O filósofo iluminista francês Barão de Montesquieu teorizou um dos pilares das repúblicas modernas. Defendeu, há mais de 200 anos, a independência e a harmonia entre os poderes Executivo, Judiciário e Legislativo. Um conceito que o ministro da Justiça, Eugênio Aragão, e o antecessor e agora chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), José Eduardo Cardozo, especializam-se em violar. Os dois usam os cargos de Estado para tumultuar investigações da Polícia Federal, denúncias do Ministério Público e decisões de magistrados em nome do governo da presidente Dilma Rousseff. Tornaram-se uma espécie de agentes contra a lei. Em entrevistas, Eugênio Aragão abandona a liturgia exigida para o cargo e parte ao ataque contra integrantes da operação Lava Jato, inclusive da Polícia Federal, subordinada a sua pasta. Chega ao ponto de condenar publicamente o juiz do caso, Sergio Moro, por suposta politização. José Eduardo Cardozo não fica para trás. Usa a estrutura do órgão para interesses de correligionários. Move ações que pedem a restrição de poderes de integrantes do Judiciário. Passou até a reunir juristas, durante o expediente, para fazer atos de desagravo ao ex-presidente investigado Luiz Inácio Lula da Silva e contrários ao impeachment. Não à toa, Aragão e Cardozo são alvos de críticas de entidades ligadas à magistratura, ao Ministério Público, a delegados federais e a advogados.

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”Que o Supremo defina os limites para as autoridades policiais, o Ministério
Público e magistrados em relação às prerrogativas da Presidência da
República, ao sigilotelefônico e às situações que estão na lei”

Afirmou José Eduardo Cardozo ao falar das gravações de Lula. Entre elas
com Dilma. Ele tenta anular o uso dos áudios como prova.

A própria nomeação do Eugênio Aragão, subprocurador-geral da República, à pasta da Justiça gera controvérsias jurídicas. Ocorreu após o Supremo Tribunal Federal proibir Wellington César Lima e Silva, do MP da Bahia, de assumir o cargo. O STF entendeu que promotores e procuradores que ingressaram na carreira, após a Constituição de 1988, só podem trabalhar fora da instituição como professores. A regra foi criada junto a outras que garantem a independência do MP. O argumento deveria apear Eugênio Aragão do governo. Mas ele se segura por ter entrado antes na carreira. É algo legalmente questionável, mas moralmente reprovável. A indicação de Aragão contou com a pressão do PT como tentativa de controlar a Polícia Federal. Isto fica claro nas interceptações telefônicas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em que ele diz que o ministro da Justiça precisa “cumprir um papel de homem.” Na prática, intimidar e retaliar aqueles que investigam pessoas ligadas ao governo, como o próprio Lula. Empossado na quinta-feira 17, Aragão mostrou aos petistas a que veio. Deu declarações ameaçando agentes federais e disse que a PF está sob supervisão. Trata a entidade como um braço qualquer do executivo. Esquece-se que a Constituição diz que a Polícia Federal é uma polícia judiciária.

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”Não é razoável, com o país num momento de quase conflagração,
que os agentes (federais) aproveitem esse momento
delicado para colocar gasolina na fogueira”
Disse o ministro da Justiça Eugênio Aragão em entrevista. O comentário
motivou um pedido de explicação do Superior Tribunal de Justiça (STJ)

Já o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo parece não entender a finalidade do cargo para o qual foi indicado: o de chefe da Advocacia-Geral da União (AGU). Dedica o seu tempo e a estrutura do órgão para fazer a defesa da presidente Dilma Rousseff no processo de impeachment. Um desvio de atribuição para muitos juristas. Quem está respondendo à ação de cassação não é o Estado, mas a pessoa física Dilma Rousseff. Ela tem de providenciar e custear a própria defesa. Durante o expediente, Cardozo ainda promove eventos em locais oficias com juristas ligados ao governo para denunciar o processo de impeachment. Neles, ofende o STF a classificar como golpe um procedimento que os ministros decidiram recentemente o rito. Invariavelmente, os encontros se tornam atos de desagravo ao ex-presidente Lula e movidos a críticas ao juiz Sergio Moro. O descontentamento dele com a Lava Jato é tamanho que colocou a AGU para ingressar com ações questionando prerrogativas de delegados, procuradores e juizes. Em uma delas, pretende que o STF estabeleça limites para autoridades responsáveis por investigações com relação a sigilo telefônico. Quer, no fundo, investir contra Moro pelo fato de o juiz ter exposto uma ligação interceptada entre Lula e Dilma. Os argumentos dele são frágeis, mas funcionam como arma na tentativa do Executivo de interferir no Judiciário numa tentativa de esconder malfeitos.

Fotos: AFP PHOTO/EVARISTO SA; Agência Brasil; 

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