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Quem vai fazer uma viagem internacional não costuma esquecer vistos, roteiros, guias e mapas. Poucos, porém, são os turistas que reservam tempo antes de embarcar para pesquisar a cultura do país que vão visitar. Pegos em flagrante após ações inofensivas para a cultura brasileira, como beijar em público, pedir carona ou consumir bebida alcoólica ao ar livre, têm de pagar multas e podem até dormir na cadeia. Nos casos mais graves, são deportados ou processados. No início do mês, um casal de namorados ingleses foi detido por algumas horas em Dubai, nos Emirados Árabes, por manter relações sexuais – o que só é permitido aos casados. Eles não foram flagrados no ato sexual. A moça foi dar queixa à polícia de estupro que teria sofrido por um garçom e, no depoimento, revelou que dormia com o namorado. Em 2008, outro casal foi condenado a três meses de prisão por fazer sexo na praia. Se em alguns países a situação se resolve com jogo de cintura e intervenção consular, em outros não há espaço para negociações, sobretudo em casos graves. Desde 2000, a pena na Indonésia para o consumo de drogas é a prisão, e para o tráfico, a pena de morte. Em dez anos, foram realizadas cinco execuções de traficantes no país, mortos com um tiro no peito ou na cabeça. O brasileiro Marco Archer Cardoso Moreira, 48 anos, instrutor de voo livre condenado à morte em 2004 pelo porte de 13,4 kg de cocaína, aguarda o resultado do seu último recurso. Os dois pedidos de clemência feitos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao governo indonésio foram negados.

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Martina Ielpo (à esq.) nos EUA: multada por pedir carona.

Na mesma situação está o surfista Rodrigo Gularte, 37 anos, condenado à morte há seis anos pelo porte de seis quilos de cocaína. Segundo Dedé Ramos, proprietário da agência de viagens Latitudes, os jovens são os mais suscetíveis às enrascadas. “São mais aventureiros, costumam viajar por conta própria e sem orientação”, diz ele, que especializou a agência nos destinos asiáticos, palco de choques culturais. Dedé conta que na Tailândia – país que adotou a pena de morte para o tráfico e de prisão para porte de drogas – avisos em pousadas pedem que os turistas visitem os seus conterrâneos condenados. “Na execução, eles são enterrados com a cabeça para fora para o elefante pisar”, diz ele. Na Ásia, a cultura local é a referência. “Já vi uma mulher ser apedrejada na Índia por usar uma camisa regata e mostrar o ombro”, conta Dedé. “Os policiais entenderam que ela tinha obrigação de conhecer os costumes.” No Brasil, não é muito diferente. Em setembro do ano passado, um italiano de 40 anos foi preso por beijar a filha de 8 na boca, em uma praia no Ceará. A justificativa de que o ato faz parte da cultura italiana não convenceu as autoridades. Ele passou nove dias na cadeia até voltar para a Itália. O caso está sendo avaliado pela Procuradoria-Geral de Justiça do Estado, que deverá decidir a questão nesta semana. Histórias de prisões, multas e constrangimentos recheiam os diários de viagem dos mais aventureiros. A italiana Martina Ielpo, 25 anos, conhece mais de 50 países. Em 2006, viajou para o Marrocos com o namorado durante o Ramadã, mês de jejum e sacrifícios pelo Islã.

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André Carvalho na Austrália. Lá, beber em público é proibido

“Fomos jurados de morte por um garoto apenas porque comíamos um croissant”, conta. Depois, pernoitaram na cadeia porque deram um beijo em público. No Ramadã, os homens não devem sequer olhar para as mulheres. As surpresas não se limitam aos países islâmicos ou asiáticos. Legislações rígidas também existem nos Estados Unidos, na Holanda e Austrália, entre outros. Poucos meses após a aventura no Marrocos, Martina voltou à delegacia. Desta vez, na Flórida. Foi detida e multada por pedir carona na rodovia entre Miami e Key West. “Não sabia que era ilegal”, conta. A Austrália, paraíso dos jovens em busca de liberdade e qualidade de vida, tem regras rígidas de comportamento social. Durante o intercâmbio no ano passado, o chef de cozinha André Vitor de Carvalho, 27 anos, fazia um churrasco junto com cinco amigos brasileiros numa praia. Eles não compreenderam uma placa em inglês e acharam que podiam beber no local. Logo, a polícia chegou, acabou com a festa e multou um dos rapazes no equivalente a R$ 196. “Aleguei que usava a cerveja para temperar a carne”, conta André, que escapou da punição. “Nestes países, é comum que as leis sejam elaboradas com base nos usos e costumes do povo”, explica o advogado Jorge Nemr, especialista em direito internacional. No desembarque em Amsterdã (Holanda), por exemplo, os turistas recebem instruções sobre as regras de comportamento no distrito da luz vermelha, onde prostitutas ficam expostas em vitrines. É proibido fotografá-las ou xingá-las. Tirar a roupa em público, gritar pelas ruas e pular nos canais da cidade são atos punidos com detenção. “Os turistas têm a obrigação de se informar”, diz Jorge Nemr. “Afinal, não estão acima das leis.”

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