Nas últimas duas décadas, os gays começaram a sair do armário, assumiram sua sexualidade e detonaram um irreversível processo de amadurecimento na luta por seus direitos. A visibilidade dos homossexuais só aumenta e um dos indícios mais flagrantes foi a recente vitória do professor baiano Jean Willys no Big Brother Brasil, com 22 milhões de votos, 55% do total. O último programa alcançou 57 pontos no Ibope. Jean assumiu sua homossexualidade logo no início do BBB e, na primeira manifestação de preconceito dos participantes, a comunidade gay detonou 14 mil e-mails de apoio ao baiano. A claque engordou com heterossexuais seduzidos pela simpatia do professor. “As minorias conquistaram maior respeito, tanto gays quanto negros”, exultou o vencedor, em entrevista a ISTOÉ. Aos 31 anos, ele não sabe o que fazer com o prêmio de R$ 1 milhão. Saiu de Alagoinhas, no interior da Bahia, aos 14 anos, expulso pela pobreza. Constatou aos 15 anos sua orientação sexual. “Gostava mesmo de meninos.” Está sem namorado e não pretende se tornar uma bandeira da causa. Arrimo de uma família de sete irmãos, por enquanto continuará como professor universitário em Salvador, mas planeja escrever novelas.

Jean apenas sinaliza uma tendência. Embora o projeto de lei de união civil entre pessoas do mesmo sexo, de Marta Suplicy, aguarde votação no Congresso há dez anos, não há como negar: a postura em relação ao homossexualismo muda – e rápido. De olho nesse mercado significativo, a tevê fechada Globosat inaugurou o canal For Man, de conteúdo homossexual masculino, que exibe filmes eróticos por meio de uma produtora com o nome de Pau Brasil. Para lançar o For Man, a Globosat seguiu os sinais da demanda dos assinantes do canal Sexy Hot e a constatação de que os homossexuais representam um segmento de alto poder aquisitivo. A meta da Globosat é vender 50 mil pacotes de filmes e 100 mil filmes avulsos nos primeiros seis meses, expectativa que sobe para 70 mil e 200 mil no primeiro ano.

O Judiciário também dá sinais de abertura.
Após mais de duas décadas de batalhas
jurídicas, Luís Roberto Gambine Moreira pôde
finalmente assumir seu nome: Roberta Close. A briga começou desde a operação que fez na Inglaterra para mudar de sexo. Em fins de março, a 9ª Vara de Família do Rio de Janeiro reconheceu o direito dele de ser mulher. No setor público, as mudanças são flagrantes. No Rio Grande do Sul, a desembargadora Maria Berenice Dias, presidente da 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça – primeira mulher a entrar para a magistratura no Estado –, lançou, em 2000, União homossexual, o preconceito e a Justiça (Editora do Advogado). Com o livro, os homossexuais passaram a ser reconhecidos como família, com ou sem formalização, e a ter direito à divisão de bens em caso de separação. Em 2001, a Justiça reconheceu a primeira união estável de gays no Estado (o nome do casal é segredo de Justiça). A Prefeitura de São Paulo, por sua vez, acaba de criar a Coordenadoria de Diversidade Sexual, com o jornalista e crítico teatral Celso Curi à frente.

Promessa – No mês passado, o conservador presidente da Câmara,
Severino Cavalcanti, recebeu entidades homossexuais no Congresso. Os representantes gays sabem que não terão o seu voto, mas saíram com a promessa de que a Câmara baterá o martelo ainda este ano sobre o projeto da união civil e o da deputada Iara Bernardi (PT-SP), que torna crime a discriminação por orientação sexual. O deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), líder da Frente Mista pela Livre Expressão Sexual, aposta ainda na votação de um projeto que inclui cirurgias de mudança de sexo no Sistema Único de Saúde.

O governo federal não perdeu o bonde. Criou, em maio de 2004, o Programa Brasil sem Homofobia, que congrega vários ministérios e entidades na luta contra a discriminação. O Ministério da Cultura acaba de incluir no calendário de comemorações o 28 de junho, Dia do Orgulho Gay, data da rebelião no bar Stonewall, em Nova York . Serão destinados R$ 600 mil às paradas gays de todo o País, sendo R$ 200 mil às de São Paulo (29 de maio) e do Rio de Janeiro (26 de junho), e R$ 5 mil às menores. O Ministério da Educação também vai incluir discriminação sexual e racial na capacitação dos professores da rede pública.

Mas não há dados seguros sobre a comunidade gay no Brasil. A mais recente pesquisa sobre o segmento foi feita na Parada Gay de São Paulo, em 2004, que concentrou 1,5 milhão de pessoas – 600 mil de fora da cidade. O estudo, realizado pela Secretaria de Ciência, Tecnologia, Desenvolvimento Econômico e Turismo, ouviu 534 pessoas. Dos entrevistados, 57% tinham curso universitário (para uma média nacional de 2% da população) e 50% costumam viajar a lazer. O temperamento alegre e descompromissado será ingrediente de outro projeto a ser lançado com foco no mercado gay, batizado de Um olhar, que o produtor paulista Marcelo Bonfá está oferecendo a tevês abertas e fechadas. A idéia é criar a primeira mesa-redonda GLS, nos moldes de

Manhattan Conexion

, do canal GNT. “Queremos incomodar e divertir”, avisa.