avião cargueiro que transportava 53 óleos – algumas versões dão conta de 68 quadros – pintados entre 1948 e 1978, caiu no mar a caminho de Los Angeles e as obras emprestadas foram perdidas para sempre. Imagina-se o alívio do empresário.


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