O maior ato político da história do Brasil é recente. Data do domingo, 13 de março de 2016, quando 3,6 milhões de pessoas, segundo a Polícia Militar, se reuniram em 326 cidades para protestar. Só na avenida Paulista, em São Paulo, foram 1,4 milhão de pessoas, mais do que no protesto pelas Diretas Já, em 1984. Aqueles que ocuparam as ruas brasileiras trajaram camisetas nas cores verde e amarelo e levaram a tiracolo a bandeira do Brasil. Com cartazes, músicas e palavras de ordem, mostraram a que vinham de maneira bastante pragmática. 

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Incredulidade: Rio de Janeiro, 16 de março: brasileiros vão às ruas protestar
contra a nomeação de Lula para a Casa Civil

 
Exigiram a renúncia da presidente Dilma Rousseff, a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o fim da corrupção. Também apoiaram efusivamente o trabalho do juiz Sérgio Moro, magistrado à frente da operação Lava Jato. De forma pacífica, falaram alto para que suas vozes fossem ouvidas. Mas a presidente está surda. Menos de 72 horas depois de uma manifestação dessa magnitude, Dilma fez exatamente o contrário do que os milhões de brasileiros pediam: nomeou Lula como ministro da Casa Civil (leia reportagem aqui). 
 
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Protesto: São Paulo, quarta-feira 16 de março: manisfestantes voltam à avenida
Paulista menos de três dias depois de tê-la ocupado

 
O grito das ruas, pedindo a prisão do maior líder do Partido dos Trabalhadores, parece ter surtido efeito contrário no Palácio do Planalto. Os brasileiros, porém, não aceitaram calados. Assim que a nomeação de Lula foi anunciada, na quarta-feira 16, a população começou a se movimentar. Primeiro, foram postagens nas redes sociais. Divulgação e compartilhamento de mensagens em uma revolta coletiva que tomou o Brasil nos últimos dias e se intensificava a cada nova notícia. O mundo digital, porém, não foi suficiente para aliviar a indignação. 
 
Em poucos minutos, ruas brasileiras eram novamente tomadas somente três dias depois da maior manifestação da história. Em Brasília, milhares de pessoas revoltadas se postavam diante do Palácio do Planalto e na Praça dos Três Poderes. Em São Paulo, a avenida Paulista começou a ser ocupada. A indignação aumentou quando o juiz Sergio Moro revelou as escutas telefônicas de Lula, com um vasto repertório de conversas comprometedoras. Foram sinais claros de que o embate estava apenas começando. 
 
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No dia seguinte, na quinta-feira 17, às 10h30, quando Lula tomou posse como ministro, os protestos continuaram. Gritos de ordem, buzinas e panelaços foram ouvidos em todas as capitais do País. Empresas chegaram a liberar seus funcionários mais cedo para protestarem. A orientação era usar roupas pretas, para deixar claro o sentimento de luto pelo Brasil. O povo, ainda mais revoltado, foi novamente às ruas também em outras cidades, como Salvador, Recife, Belo Horizonte, Curitiba e Florianópolis. 
 
A internet também voltou a ser o palanque da população para expressar o descontentamento. No Twitter, a hashtag #quedanoplanalto chegou a ser uma das mais citadas no mundo. Na rede de petições on-line Avaaz foi criado o abaixo-assinado “Não Aceito Lula como Ministro do meu Brasil”, que tinha cerca de 400 mil assinaturas até a sexta-feira 18. Os organizadores, no começo, esperavam somar 250 mil. Agora, após a grande e rápida adesão à campanha, cogitam chegar a 1 milhão de participantes. 
 
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Pressão: Brasília, 16 de março: o Palácio do Planalto está cercado por centenas
de pessoas, indignadas com as manobras de Dilma

 
A intenção é levar as assinaturas ao Poder Judiciário e engrossar o coro dos descontentes. Se a situação já está insustentável para o governo, com toda essa pressão popular deve ficar ainda pior. “A nomeação do Lula ao ministério é um escândalo, é amoral. Eu acho que eles conseguiram a façanha de aumentar uma indignação que parecia estar no nível máximo”, afirma Rogerio Chequer, líder do movimento Vem pra Rua. “As pessoas perderam a esperança, depois elas perderam o emprego, depois perderam a capacidade de viver dignamente e, nesse contexto, elas descobrem que o dinheiro delas foi usado em um projeto de manutenção de poder. 
 
No ponto atual, o povo começa a entrar em um estado emocional descontrolado. São capazes de fazer quase tudo”, diz Chequer, sobre a revolta que tomou o coração dos brasileiros diante de estratégias escusas e fez milhares de pessoas lotarem espaços públicos rápida e espontaneamente. Para o analista político Gaudêncio Torquato, os conflitos que já existem devem se acirrar nos próximos dias. “Só Dilma e Lula não enxergam que o País precisa mudar”, afirma. “Ele nunca deveria ter assumido o ministério. 
 
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União: Avenida Paulista, 13 de março de 2016: 1,4 milhão de pessoas,
segundo a PM, na maior manifestação política da história do Brasil

 
Além de ser pouco provável que consiga recuperar a conjuntura política e econômica, vai deixar o povo ainda mais indignado porque é alvo de investigação.” É muito positivo que as pessoas ocupem as ruas e se unam por uma ou mais causas nas quais acreditam. Esse tipo de manifestação comprova que o País vive uma democracia madura. Mais do que isso, fortalece a própria democracia. 
 
O mais importante, no entanto, é que essas dezenas de atos que tomaram as cidades brasileiras nos últimos dias demonstraram a capacidade de a população ser tolerante com aquele que não pensa da mesma forma. Salvo um ou outro acidente pontual, houve um grande respeito à divergência, em meio à multidão de pessoas que defendiam suas opiniões e faziam suas reivindicações. Lutando de forma vigorosa e pacífica, os manifestantes brasileiros deram uma lição de cidadania.
 
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